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Khalil Gibran

 

*Mestrando em Educação Física, UnB

Especialista em Docência do Ensino Superior pela Universidade Gama Filho

Licenciado em Educação Física pela Universidade Católica de Brasília

Licenciado em Letras-Português e

Respectiva Literatura pela Universidade de Brasília

** Especialista em Língua Espanhola pela Faculdade Noroeste de Minas

Graduada em Espanhol pela Universidade de Brasília

Graduanda em Letras-Português e

Respectiva Literatura pela Universidade de Brasília

Marcos Paulo de Oliveira Santos

marcospauloeducador@gmail.com

Renata Pereira Torres

renatatorres1@gmail.com

(Brasil)

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo apresenta uma reflexão teórica sobre a importância social de Gibran Khalil Gibran na modernidade. O debate teórico proposto subsidia-se na obra de Laraia, seguindo como referencial os pensamentos de Weber e Habermas, no que tange as suas visões sobre a condição moderna, para demonstrar que os quadros que se configuram são de desencantamento e de desrespeito ao ser humano. Nesse panorama, Gibran tenta unir o oriente ao ocidente para explicar o homem e ao mesmo tempo denunciar as injustiças sociais.

          Unitermos: Gibran. Modernidade. Desencanto.

 

Resumen

          Este estudio presenta una reflexión teórica sobre la importancia social de Gibran Khalil Gibran en la modernidad. El debate teórico propuesto es fundamentado por el trabajo de Laraia, teniendo como referencia las ideas de Weber y Habermas, en términos de sus puntos de vista sobre la condición moderna, para demostrar que los soportes que se configuran son de desencanto y de descrédito del ser humano. En este escenario, Gibran intenta unir oriente con occidente para entender al hombre y denunciar las injusticias sociales.

          Palabras clave: Gibran. Modernidad. Desencanto.

 

 
EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 150, Noviembre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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1.     Introdução: síntese biográfica1

    Khalil Gibran nasceu no dia 06 de janeiro de 1883, no Líbano, próximo aos milenares cedros. Fruto do matrimônio entre Kamilah, sua mãe e, Khalil Gibran, seu pai e coletor de impostos para o governo turco, que dominava o Líbano. Suas irmãs Mariana e Sultanah nasceram em 1885 e 1887, respectivamente.

    Conta-se que o jovem poeta, aos oito anos de idade, contemplou através da janela de sua residência a tempestade que caía em sua cidade. Estupefato com a beleza e a fúria da natureza, Gibran abriu a porta e saiu correndo de encontro aos vorazes ventos. Sua mãe, aflita, alcançou-o e o repreendeu, ato contínuo, obteve como resposta: Mas, mamãe, eu gosto das tempestades. Gosto delas. Gosto!. (Anos mais tarde, ele publicaria Temporais ou As Tempestades que, para alguns críticos, é o seu melhor livro em árabe). Outros fatos curiosos permearam sua vida infantil: passava horas a desenhar, mas em seguida destruía suas obras e afirmava que elas não se assemelhavam em nada ao que havia visto em sua tela mental.

    Desde a mais tenra idade amava a natureza e esse sentimento bucólico o acompanharia por toda a existência. Assim como a vida de Jesus Cristo, seu modelo e guia. Sob a égide Dele, afirmava possuir uma missão que se consubstanciaria por meio da sua arte. Para Gibran, a vida citadina e os prazeres materiais haviam tolhido a visão do homem acerca dos valores morais e espirituais, que deveriam ser hauridos na vida campesina e no contato com o Messias, Jesus. Ao contrário dos momentos idílicos das suas peregrinações em contato com a natureza de seu país, a vida doméstica era conflituosa. Seu pai era boêmio e ganhava pouco. Eram constantes as discussões entre seus pais. E por isso, no ano de 1894 o jovem poeta mudou-se com a família (e seu meio-irmão, Boutros) para Boston, nos Estados Unidos da América (EUA); apenas seu pai permaneceu no Líbano para tratar dos negócios. Sua família, nesse ínterim, passou por dificuldades financeiras e Gibran retornou ao Líbano para dar prosseguimento aos seus estudos.

    Dedicou-se a literatura árabe antiga e moderna – ministrada na escola al-Hikmah (ou Escola da Sabedoria), em Beirute. Aprofundou, também, seus estudos em diversos temas fora do currículo convencional, porque era autodidata e, nesse contexto, eclodiu de sua alma artística o veio para a pintura. (Área do conhecimento a que também se destacou bastante).

    Nesse período de estudos e contato com a sua cultura, Gibran teve ensejo de conhecer uma singela camponesa, Hala Daher, e propôs-lhe casamento. Todavia, o tio da jovem, que era bispo, não lhe consentiu. Esse fato particular, a opressão do clero e dos latifundiários contra as pessoas (naqueles tempos de avanços tecnológicos, mas de retrocesso moral) fizeram com que Gibran guardasse uma raiva incontrolável, que se manifestaria em suas obras à maneira dos Enciclopedistas franceses incitando as massas a revolta. Apaixonado, idealista e solitário. Gibran nunca encontrou amor igual ao de Hala Daher.

