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Síndrome do impacto em nadadores. Fisiopatologia e proposta preventiva

Síndrome de impacto en nadadores. Fisiopatología y propuesta de prevención

Impingement in swimmers. Pathophysiology and preventive proposal

 

*Fisioterapeuta graduanda pela Universidade Católica de Brasília, UCB

**Mestre em Ciências da Saúde

Docente da Universidade Católica de Brasília, UCB
(Brasil)

Ilana Nascimento de Almeida*

Thalita da Cruz Portela*

Prof. MSc.Allan Keyser de Souza Raimundo**

allanksr@gmail.com

 

 

 

 

Resumo

          O presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão bibliográfica sobre nadadores acometidos com a Síndrome do Impacto (SI), descrevendo sua fisiopatologia e sugerindo uma proposta preventiva. O método utilizado para a realização deste trabalho foi a revisão de artigos disponíveis na base de dados BVS (Biblioteca Virtual em Saúde). Por ser a articulação mais exigida nas modalidades de natação, o ombro está sujeito a desenvolver lesões tanto agudas quanto crônicas. A mais recorrente é aquela caracterizada pelo impacto subacromial. Em nadadores de elite, a SI é causada por degeneração tendões do manguito rotador. A aplicação do gesto esportivo de forma inadequada juntamente com a quantidade e intensidade excessiva dos treinamentos (overtrainning) geram sobrecarga e desequilíbrio das estruturas anatômicas, provocando fadiga na musculatura desse complexo (overuse). O tratamento preventivo procura impedir o aparecimento de tais lesões no atleta com treinos de força, flexibilidade e propriocepção visando um melhor rendimento.

          Unitermos: nadador. Ombro. Dor. Prevenção. Impacto.

 

Abstract

          This study aims to review literature on affected swimmers with impingement syndrome (IS), describing its pathophysiology and suggest a proposal for prevention. The method used for this research was to review the articles available in the database BVS. Because the articulation required in terms of swimming, the shoulder is subjected to either develop lesions acute and chronic. The most recurrent is characterized by impingement. In elite swimmers, the IS is caused by degeneration of the rotator cuff tendons. The application of sports gesture inappropriately with the excessive amount and intensity of training (overtrainning) generate overload and imbalance of anatomical structures, causing muscle fatigue in this complex (overuse). Preventive treatment seeks to prevent the emergence of such injuries in the athlete with strength training, flexibility and proprioception seeking a better income.

          Keywords: Swimmer. Shoulder. Pain. Prevention. Impingement.

 

 
http://www.efdeportes.com/ EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, Año 15, Nº 149, Octubre de 2010. http://www.efdeportes.com/

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Introdução

    A funcionalidade de uma articulação saudável exige um equilíbrio perfeito entre mobilidade e estabilidade. Uma boa mobilidade é conseguida através de estruturas capsuloligamentares, superfícies articulares e unidades músculo-tendineas intactas. A estabilidade depende da integração ótima destas partes[1,2].

    No ombro, a função normal das articulações escapulotorácica e glenoumeral é indispensável para a mobilidade e estabilidade do membro superior. Durante a movimentação do braço, a escápula atua como base para o úmero, permitindo à articulação grandes amplitudes. Alterações na disposição entre a escápula e os demais componentes ligados a ela, como a clavícula, o úmero e o gradil costal, são capazes de produzir desarranjos significativos no complexo do ombro [1,2,3].

    Segundo Dutton[1], os músculos do ombro podem ser classificados de acordo com as funções que exercem . Há os pivôs escapulares, os propulsores e os posicionadores umerais e os protetores do ombro. Dentro dessa perspectiva, o deltóide é considerado como um posicionador umeral, uma vez que possui a ação de estabilizar o úmero. O supra-espinhal, o infra-espinhal, o subescapular e o redondo menor, músculos que compõem o manguito rotador (MR), bem com o bíceps braquial representam os protetores do ombro. Este contém a cabeça umeral fixada à fossa glenoide nas ações de rotação externa e interna, impedindo um deslocamento antero-posterior, ao passo que aqueles regulam a disposição do úmero em diversas atividades, funcionando como ligamentos contráteis.

    As forças associadas desses músculos são essenciais para o ritmo escapuloumeral normal, especialmente quando é solicitada a elevação do braço. Durante esse movimento, o MR e o bíceps braquial atuam deprimindo o úmero, balanceando o vetor de força do deltóide, que é para cima. Esse deve ser o comportamento ideal destes músculos para que a flexo-abdução ocorra de forma coordenada e sincrônica[1,2,3,4].

    O ombro, por ser extremamente recrutado em diversas atividades funcionais, por vezes, renuncia de sua estabilidade em beneficio da mobilidade articular. Assim, é esperado que dores neste complexo sejam queixas freqüentes na maioria da população, tendo em vista que a instabilidade deixa a dinâmica da articulação mais passível de receber sobrecargas e sofrer traumatismos. Dentro do sistema musculoesquelético, o ombro apresenta-se como um grande foco de dores, sendo o segundo local mais referido, precedido somente pelas regiões cervical e lombar da coluna vertebral[5,6].

