Lecturas: Educación Física y Deportes
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ATIVIDADES FÍSICAS FEMININA NO
MARANHÃO IMPERIAL (1823-1889)

Leopoldo Gil Dulcio Vaz


GRIFI (1989), ao se referir aos jogos de bola, encontrou que Galeno, "o famoso médico grego", recomendava tal prática para fins higiênicos e até mesmo escreveu um tratado específico sobre "o jogo da pequena bola". Mas os jogos de bola, na Grécia, já aparecem nos poemas homéricos (p. 68). Mais adiante, afirma que nos séculos XIV, XV, e XVI destacou-se mais que os outros os jogos da bola, que se fundiu-se às manifestações folclorísticas, no novo contexto das estruturas renascentistas:

"Na França, particularmente, a bola (de dimensões maiores da normal), nascido no tardo-medievo, como instrumento de contenda incruenta, torna-se momento lúdico e agonístico, aberto a todos. Os jogos mais conhecidos são a paume, o pallone, a soule, a crosse, aos quais seguiram-se, na Itália, o calcio-fiorentino, o pallone al bracciale, a pallacorda, a palla al vento, a palla-maglio, o tamburello". (...)

"A paume (jeu de paume) consiste em bater a bola com a mão e substituiu os ludus pilae cum palma romano; conhecido já no século XII foi jogado melhor no período sucessivo, até dar vida ao atual tênis." (GRIFI, 1989:188)

Aluísio Azevedo, ao traçar o perfil da mulher maranhense, e sua condição de mulher em uma sociedade escravocrata, cujo papel reservado era apenas o de mãe, compara a mulher da burguesia maranhense à lisboeta desocupada, denunciando o ócio em que viviam. Como igualmente denunciava "o ócio dos padres que viviam do trabalho de pessoas honestas e crédulas" (MÉRIEN, 1988:158), sendo estes, os padres, também "culpados pelo atraso da instrução pública" (p. 159).

Aluísio considerava que todo "o mal vinha do ócio e da preguiça das mulheres" (p. 164) e apenas uma mudança na educação e na concepção do casamento poderia permitir a realização da mulher:

"Do procedimento da mulher ... depende o equilíbrio social, depende o equilíbrio político, depende todo o estado patológico e todo o desenvolvimento intelectual da humanidade ...

"Para extinguir essa geração danada, para purgar a humanidade desse sífilis terrível, só há um remédio: é dar à mulher uma educação sólida e moderna, é dar à mulher essa bela educação positivista, que se baseia nas ciências naturais e tem por alvo a felicidade comum dos povos. É preciso educá-la física e moralmente, prepará-la por meios práticos e científicos para ser boa mãe e uma boa cidadã; torná-la consciente de seus deveres domésticos e sociológicos; predispor-lhe o organismo para a procriação, evitar a diásteses nervosa como fonte de mil desgraças, dar-lhe uma boa ginástica e uma alimentação conveniente à metiolidade de seus músculos, instruí-la e obrigá-la principalmente a trabalhar... " (Aluísio AZEVEDO, Crônica, O Pensador, São Luís, 10.12.1880, citado por MÉRIEN, 1988:166, 167)

O mesmo tema é retomado quando da publicação de "O Mulato", criando-se enorme polêmica na imprensa, ora acusando o autor, ora vozes se levantando para defendê-lo acerca de sua posição sobre a condição feminina. Aluísio tinha consciência que parte dos leitores em potencial era constituída pelas mulheres da pequena burguesia portuguesa e maranhense da cidade e pelas filhas dos fazendeiros que encontravam na leitura uma diversão contra o tédio que pesava sobra a vida cotidiana e ociosa que tinham. No entender de MÉRIEN (1988), os discursos de Raimundo sobre a condição feminina, o papel da esposa e da mãe na educação das crianças, são dirigidos mais a elas do que a Manuel Pescada:

"O senhor tem uma filha, não é verdade ? Pois bem ! Logo que essa filha nasceu o senhor devia ter em vista prepará-la para vir a ser útil... dar-lhe exercícios, alimentação regular, excelente música, estudos práticos e principalmente bons exemplos; depois evitar que ela fosse, como é de costume aqui, perder nos bailes o seu belo sono de criança..." (ALUIZIO AZEVEDO, O MULATO, 1881:268-269, citado em MÉRIEN, 1988:288-289)

Considerando o caso concreto dos bailes, HASSE (1985) afirma que a dança desempenha uma função particular, pois, ela é a forma de entretenimento adequada a tornar mais elegantes e agradáveis os gestos, soltando vigores em excessos. Entre as diferentes qualidades do entretenimento umas, como aquelas que promovem os exercícios do corpo contribuem para a conservação da saúde outras, tendo por principal objeto a utilidade, prestam-se a tornar os jovens mais agradáveis como é o caso da dança e da música:

"... A dança seria a arte de mover o corpo, os braços e os pés com elegância, ao som da música. Representava uma prenda necessária a quem tem de viver no mundo e um exercício verdadeiramente proveitoso. O seu ensino devia ser indicado desde cedo para poder fornecer desembaraço ao corpo e chegar a dançar com graça e a tempo." (p. 19)

Os bailes e o teatro representavam formas clássicas de entretenimento distinto. Integravam-se, por isso, com enorme facilidade nos costumes da austera burguesia pela familiaridade existentes com estas formas de entretenimento. Em 1844, o "Collégio N. S. da Glória", também conhecido como "Collegio das Abranches", em seus primitivos estatutos, dispunha:

"...não somente sobre as disciplinas escolares com também sobre o preparo physico, artístico e moral das alumnas. Às quintas-feiras, as meninas internas participavam de refeições, como se fossem banquetes de cerimônia, para que se habituassem 'a estar bem á mesa e saber como se deveriam servir as pessoas de distinção'. Uma vez por semana, à noite, havia aula de dança sob a rigorosa etiqueta da época, depois de uma hora de arte, na qual ouviam bôa música e aprendiam a declamar." (ABRANCHES, 1941: 113-114)

Para HASSE (1985), a dança recebia o acordo dos mais renitentes:

" ... que finalizam por considerá-la indispensável a uma pessoa de certo estatuto social. Por outro lado, os bailes que se organizavam e onde a dança surgia como principal motivo de interesse, constituíam excelentes meios de demonstrações quase inesgotáveis de poder uma vez que implicavam imperativos de vulto para uma encenação de grandeza insuperável favorecedora de certa rivalidade". (p. 19)

Para essa autora, tal circunstância não impedia, porém, que não se desejasse criar em torno elas uma atribuição clara de utilidade que justificasse plenamente o tempo perdido de forma ligeira, preocupação, aliás, constante em múltiplos aspectos da vida do século XIX. A moralidade vigente, "rigorosa e hipócrita", impedia que fosse de outro modo, sossegando-se consciências inquietas relativamente às atividades, cada vez mais generalizadas, que escapavam nitidamente ao foro do trabalho. Na verdade, o baile e a freqüência dos salões bem como o teatro, seriam sempre obrigações socias desgastantes a que a civilidade e a vida no mundo obrigavam, um costume de fato integrado nos níveis sociais mais prestigiados.

Dois amigos de Aluísio Azevedo, Paulo Freire e Luís de Medeiros, fazem publicar cartas sob pseudônimo - Antonieta (carta a Julia, "Diário do Maranhão", São Luís, 6.6.1881) e Júlia (carta a Antonieta, "Pacotilha", São Luís, 9.6.1881), respectivamente - falando "de suas impressões e do impacto que o livro "O Mulato", lhes causara" sobre a condição de vida de Ana Rosa, que lembrava a vida que as mocinhas maranhenses levavam (MÉRIEN, 1988, p. 291). Julia/Luís de Medeiros faz longas considerações sobre a condição da mulher maranhense, "lastimando-se da educação retrógrada que recebera em sua família e no colégio" (p. 290), onde fora do português, não se ensinava mais nada às moças além de algumas noções de francês, de canto, de piano e de bordado. Para ela, "a falta de exercícios físicos é a origem das perturbações do sistema nervoso que atingem a maioria das moças maranhenses" (p. 290).


Conclusão
No período compreendido entre a "adesão" do Maranhão ao Império brasileiro - 1823 - e a proclamação da República - 1889 -, São Luís viveu um período áureo de produção cultural, que se estendeu até meados do século, fruto do desenvolvimento econômico, seguido de um período de decadência, provocada pela perda gradual do trabalho escravo, consolidado com a abolição da escravatura.

Denominada de "Atenas brasileira", as recreações aqui praticadas se identificam com aquelas que se aproximam da noção de lazer expressa na origem grega, da "scholé", em que a aristocracia ocupava seu tempo com atividades de contemplação teórica, especulação filosófica e ócio (JIMENEZ GUZMAN, 1986), típica das sociedades escravocratas. No segundo período, iniciado por volta da década de 1860, aproxima-se, a ocupação do tempo, com atividades que podem ser identificadas como características do "otium" romano, transformando-se num fenômeno elitista, ostentatório, já desprovido de sentido filosófico - conforme denuncia Aluízio Azevedo em sua obra, e observado na descrição da sociedade ludovicence, notadamente em LISBOA (s.d.; 1991) e DUNSHEE DE ABRANCHES (1941; 1993).

Os ludovicences, como hoje, dedicavam-se aos passeios e aos piqueniques pelos arrabaldes da Ilha. E, como hoje, mantinham uma produção cultural intensa, dedicando-se ao teatro, à poesia, ao romance, à crítica dos costumes e, sobretudo, bisbilhotando a vida alheia, conforme está registrado nos inúmeros jornais - políticos e literários -, folhetos, revistas, "bandos", coletâneas de poesias e peças teatrais publicadas (CORRÊA, 1993; MÉRIAN, 1988), justificando o título de "Atenas brasileira".

Em Maranhão, desde a década de (18)20 a mulher participa de atividades físicas, pois como descreve DUNSHEE DE ABRACHES em suas memórias sobre seu tio Frederico Magno, o Fidalgote e sua amada, Maricota Portinho, costumavam, além de dar longos passeios pelos arrebaldes da ilha, em companhia de outros jovens, jogar a péla - forma primitiva de tênis - durante a estadia de suas famílias no sítio do Censor, como era conhecido Garcia de Abranches. Isso, em 1827.

Cabe lembrar que Antonio Francisco Gomes, em 1852, propunha além da ginástica, os exercícios de natação, esgrima, dança, jogo de malha e jogo da pella para ambos os sexos (CUNHA JÚNIOR, 1998:152)

Quanto ao ensino da educação física, desde 1842, quando foi fundado o primeiro colégio destinado exclusivamente às moças, em São Luís, a atividade física fazia parte do currículo. . Quem teria sido a professora ? as tias de Dunshee de Abranches, D. Martinha ? - como era conhecida D. Marta Alonso Veado Alvarez de Castro Abranches, educadora espanhola nascida nas Astúrias provavelmente por volta de 1800 (JANOTTI, 1996) - ou sua filha, D. Amância Leonor de Castro Abranches ? ou teria sido D. Emília Pinto Magalhães Branco, mãe dos escritores Aluízio, Artur e Américo de Azevedo, também professora no colégio das Abranches. Então seria uma delas - ou as três - a(s) primeira(s) professora(s) de educação física no Maranhão ?


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Año 4. Nº 14. Buenos Aires, Junio 1999