    O período entre 1902 a 1904 seria um dos mais trágicos do poeta e pintor, porque foi nesse período que sua mãe, sua irmã, Sultanah, e seu meio-irmão, Boutros, morreram nos EUA, vitimados pela tuberculose. Porém, o ínclito poeta continuou a viver juntamente com sua irmã, Mariana. Em 1903 teve suas pinturas reconhecidas por Fred Holland Day, um famoso fotógrafo da época, que fora seu patrão. Posteriormente, teve ensejo de apresentar seu trabalho na Cambridge School, uma instituição educacional particular dirigida por Mary Haskell, que se tornou uma preciosa benfeitora e amiga, que o auxiliaria em todos os momentos de sua vida. Inclusive, sob os auspícios dela, Gibran teve a oportunidade de estudar na Academia Julian e na Escola de Belas Artes, em Paris. Lá, reencontrou um velho amigo, Yusuf al-Huwayik, também estudante de artes. Ambos simpatizavam pouco com o Cubismo e mantiveram-se leais à tradição clássica. Também tiveram ensejo de conhecer o grande escultor Auguste Rodin, que acabou por influenciar suas obras. E conheceram também Debussy, Maeterlink, Rostand, Pierre Loti.

    Gibran visitou, outrossim, Londres, onde foi influenciado pelas obras de William Blake e Friedrich Nietzsche. O intrépido Gibran envidou hercúleos esforços na vida artística, pois acreditava que seu fulgente pensamento serviria de motivação para encetar os passos da libertação humana (tão impregnada pelo materialismo e esquecida das belezas espirituais). Porém, outro episódio triste em sua vida ocorreu, por volta de 1909-10 seu pai faleceu, em Becharre.

    Passado o trauma, pouco depois reuniu uma plêiade de amigos com o intuito de fundar um teatro-ópera em Beirute, cujas cúpulas do monumento simbolizariam a união entre a Cristandade e o Islão. Entretanto, já nos EUA, com a libertação dos territórios árabes do jugo otomano, eles decidiram formar uma academia literária (A Liga Literária), que tinha por objetivo precípuo contribuir para o renascimento das letras árabes naquele país. Duas revistas foram publicadas em Nova Iorque e serviram para esses ideais: Al-Funun (As Artes) e As-Saieh (O Errante).

    Gibran dedicou sua vida as artes e a literatura. Suas primeiras obras literárias foram escritas em árabe, posteriormente, optou pelo inglês. Essas obras serviriam de base para a concretização da sua missão, a publicação do livro O Profeta. Mais tarde ele mesmo confidenciaria a uma amiga o motivo pelo qual escreveu tantos livros (Challita, 1978). Ele deveria ter escrito tão-somente uma obra. E assim o fez com O Profeta que se tornou best-seller em todo o mundo.

    Aos 10 dias de abril de 1931 faleceu o poeta Gibran, após uma árdua e longa doença, descrita na autópsia como cirrose hepática (Challita,1978). Foi sepultado no Líbano e o governo desse país fundou o Museu Gibran.

2.     O legado gibraniano

    A obra gibraniana é expressiva: artigos para jornais e revistas, poesias, prosas, pinturas. Em contrapartida, acredita-se que a apreciação crítica dessa vasta produção não tem sido suficiente. Não constitui uma tarefa fácil tal apreciação, porque as inquietações que pertenciam à alma do poeta e que se corporificaram em suas obras eram (e são) universais; impossíveis de serem esgotadas. Diante desse panorama, pretende-se fazer uma breve análise das suas obras sob o ponto de vista sociológico. E possibilita que novas discussões sejam motivadas no campo literário propriamente dito, uma vez que se abrem novos horizontes para futuras explorações de obra tão rica e significativa, mas esquecida dos leitores brasileiros.

    Por se tratar de obras pouco exploradas e tão substanciosas, que faziam críticas aos momentos vividos pelo autor e pela sociedade, fundamenta-se a análise no pensamento de Antônio Cândido (1980), que diz ser necessário

    ter consciência da relação arbitrária e deformante que o trabalho artístico estabelece com a realidade, mesmo quando pretende observá-la e transpô-la rigorosamente, pois a mimese é sempre uma forma de poiese. (...) se tomarmos o cuidado de considerar os fatores sociais no seu papel de formadores da estrutura veremos que tanto eles quanto os psíquicos são decisivos para a análise literária (1980:13).

    Partindo dessa premissa, elegem-se por corpus desse estudo as seguintes obras: uma novela da obra As Ninfas do Vale (1908), Asas Partidas (1914) e O Profeta (1927). Segundo Challita (1978), as obras gibranianas podem ser dividas em duas fases. Em um primeiro momento,

    (...) o homem que Gibran queria elevar e libertar era o homem de um determinado país e de uma determinada classe social. Era o homem do povo do Líbano e de outros países orientais, oprimido pelo clero e pelos senhores feudais, e em quem Gibran desejava insuflar bastante orgulho e audácia para torná-lo capaz de se erguer contra seus opressores (1978, pp. 9-10).

    Em outra fase, seu objetivo se amplia.

