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O circo: uma reflexão sob o olhar do 

desenvolvimento motor sobre a aplicação no ambiente escolar

El circo: una reflexión sobre la perspectiva del desarrollo motor en la aplicación en el entorno escolar

 

Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Paraná

(Brasil)

Vanessa Zadorosnei Rebutini

vanezr@ufpr.br

 

 

 

 

Resumo

          Por muito tempo a ciência estuda a relação das experiências motoras dos indivíduos e o desenvolvimento destes. Porém, quando observa-se as modalidades oferecidas à sociedade no ambiente escolar para que este seja efetivado, depara-se com a trivialidade. O circo ou artes circenses, como parte da ginástica, apresenta características e propostas para o enriquecimento das experiências e para o desenvolvimento das capacidades e habilidades motoras. Este trabalho tem como objetivo refletir sobre algumas questões que envolvem o circo, a prática da educação física escolar e seus profissionais e o desenvolvimento motor, com o intuito de fundamentar a prática circense como modalidade a ser trabalhada no ambiente escolar. Conclui-se que o circo pode ser trabalhado enquanto modalidade, ministrado por profissionais capacitados que, a partir da efetiva busca pela viabilização desta prática, possibilitarão uma quebra de paradigmas e preconceitos da própria sociedade em relação às práticas corporais, tornando-a uma ferramenta para o desenvolvimento no ambiente escolar.

          Unitermos: Circo. Desenvolvimento motor. Educação Física escolar.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 150, noviembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    Há muito se estuda o grau de influência das experiências motoras no desenvolvimento humano, seja este no aspector motor, cognitivo ou social. Ainda que evidentes, os resultados até agora obtidos estão longe de esgotar a discussão, tornando-se necessário acrescer reflexões que envolvam possibilidades viáveis de trabalho. Mas também não se pode limitar o assunto a teorias e discussões, é necessário que os pensadores e profissionais da área de educação física transportem esses conceitos às quadras, ginásios e tablados, construindo experiências e relatando à comunidade interessada os resultados obtidos.

    Campos como o dos esportes coletivos em geral (quadra e areia) e esportes individuais (atletismo, natação, tênis, etc.) são comumente explorados pelos profissionais de educação física no meio escolar, seja pelo histórico destas práticas em relação com a sociedade, por aspectos de praticidade ou pelo baixo custo dos materiais. Porém, há uma busca para superar este paradigma com a implementação de cursos para estes profissionais, que garantam a iniciativa da aplicação de novas práticas pedagógicas na escola (VENANCIO, 2005), além das propostas de teóricos sobre a implementação de propostas para além dos esportes tradicionais (DARIDO et al, 1999). Nesta perspectiva, temos como foco atividades como a ginástica geral, que devido a sua riqueza apresenta opções como o circo ou a GRD (SILVA e SILVA, 2002).

    No circo, encontramos uma ferramenta lúdica e formativa possível de ser organizada e ensinada nas aulas de educação física, que por isso tem capacidade de propicar aos alunos o pensar das possibilidades motoras, ampliando seu repertório e melhorando ou refinando suas experiências motoras e culturais (Verenguer apud DARIDO et al, 1999).

    Seguindo esta idéia, deseja-se aqui apresentar elementos que tentam justificar aplicação do ensino do circo no ambiente escolar: a desmistificação e os benefícios corporais e sociais da prática, os aspectos trabalhados sob a ótica desenvolvimentista. Contudo, que se torne claro que na há a intensão de esgotar o assunto, mas fornecer um ponto de partida, uma linha base que justifica estudos e experimentos mais aprofundados na área.

O Circo

    Hoje, o circo situa-se dentro da característica de “atividades físicas expressivas ou artísticas”, porém houve épocas que era considerado uma atividade relacionada a pessoas desocupadas, bandidos ou de baixa moral. Encontramos na história indícios da existência do circo tradicional na sociedade brasileira desde o início de século XIX até o momento presente, sendo este reafirmado pela emergência do circo moderno: o circo novo, que além do trapézio e da ginástica acrobática, traz o tecido e o malabares. No entanto, esta prática corporal aparenta ainda não desfrutar de um status cultural como ocorre com outras práticas, como a dança ou outras modalidades esportivas (BORTOLETO, 2003).

    No decorrer da sua história, várias foram as transformações sofridas pelo circo: desde Roma ao foco humanístico do circo novo, modelos, práticas e pensamentos foram afetados. Estas mudanças estão profundamente ligadas às mudanças do pensar humano, por isso propor que a arte circense seja um conteúdo da educação física escolar é, antes de tudo, encará-la como manifestação da cultura corporal, uma forma de expressão, possível de ser aprendida e sistematizada num processo pedagógico (CLARO e PRODÓCIMO, 2005).