    O homem que Gibran procura (...) engrandecer e libertar é tanto o ocidental quanto o oriental, tanto o opressor quanto o oprimido; e quer libertá-los, não mais uns dos outros e, sim, das limitações mais perniciosas impostas a todos eles pelas enfermidades e cegueiras inerentes à sua condição humana. E essa libertação deveria ser feita pela sabedoria (Idem, 1978, p.10).

    Gibran, portanto, tem dois momentos bastante distintos de sua vida. O primeiro é a tentativa de libertação do povo libanês e, por extensão, de todo o Oriente Médio da opressão por parte do clero e das potências que ali se instalaram em processo de colonização. Em outro momento, o autor já mais amadurecido tenta dialogar com o ocidente mostrando as belezas e a sabedoria do oriente.

    É a tentativa do poeta de demonstrar que “os (...) comportamentos não são biologicamente determinados. A (...) herança genética nada tem a ver com as (...) ações e pensamentos, pois todos os (...) atos dependem inteiramente de um processo de aprendizado” (Laraia, 2009, p. 38). Assim, Gibran calca seu pensamento na educação dos indivíduos, como uma poderosa ferramenta para a edificação de um mundo mais humanizado e tolerante com a diversidade.

    Para Laraia (2009) a corrente de pensamento denominada determinismo geográfico, que estabelece que “as diferenças do ambiente físico condicionam a diversidade cultural.” (Ibidem, 2009, p. 21), também é equivocada embora tenha pertencido há um bom tempo nas idéias da Antropologia. Essa corrente de pensamento foi rechaçada, porque é a cultura que realiza uma seleção sobre o meio e não o contrário. De tal sorte que é possível asseverar que “a grande qualidade da espécie humana foi a de romper com suas próprias limitações”. (Ibidem, 2009, p. 24). O ser humano, em suma, é fruto de um meio cultural e suas ações configuram o meio em que vive. “Os comportamentos não são biologicamente determinados” (Ibidem, 2009, p. 38). E Gibran almejava desconstruir as barreiras da intolerância que separava (e ainda separam) ocidente do oriente.

2.1.     As Ninfas do Vale

    Obra publicada em 1908 e situada na primeira fase proposta por Mansour Challita. Trata-se de uma obra revolucionária, em que Gibran advoga em favor dos oprimidos sociais e políticos. Faz duras críticas ao clero hipócrita e canta um novo tempo, em que as pessoas não mais se norteariam por instituições e tradições vãs. Mas pelo modelo legado por Jesus Cristo.

    “Para ele, a humanidade divide-se esquematicamente em duas classes: os pobres e os ricos – os dominados e os dominadores. Os primeiros são todos bons: é preciso apoiá-los; os segundos são todos perversos: é preciso combatê-los.” (Op.cit., 1978, p. 17)

    Nessa obra Gibran tem a sensibilidade aflorada; compadece-se da dor alheia, entretanto, suas idéias ainda estão pouco desenvolvidas e sua visão acerca da problemática humana é superficial. Essa obra foi bem aceita pelo público e a despeito das idéias ainda pouco desenvolvidas, ela foi responsável por renovar a literatura árabe, por encetar um colorido que encantava.

    As Ninfas do Vale é uma obra composta por três novelas, que esconde na ficção um ódio revolucionário. A primeira história chama-se Marta, de Ben. É narrada em primeira pessoa e nela se encontra o fenômeno subjetivo do chamado discurso indireto livre, ou seja, momentos em que reflexões da personagem mesclam-se às do narrador. Trata-se de uma técnica complexa, porque a voz autoral revestida de uma máscara confunde-se com a personagem e o narrador (com as suas idiossincrasias).

    A jovem Marta vivia em Ben, uma singela aldeia libanesa. Era órfã (seu pai morrera quando ela era ainda de berço e, sua mãe, antes que ela completasse 10 anos) e desde pequena fora criada por um vizinho pobre, com sua mulher e filhos. Não possuía bens materiais, era malvestida e passava fome, porque comia muito pouco.

    Todas as manhãs, Marta levava a vaca para o pasto. E nesse contexto, temos a primeira dura crítica de Gibran: “(...) Enquanto a vaca pastava, a pequena órfã ora cantava com os pássaros, ora chorava com o córrego, ora contemplava as flores e as borboletas. Invejava a vaca por ter tanto que comer." 2(Gibran, 1973, p. 11).

    Ou seja, a condição animal – livre e que podia bem se alimentar – era infinitamente melhor da condição humana, que não tinha sua ontologia respeitada. Com o tempo a moça foi crescendo, embora guardasse no peito a ingenuidade da vida bucólica. Numa determinada época, quando contava dezesseis primaveras, quando estava junto a um córrego, sentiu a presença de um cavaleiro. Que, ato contínuo, desmontou-se do animal e pediu-lhe informações sobre um caminho que deveria seguir. A jovem, porém, não sabia informar-lhe; aturdida que se encontrava por estar diante de um homem de olhar tão penetrante e enigmático.

    Diz-nos o narrador:

    Nós, que passamos a maior parte de nossa vida nas cidades populosas, quase nada sabemos sobre a vida dos habitantes das aldeias isoladas do Líbano. O turbilhão do modernismo 3 nos fez esquecer a filosofia daquele modo de vida belo e singelo, cheio de virtude e inocência. Somos materialmente mais ricos que os aldeões, mas são eles os mais nobres. Nós muito semeamos, e pouco ceifamos. Eles ceifam o que semeam. Somos escravos da ambição, enquanto que o contentamento os mantém sempre livres. Bebemos a vida numa taça turbada pela amargura. Eles bebem a vida em toda a sua limpidez (Idem, 1973, pp. 12-13).

    Naquele dia, ela nunca mais voltou para casa. Seu progenitor debalde saiu a procurá-la. E sua mulher passou a noite chorando... Havia sonhado: “Vi-a certa vez em sonho, sendo atacada por uma fera selvagem, e ela estava sorrindo e chorando ao mesmo tempo” (Idem, 1973, p.14). Nunca mais o eu-narrador ouvira falar de Marta.

    Após um tempo e já de volta a Beirute, “contemplando a luta humana na praça do mercado” (Idem, 1973, p.14), um menino de uns cinco anos se aproximou dele vendendo-lhe flores. Ele as comprou e iniciou uma conversa com o jovem, que foi tomado de espanto, porque “habituara-se, como seus semelhantes humildes, a ser interpelado com voz áspera por aqueles que consideram os meninos das ruas como coisas sujas e desprezíveis, e não como pequenas almas feridas pelas flechas do destino”. (Idem, 1973, p.16).

    Ao travarem um diálogo, o eu-narrador percebeu que o jovem era filho de Marta e que desconhecia o significado da palavra pai. O eu-narrador pediu-lhe que o levasse a sua mãe. Quando eles chegaram à casa paupérrima, a mãe, deitada e enferma disse ao visitante: “Que quer de mim, ó homem? Comprar um restante de vida para manchá-lo com suas paixões? Não tem vergonha de procurar uma mulher doente que só espera a morte?” (Idem, 1973, pp. 17-18).

    Entrementes, o eu-narrador redarguiu-lhe dizendo que também era um libanês das montanhas, que ali não estava para julgá-la e que ela não era impura, apesar de ter sido lançada às mãos dos impuros. Qual um consolador de almas, o eu-narrador mostra-lhe o caminho da brandura e da resignação, em verdade, ele assemelha-se a Jesus de Nazaré quando diante da mulher adúltera que se via cercada pelos homens querendo apedrejá-la. A mulher “pecadora”, após uma breve reflexão, estertora cantando o Pai Nosso. E a trama é encerrada com o sepultamento de Marta, em condições degradantes, num caixão barato; levada por dois mendigos, onde fora enterrada em um campo abandonado. Seus despojos não foram aceitos no cemitério da cidade, por ordem dos padres, que também se recusaram a rezar sobre os seus restos. Seu filho e um moço (eu-narrador) acompanharam-na até os últimos momentos.

    Gibran Khalil Gibran condensa nessa história as aflições de sua vida. Considera a vida citadina um tormento para a pureza do ser humano, porque nela o ser humano recebe intoxicações do materialismo que o torna cego e o impede de ser fraterno, de dialogar e estreitar laços de amizade. O ser humano mergulha na ambição e, por essa razão, acaba sendo lobo de si mesmo. A fera selvagem do sonho da mãe adotiva de Marta nada mais é do que o homem monstro de si mesmo, que tem a capacidade de corromper a alma ingênua. Ou em outros termos o homem é colocado na condição de ser zoomórfico, que apenas quer saciar seus desejos materiais e carnais. Explora a camponesa, virgem e pura (uma retomada ao ideal romântico). Vende-a aos demais “amigos” e abandona-a ou não reconhece o filho, fruto dessa relação espúria.

    A figura clerical também é bastante criticada na obra gibraniana, que se recusa a rezar sobre os despojos da jovem vendedora de ilusões. E ainda a proíbe de ser enterrada junto aos “civilizados”. Interessante notar que a figura que o eu-narrador adota é a mesma de Jesus. Em outras palavras, o eu-narrador não atira a primeira pedra. Ao contrário, mostra que a jovem mulher está isenta de pecados e que se houve alguma mácula, esta é apenas em seu corpo enfermiço, não em sua alma alvinitente que nenhum homem tem acesso. Nessa novela, Gibran advoga em defesa da mulher moderna, constantemente vilipendiada na sociedade moderna e que se vê obrigada a vender o corpo para a própria subsistência. Outra relação importante estabelecida por Gibran é a dicotomia campo-cidade. Para ele, o campo é o local de paz, de (re) encontro consigo mesmo. A cidade é o lugar da miséria e da intolerância. Nesse sentido, pode-se retomar o pensamento weberiano de desencantamento do mundo, porque o sujeito moderno não vê sentido para uma existência exequível no mundo capitalista e racionalizado (Weber, 1989), ao fim e ao cabo, para Gibran a vida campesina ou o contato com a natureza é a melhor maneira do sujeito se tornar mais fraterno e humano.

2.2.     Asas partidas (o primeiro amor de Gibran)

    Obra publicada em 1914, também se situa na primeira fase do autor.

    Trata-se de um romance vivenciado e escrito por Gibran. É, portanto, autobiográfico. Tem-se um narrador, portanto, autodiegético. A obra carrega em seu bojo um sentimentalismo e um anticlericalismo, o que custou a excomunhão de Gibran da Igreja.