    Diante destas novas idéias, o circo passa a ser desenvolvido em escolas especializadas, com objetivos lúdicos e com finalidades utilitaristas. É importante ressaltar esta idéia, pois muitas vezes o circo pode ser percebido como a exploração dos limites físicos e expressivos do ser humano, como o mito de uma prática em que apenas pessoas muito especiais ou capacitadas realizam feitos praticamente impossíveis. Esta percepção é perfeitamente válida quando se considera o universo dos artistas circenses. Porém, é necessário ter claro que as modalidades circenses, como propõe-se a constatar, podem ser vivenciadas e aprendidas por todos, desde que respeitadas as características dos indivíduos e do grupo. O eliminar do distanciamento com a arte circense é o primeiro passo para o pensar de um processo de ensino-aprendizagem que se dê não necessariamente sob uma lona, mas também em outros ambientes, como por exemplo, na escola. A arte circense pode ser um instrumento que possibilita diversos aprendizados, que vão desde a relação com outros temas (pertinentes ou não à educação física), o desenvolvimento de habilidades motoras e até mesmo a discussão de valores. Considerando os possíveis aprendizados que podem ser estimulados num processo pedagógico, não apenas como um instrumento a ser utilizado, o circo permanece enquanto um conteúdo a ser tratado na educação física (CLARO e PRODÓCIMO, 2005).

    Sendo assim, elege-se o circo como o mais novo trunfo da pesquisa comportamental e do desenvolvimento, pois

    “Considerar o circo como parte integrante da cultura humana (...) pode justificar sua presença no universo educativo, como conteúdo pertinente (...) neste sentido, considerando que grande parte das atividades típicas do circo possui um caráter motor, podemos considerar que, ao menos esta parte do repertório circense, forma parte como conteúdo pertinente à Educação Física, quanto disciplina que se ocupa de transmitir a cultura corporal dentro do marco escolar.” (BORTOLETO, 2003)

    Pensando sobre o prisma pedagógico, autores sugerem classificações para as modalidades trabalhadas nas atividades circenses de acordo com as ações motoras gerais e com o tamanho do material. Para a primeira classificação, consideram: acrobacias, manipulações, equilíbrios e encenação. Na segunda, fazem quatro divisões: modalidades com materiais de tamanho grande, médio, pequeno e sem materiais (ou corporais). Exemplificando a proposta pedagógica das atividades circenses, citam os malabares: trata-se de uma atividade de manipulação, que se baseia no controle de objetos no ar. Como estratégia pedagógica para uma maior adaptação ao ambiente escolar, os autores sugerem a utilização de jogos ou estratégias que permitam uma vivência do malabarismo mediante um certo contexto, como por exemplo a utilização de lenços como material, podendo ser substituído por saco plástico de supermercado para baratear o custo (Duprat & Bortoleto apud DA SILVA, 2009). Estas estratégias simples de aplicação, além de permitir uma difusão da prática das artes circenses com o intuito de proporcionar maior experiência para os participantes, tanto no aspecto social e motor, também abre espaço para uma reflexão ao fazer um contraponto às práticas corporais que possuem valores que atendem ao alto rendimento ou à estereótipos de práticas difundidos pela mídia (DA SILVA, 2009).

Sob o olhar do desenvolvimento

    Segundo Coste apud SILVA e SILVA (2002) o primeiro passo para o desenvolvimento psicomotor é a percepção e o reconhecimento do corpo pela criança (esquema corporal). Mas para a compreensão sobre a real importância da infância na vida do homem, necessitamos primeiramente acompanhá-la durante o processo de desenvolvimento, quando a vida desencadeia a cada momento que passa as transformações anatômicas e fisiológicas. Estas modificações, que fazem parte dos diferentes níveis do seu crescimento e desenvolvimento, irão repercutir nos desenvolvimentos mental, emocional e afetivo-social, nos momentos antes, durante e após a escolaridade como uma rica bagagem para toda a vida, assim como os estímulos motores. À medida que a criança cresce e se desenvolve, gradualmente passa a descobrir e conhecer as possibilidades de ação que seu corpo lhe proporciona, precebendo através dos estímulos que recebe seu envolvimento neste vasto universo de movimentos experimentados, desenvolvendo sua capacidade cerebral (KOREN, 2004).