    (...) o livro também tem suas fraquezas, características do jovem escritor romântico que Gibran era na época: prolixidade, abuso dos discursos e das metáforas, falta de lógica e de rigor no desenvolvimento da trama, e excesso de lágrimas, suspiros, lamentações, sufocações. (Op.cit., s/d, p. 17).

    O eu-narrador contava 18 anos quando conheceu Selma Karame. Tinha por hábito andar sem rumo, “indeciso entre o apelo da natureza e o apelo dos livros” (Gibran, s/d, p. 30). Não havia perspectiva em seu viver. Sua vida só ganha um colorido quando conhece a sua musa, Selma.

    (...) Minha vida era vazia, desértica, fria, tal o sono de Adão no Paraíso, quando vi Selma na minha frente como uma coluna de luz. Foi ela a Eva deste coração repleto de enigmas e singularidades; foi ela quem lhe revelou o sentido da vida e o colocou, como um espelho, perante as suas sombras. (Idem, s/d, p.30).

    O eu-narrador teve ensejo de visitar um amigo e, quando travavam um fraternal diálogo, surgiu-lhes à frente Fares Karame que era pai de Selma e, também, grande amigo do pai do eu-narrador. “(...) És o filho de um velho amigo muito querido que foi meu companheiro na primavera da vida. Estou feliz de encontrar-te e encontrar o teu pai em ti!” (Ibidem s/d, p. 37).

    A partir daquele encontro fortuito, o eu-narrador teve chances de se aproximar de Karame, mas com o desejo de conhecer a jovem Selma, cuja beleza era bastante comentada na região. O eu-narrador tem a chama do amor no peito, mas ao mesmo tempo o receio daquela aventura. Sabe, a partir da informação de seu amigo, que o pai de Selma é bastante influenciável apesar de ser um homem bom. E tem noção, intuitivamente, que não lograria a felicidade ao lado da jovem Selma.

    Os jovens são munidos de asas feitas de fantasia e de ilusão, que os levam para além das nuvens, de onde vêem a existência colorida como um arco-íris e onde ouvem canções de glória e de grandeza. Mas aquelas asas não tardam a ser partidas pela tempestade da experiência. Caem, então, os jovens sobre a terra dura, e passam a ver-se num espelho estranho onde o homem é deformado e diminuído. (Ibidem, s/d, pp. 42-43).

    É curioso o primeiro contato do eu-narrador com a sua musa.

    A moça olhou intensamente nos meus olhos como se quisesse descobrir neles o motivo da minha visita. Depois, estendeu-me a mão, branca e macia como os lírios do vale. Senti, ao apertá-la, um sentimento novo e estranho, similar ao pensamento poético quando começa a formar-se na imaginação. (Ibidem, s/d, p. 43).

    Além de despertar-lhe as recônditas emoções, esse primeiro contato desperta-lhe o pensamento poético. A gênese da capacidade poética, na visão de Gibran, está no Amor. Fato que é mencionado diversas vezes na obra.

    Em suma, a trama gira em torno dos três personagens.

    Três inocentes fracos que muito sentem e pouco sabem, vivendo um drama que diz respeito a cada um deles. Um homem idoso e respeitável que ama sua filha e não quer senão a sua felicidade; uma moça de 20 anos de que vê o futuro ao mesmo tempo próximo e distante e procura adivinhar se ele lhe trará a felicidade ou a infelicidade; um jovem, sonhador e imaginativo, que ainda não provou nem o vinho nem o vinagre da vida e que tenta, apesar de sua fraqueza, abrir as asas para voar no mundo do amor e do saber. (Ibidem, s/d, p. 51).

    O pai de Selma, durante o jantar com a filha e o visitante (eu-narrador), foi surpreendido por uma carruagem do bispo. Que almejava falar-lhe em particular acerca dos necessitados e pobres. Quando o pai da jovem voltou à sua casa, disse tristemente a sua filha que em breve ela deveria se unir a outro homem. Em verdade, o bispo, Bulos Galeb, queria a união da jovem Karame com o seu sobrinho, Mansur Bei Galeb pelos recursos econômicos que ela possuía.

    Fares Karame era um homem rico, e não tinha outro herdeiro além de Selma. O bispo a escolheu para noiva do seu sobrinho não pela beleza do seu rosto e a nobreza da sua alma, mas porque era rica e podia assegurar com seus milhões e suas vastas propriedades o futuro de Mansur Bei, e ajudá-lo a conquistar um lugar de destaque junto à aristocracia. (Ibidem, s/d, p. 61).

    O matrimônio é duramente criticado nessa obra, assim como a condição degradante da mulher no Oriente, no período em que o livro foi publicado. Gibran transporta seu drama existencial (real) para a ficção e, assim, fala por meio do eu-narrador:

    O matrimônio em nossos dias é um comércio que faz rir e chorar, pois está nas mãos dos rapazes e nas mãos dos pais das moças. Na maioria dos casos, os rapazes ganham. Os pais das moças perdem sempre. Quanto às moças, que passam de um lar para outro como móveis, sua vitalidade fenece e, como os móveis velhos, acabam sendo postas nos cantos das casas, vítimas da escuridão e de uma lenta destruição. A civilização atual, ainda dominada pela ganância do homem, desenvolveu um pouco a percepção da mulher, mas aumentou muito suas dores. Ontem, a mulher era uma serva feliz; hoje, é uma senhora infeliz. Ontem, era uma cega que andava à luz do dia; hoje, tem visão, mas anda nas trevas da noite. Ontem, era bela na sua ignorância, virtuosa na sua ingenuidade, forte na sua fraqueza; hoje, tornou-se feia na sua sofisticação, superficial nos seus conhecimentos, distante do coração pelas suas pretensões. Virá um dia em que a mulher reunirá a beleza e o conhecimento, a arte e a virtude, a fraqueza do corpo e a força da alma? (Ibidem, s/d, p. 78).

    Tem-se, portanto, a coisificação do gênero feminino. E o autor advoga para que a injustiça não mais vigore na sociedade. Versa em defesa dos mais necessitados; daqueles que são oprimidos pelo clero, pela aristocracia.

    Após algumas reflexões, o eu-narrador apresenta-nos o marido da jovem Karame. Era desses homens fúteis, soberbos, que tudo consegue e não importam os meios utilizados. Mansur Bei casou-se com a jovem, exclusivamente, por interesse financeiro.

    Ao verem seus sonhos dissolvidos pela dura realidade da vida, os jovens adentraram-se em um pessimismo, que só é aliviado no contato dentro do santuário. Que era um local sigiloso nas adjacências, onde podiam se encontrar e sorver a paz interior propiciada por Jesus e Astarté, 4 ambos desenhados nas paredes do santuário.

    Os jovens buscam na experiência religiosa e o no convívio idílico o conforto de suas almas. Porém, passado um período, o pai da jovem, amargurado, adoeceu gravemente. E, veio a óbito. O único refúgio da jovem era o santuário e a presença fraternal e amorosa do eu-narrador. Entretanto, passado um tempo, a jovem viu-se ameaçada pelo esposo, por causa dos encontros escondidos com o eu-narrador. E os encontros tornaram-se mais difíceis. Aliás, é bastante recorrente na literatura essas situações de casais que são impedidos por fatores exógenos de se encontrarem e tentam burlar a norma vigente.

    Assim, passados cinco anos, ela ainda não havia engravidado. O último capítulo intitulado, O Salvador, é justamente o momento em que ela consegue engravidar (após sofrer duras críticas da sociedade pela sua esterilidade) e não era sem motivo que Gibran retoma a figura da deusa Astarté no templo para simbolizar que a fertilidade em algum momento surgiria para aquela personagem.

    Quando chegou o momento do nascimento do primeiro filho de Mansur Bei, ela foi auxiliada pela parteira e pelo médico. A criança nasceu e, nesse momento clímax da história, duas forças se digladiaram: a vida e a morte.

    A jovem Karame estava exausta e a criança não havia nascido com uma boa saúde. Quando todos comemoravam o nascimento do herdeiro de Mansur Bei, este permanecia indiferente. O médico detectou um problema na criança e percebeu que ela não sobreviveria. A criança recém chegada deu um último suspiro e morreu (Astarté também uma deusa da morte). A jovem Karame quis mantê-la nos braços e, após um comovente apelo pela sua própria libertação daquele inferno conjugal, também morreu com a criança nos braços. Ambas foram enterradas num mesmo jazigo. No momento do velório era explícita a indiferença do jovem Mansur Bei, porque seu tio providenciaria outro matrimônio com uma mulher mais rica.

    E o eu-narrador acompanhou distante o velório, delatando a hipocrisia eclesiástica e a indiferença humana. Quando todos já não mais estavam no local, ele se jogou sobre o túmulo e chorou copiosamente pelo seu amor. Ora, se foi pelo amor que se criou um elo entre o eu-narrador e sua musa, tornando-os indivisos e separados dos seus grupos sociais que os impediam de serem felizes. Será necessária a morte para a verdadeira libertação de ambos. As temáticas de amor e morte são bastante tênues e, nesse contexto, pelo fim da obra é possível a leitura de que o eu-narrador tinha morrido socialmente, ou seja, nada mais faria sentido sem a sua musa.

    Ou ainda pode-se falar no desencantamento do personagem (Weber, 1989) com as intricadas problemáticas do mundo. Que se caracteriza pela pobreza cultural e perda de referencial ou, em outros termos, é como se não houvesse mais “chão” para se sustentar no mundo (Habermas, 1987).

2.3.     O Profeta

    Obra publicada em 1923 e situada na segunda fase do poeta, agora mais amadurecido; experiente. Essa obra começou a ser escrita quando ele contava 15 anos, mas só veio a público após muitas modificações. O Profeta é sua obra-prima. É um poema em prosa. É a concretização da sua missão, ou seja, legar para a humanidade uma obra que versasse sobre magnas questões existenciais e fosse um recanto seguro para o bem viver; um ideal. Mas, sobretudo, um libelo contra a desumanização do homem.