    Para se pensar melhor os conceitos citados, entende-se que: segundo Gallahue e Ozmun (2005), o movimento é definido como o ato observável de mover-se; a educação motora é o processo permanente de mudança no comportamento motor proporcionado pela aprendizagem motora, pelo controle motor e pelo desenvolvimento motor; e o comportamento motor define-se pelo estudo das alterações no aprendizado motor, controle motor e desenvolvimento motor proporcionadas pela interação do aprendizado e dos processos biológicos. O controle motor, por sua vez, são as alterações subjacentes no desempenho de tarefas isoladas; o aprendizado motor são as alterações subjacentes no desempenho motor; e o desenvolvimento motor é definido como as alterações progressivas no comportamento motor proporcionadas pela interação entre as exigências da tarefa, a biologia do indivíduo e as condições do ambiente. Quanto à definção de habilidade motora, o autor descreve como o processo subjacente comum de controle em movimento, classificada muscular, temporal e ambientalmente em: rudimentar (utilização de grandes grupos musculares); refinada (utilização de pequenos grupos musculares para uma tarefa de precisão); discreta (começo e fim definidos); seriada (sequência de habilidades discretas); contínua (repetição ao longo do tempo); aberta (tarefa com modificações segundo um ambiente instável) e fechada (tarefa realizada em ambiente estável).

    Segundo os autores acima, de acordo com a idade da criança podemos observar o desenvolvimento de habilidades segundo padrões de movimento de equilíbrio (dinâmico, estático e axial), dentre outros. Nesta linha de pensamento, considera-se que em ginástica olímpica, por exemplo, utilizam-se basicamente as habilidades motoras grossas e coordenativas (BUSTO, 2001). Os movimentos da ginástica, modalidade na qual o circo está inserido, são considerados por Gallahue e Ozmun (2005) de padrão motor maduro, ou seja, a criança realiza o movimento composto de forma ampla (fase final da progressão pedagógica).

    “Os movimentos gímnicos realizados naturalmente como: andar, correr, saltar, equilibrar, trepar, rolar, girar e outros, são habilidades educáveis. (...) Isso acontece num processo de sucessos contínuos de determinados movimentos que estão sendo aprendidos e que precisam ser cuidadosamente educados, através de estímulos que promovam este desenvolvimento (...) é preciso dar atenção especial à criança, proporcionando-lhe todas as condições necessárias para que o desenvolvimento ocorra de forma satisfatória.” (KOREN, 2004)

Idéias finais

    Como descrito neste trabalho, o circo constitui parte da grande área denominada ginástica, caracterizado pedagogicamente de acordo com as habilidades. Por promover, como a ginástica, o desenvolvimento das habilidades motoras, pode ser aplicado tanto em ambientes pré-escolares (GUIRRA & PROCOCIMO, 2010) como em ensino-médio (DARIDO et al, 1999).

    Pautando-se pelo conceito de influência idealizada por Gallahue e Ozmun (2005) que as interações entre as condições ambientais, o objetivo da tarefa e o indivíduo afetarão a maturidade do desenvolvimento de um movimento específico, temos variáveis importantes a considerar na formação do homem. Ou seja, se for fornecido condições ambientais, lugares, momentos de práticas e tarefas que explorem e potencializem o fator indivíduo, características temporais próprias no desenvolvimento, pode-se obter resultados mais expressivos. Neste caso, atribuí-se ao circo este meio potencializador, pois já expressa-se estudos que envolvem a associação destes fatores no desenvolvimento (SILVA et al, 2004).

    “Portanto, o desenvolvimento global da criança irá depender dos estímulos adequados recebidos desde os seus primeiros momentos de vida, os quais são indispensáveis para que este processo possa ocorrer de forma harmoniosa. A base desse processo é o movimento.” (KOREN, 2004)

    As reflexões aqui estabelecidas fundamentam a possibilidade de estabelecer o circo ou artes circenses como conteúdo a ser trabalhado na educação física escolar, pois permitirá aos alunos conhecimentos e experiências que desenvolverão e enriquecerão o acervo motor. A maior inclusão desta prática nas propostas pedagógicas, que demandará a capacitação dos profissionais, pode viabilizar um maior número de idéias sobre o desenvolvimento da modalidade, quebrando com paradigmas e preconceitos da própria sociedade em relação às práticas corporais, tornando-a uma ferramenta para o desenvolvimento no ambiente escolar.

    “A arte circense com suas distintas possibilidades de intervenções artísticas e sócioeducativas é tão pertinente que tem obtido resultados importantes com crianças e jovens, mas pouco divulgadas e sistematizadas as informações de seus feitos. Interessante é constatar que o que antes era visto com olhar de reprovação e de depreciação para as trupes e circos, hoje se alia justamente para favorecer o envolvimento da escola e professores com as comunidades e estudantes que estão na borda das políticas públicas e em situação de risco social.” (VENDRUSCOLO, 2009)

Bibliografia

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