    Gibran idealizou um profeta denominado Al-Mustafa que viveu um período numa terra estrangeira e no momento de sua partida viu-se cercado pela população que lhe solicitava algumas palavras sobre alguns temas essenciais. Foram-lhe sugeridos alguns temas, todavia, ele não os respondia. Apenas estava bastante emocionado e caminhava até o templo. Nesse ínterim, uma mulher consegue chamar-lhe atenção para os apelos da população: “E uma mulher chamada Almitra saiu do santuário. E ela era vidente. E ele a encarou com excessiva ternura, pois fora ela a primeira a procurá-lo e nele crer no dia de sua chegada à cidade”. (Gibran, s/d, p. 07). Mais uma vez, Gibran oferece destaque a mulher, tantas vezes vilipendiada na sociedade. Al-Mustafa é o arquétipo de Jesus, obra literária que viria algum tempo depois. Seu olhar é de ternura e respeito, porque a figura feminina foi a única a respeitá-lo e crer em sua missão.

    Após saudá-lo, ela solicita, em nome do povo, que ele conceda alguns ensinamentos antes de partir. Esses ensinamentos seriam passados de geração em geração. Gibran, mais uma vez, dá voz a uma mulher (que fala por seu povo) e esta é atendida pelo profeta, que responde: “Povo de Orphalese, de que poderia falar-vos senão do que está agora se movendo dentro de vossas almas?” (Idem, s/d, p. 08).

    É nesse contexto que se inicia a obra poética.

    Elegem-se para breve análise dois temas que são recorrentes nas obras gibranianas: o casamento e a religião.

    O Matrimônio

    Então, Almitra falou novamente e disse: E que nos dizes do matrimônio, mestre?

    E ele respondeu, dizendo:

    Vós nascestes juntos, e juntos permanecereis para todo o sempre.

    Juntos estareis quando as brancas asas da morte dissiparem vossos dias.

    Sim, juntos estareis até na memória silenciosa de Deus.

    Mas que haja espaço na vossa junção

    E que os ventos do céu dancem entre vós

    Amai-vos um ao outro, mas não façais do amor um grilhão:

    Que haja antes um mar ondulante entre as praias de vossas almas.

    Enchei a taça um do outro, mas não bebais na mesma taça.

    Dai de vosso pão um ao outro, mas não comais do mesmo pedaço.

    Cantai e dançai juntos, e sede alegres, mas deixai cada um de vós estar sozinho,

    Assim como as cordas da lira são separadas e, no entanto, vibram na mesma harmonia.

    Dai vossos corações, mas não os confieis à guarda do outro.

    Pois somente a mão da vida pode conter vossos corações.

    E vivei juntos, mas não vos aconchegueis em demasia;

    Pois as colunas do templo erguem-se separadamente,

    E o carvalho e o cipreste não crescem à sombra um do outro. (Idem, s/d, pp. 13-14).

    A Religião

    E um velho sacerdote disse: Fala-nos da religião

    E ele disse:

    Tenho eu falado de outra coisa hoje?

    Não é a religião todas as nossas ações e reflexões?

    E tudo o que não é ação nem reflexão, mas aquele espanto e aquela surpresa sempre brotando na alma, mesmo quando as mãos talham a pedra ou manejam o tear?

    Quem pode separar sua fé de suas ações, ou sua crença de seus afazeres?

    Quem pode espalhar suas horas perante si, dizendo: Esta é para Deus, e essa é para mim; esta é para minha alma, e essa é para meu corpo?

    Todas vossas horas são asas que adejam através do espaço, passando de um Eu a outro.

    Aquele que veste sua moralidade como veste seus melhores trajes, melhor seria que andasse desnudo:

    O vento e o sol não cavarão buracos na sua pele.

    E aquele que traça sua conduta pela ética, encarcera seu pássaro cantor numa gaiola.

    A mais livre canção não chega através de grades e arames.

    E aquele para quem a adoração é uma janela a abrir, mas também a fechar, não visitou ainda o santuário de sua alma, cujas janelas permanecem abertas de aurora a aurora.

    Vossa vida cotidiana é vosso templo e vossa religião.

    Todas as vezes que penetrardes nela, levai convosco todo o vosso ser.

    Levai o arado, a forja, o macete e a lira,

    Todas as coisas que modelastes por necessidade ou por prazer.

    Pois nos vossos sonhos, não podeis elevar-vos acima de vossas realizações nem cair abaixo de vossos fracassos.

    E levai convosco todos os homens,

    Pois na vossa adoração, não podeis voar acima de suas esperanças nem rastejar abaixo de seu desespero.

    E se quereis conhecer a Deus, não procureis transformar-vos em decifradores de enigmas.

    Olhai, antes, à vossa volta e encontra-Lo-eis a brincar com vossos filhos.

    E erguei os olhos para o espaço e vê-Lo-eis caminhando nas nuvens, estendendo os braços no relâmpago e descendo da chuva.

    E O vereis sorrindo nas flores e agitando as mãos nas árvores. (Ibidem, s/d, pp. 75-76).

    No primeiro poema, o respeito deve ser interpretado na total acepção do termo. (Sob os diversos aspectos da vida humana). Gibran o apresenta como condição sine qua non para a vida conjugal, mas, sobretudo, para o convívio social. Outro tema abordado é o amor, que só é ideal quando acompanhado da racionalidade. Caso contrário, a vida conjugal pode ser encarada como “um grilhão”. Assim, em seu tempo, ele já dava a condição ontológica da mulher, que para ele é provida de sentimentos, mas também de razão; de luta pelo social, mas também de ternura nos seus gestos feminis.

    No segundo poema, tem-se por meta o cidadão probo. Aquele que não se restringe ao particular, mas preocupa-se com o coletivo; não faz distinção entre os homens. Ao contrário, procura auxiliar a todos, porque a sua vida, o seu pensamento e a sua conduta são as bases de sua religião. Para Gibran, o fenômeno religioso é compreendido como a concretização do preceito “amai-vos uns aos outros”.

    Em ambas as situações têm-se evidenciado o verso livre. E são encontradas algumas figuras de linguagem, que dão um colorido especial ao poema. Depois de versar sobre diversos temas o profeta, Al-Mustafa, parte para a sua cidade e a obra é encerrada. Percebemos nitidamente o desejo ardente de se atingir um ideal. Gibran tenta resgatar o homem do emaranhado de puerilidades em que se meteu.

3.     Considerações finais

    A obra gibraniana é extensa e complexa. O presente estudo não teve por objetivo precípuo esgotá-la. Ao contrário, buscou-se dar um contributo a literatura árabe, poucas vezes analisada criticamente na sociedade. Para uma melhor compreensão da cultura recorreu-se ao proposto por Laraia (2009). Constatou-se ainda que o pensamento de Weber (1989) de desencantamento do mundo é bastante presente nas obras de Gibran e justificam as ações dos personagens, que tentam compreender o mundo (a compreensão é outra categoria weberiana), mas, também, demonstram um desencanto com o mesmo. O que para Habermas (1987) corresponde a pobreza cultural e a perda de referencial.

    Gibran é revolucionário e idealista. Suas idéias em um primeiro momento são utópicas. É a tentativa frustrada de modificar a sociedade de modo revolucionário e intempestivo. Em sua primeira fase, apresenta-nos uma sociedade dicotomizada: ricos e pobres, dominantes e dominados, etc. E, utiliza-se de argumentos pouco desenvolvidos, embora ricos de beleza e cor. Em um segundo momento, mais amadurecido, não reduz seu pensamento aos fatos superficiais. Mas, busca no próprio ser humano (na sua condição ontológica), a força que o tornará melhor e, por conseguinte, a sociedade menos desigual. Não são páginas jactanciosas de bom comportamento, mas um convite a reflexão sobre a condição e o papel humanos no mundo.

    Em um período da humanidade de avanços tecnológicos e científicos, mas também de ganância, violência e hediondez (como a Primeira Grande Guerra, período em que viveu), o autor volve ao passado e resgata o Amor não amado, Jesus, seu modelo; seu herói. Porém, essa postura de Gibran não se restringe somente a Jesus. Mas a si mesmo, quando se reveste da indumentária de João, o Louco ou do profeta Al-Mustafa.

    Em um período de profundos desníveis sociais, ele advoga em defesa da mulher, historicamente vilipendiada pelo homem. Ela não tem voz na sociedade, mas na obra gibraniana sim; ela é amada e respeitada pelos heróis (Al-Mustafa, por exemplo), em síntese, ela é protagonista. O matrimônio, que é um conluio espúrio, é duramente criticado porque se olvida o sentimento feminino, em detrimento de interesses materiais.

    Uma plêiade de questões sociais e políticas são abordadas nas obras de Gibran. Esse estudo não se esgota, ao contrário, convida os pesquisadores do campo literário a novas reflexões acerca de magnas questões propostas pelo poeta do Líbano, que tentou unir oriente e ocidente.

Notas

  1. Os dados biográficos foram retirados do site da Embaixada do Líbano no Brasil. Disponível em http://www.libano.org.br/olibano_arteecultura_literatura.html. Acesso em 20/03/2010.

  2. Grifo meu.

  3. Grifo meu.

  4. Deusa da fertilidade, da sexualidade, da guerra e da lua. Filha de Baal.

Referências

  • CÂNDIDO, Antônio. Literatura e Sociedade: Estudos de teoria e história literária. 6. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1980.

  • CHALLITA, Mansour. Lutas e Triunfo de Gibran. In: Areia e Espuma. Rio de Janeiro: Associação Cultural Internacional Gibran, 1978.

  • GIBRAN, Khalil Gibran. As Ninfas do Vale. Rio de Janeiro: Associação Cultural Internacional Gibran, 1973.

  • _____________________. Asas Partidas. Rio de Janeiro: Associação Cultural Internacional Gibran, s/d.

  • _____________________. O Profeta. Rio de Janeiro: Associação Cultural Internacional Gibran, s/d.

  • HABERMAS, Jürger. The theory of commuicative action. Boston.: Polity Press, 1987. v. 2.

  • LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 23.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.

  • LÍBANO. Embaixada do Líbano no Brasil. Disponível em http://www.libano.org.br/olibano_arteecultura_literatura.html. Acesso em 20/03/2010.

  • WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira, 1989.

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