Metodologia

    Foram investigados artigos de periódicos nacionais disponíveis sobre o tema na base de dados BVS (Biblioteca Virtual em Saúde). Os artigos internacionais foram obtidos a partir das referências bibliográficas dos artigos em português. A busca limitou-se a pesquisas realizadas nos últimos 15 anos. Livros fundamentados em anatomia, fisiologia, cinesiologia e ortopedia também foram utilizados para a descrição deste trabalho. As palavras-chaves utilizadas em língua portuguesa foram: ombro, impacto, colisão, nadador, natação, dor, lesão, manguito rotador e prevenção.

Resultados e discussão

Fisiopatologia da síndrome do impacto

    Diversas patologias cursam com um quadro clínico doloroso no ombro, que pode ser originado tanto de lesões agudas quanto de lesões crônicas, produzindo disfunções expressivas. No rol das afecções mais comuns estão as artrites, bursites, tendinopatias, síndrome da dor miofascial, síndrome do impacto, capsulite adesiva, entorses, subluxações, dentre outras. Diante de tantas intercorrências que reportam a dor como principal sintoma, exige-se cada vez mais uma investigação minuciosa dos fatores causais dessas disfunções e dos aspectos intrínsecos e extrínsecos relacionados a elas, para que possa ser feito um diagnóstico diferencial preciso[1,7].

    O índice de aparecimento da síndrome do impacto (SI) é bastante comum, tanto em indivíduos mais idosos, como em jovens, apresentando-se como uma das causas mais freqüentes de disfunção no ombro[1,5]. De acordo com Volpon e Muniz[8], a SI é uma agressão aos tendões do MR, especialmente sobre o supra-espinhal, gerada por inflamações persistentes que podem evoluir com degeneração e possíveis rupturas. A etiologia deste distúrbio pode ser complexa, uma vez não há um fator isolado para o surgimento da SI[5].

    Alguns elementos associados podem contribuir para o processo de evolução da síndrome, os quais incluem: morfologia do acrômio, quantidade de vascularização para o MR, funcionamento dos estabilizadores dinâmicos do ombro, posicionamento do braço em várias atividades, resistência dos pivôs escapulares (trapézio, serrátil anterior, levantador da escápula e rombóides), e assimetria escapular[1,4].

    O impacto pode ser classificado como primário ou intrínseco ou estrutural e secundário ou extrínseco ou funcional. No primeiro, há uma diminuição do espaço subacromial e conseqüente compressão das estruturas que atravessam esta região. Esta condição é geralmente encontrada em pessoas que possuem alterações morfológicas do acrômio, que se apresenta em formato ganchoso, favorecendo o impacto durante a elevação do braço. No segundo, a anatomia do acrômio encontra-se normal, porém, níveis de esforços excessivos, que necessitam de amplitudes além de 90º de flexo-abdução, tendem a gerar sobrecarga nos tendões que passam pela área subacromial. A partir disso, o controle muscular enfraquecido produz uma instabilidade ativa na articulação glenoumeral, principalmente quando o braço é elevado acima da cabeça. A repetitividade deste movimento de elevação pode irritar, inflamar e romper os tendões do MR[1,4,5].

Síndrome do impacto na natação

    A SI é freqüentemente vista em pessoas que possuem atividades ocupacionais onde o braço é forçado a ficar constantemente na posição erguida, e também em atletas em que o gesto esportivo exija amplitudes de movimentos contínuas do ombro acima de 90º[5,7].

    Em 2002, Kralinger et al.[10] sugeriram que desportos diferentes impõem cargas de trabalho diferentes ao ombro, classificando-os de acordo com o envolvimento desta articulação em menor ou maior grau durante o gesto esportivo, da seguinte maneira: os esportes do tipo I são aqueles em que o ombro é pouco solicitado e não sofre tensões excessivas, como o ciclismo e a corrida; os esportes que ocasionam pressão moderada ao ombro são os do tipo II, incluindo o esqui, e a natação; os do tipo III são aqueles que oferecem grande sobrecarga ao ombro, ininterruptamente, como é visto no vôlei, no handball e no basquete.

    Entretanto, Ejnisman et al.[11] confrontam a idéia de que o nado proporciona um impacto moderado ao ombro. Devido aos movimentos baliísticos efetuados, esses autores afirmam que a natação é, conceitualmente, uma modalidade de arremesso[3], apresentando, apenas, uma variação biomecânica específica, porém, predispondo o ombro às mesmas lesões típicas daquelas do tipo III de Kralinger.

    A natação é o segundo esporte mais praticado no Brasil. Sua vantagem em relação a outras atividades é que o meio aquático tem ampla funcionalidade, propiciando desde espaços recreativos e educativos, até ambientes de campeonatos amadores ou profissionais. Dentro destes dois últimos grupos, uma diferença significativa de desempenho pode ser notada, uma vez que, indivíduos amadores nadam por prazer, sem exigência de performance técnica, enquanto que atletas profissionais são treinados para obterem o máximo de rendimento físico possível durante a prática esportiva[6,12].

    Em 1999, foi quantificado que, em média, competidores de elite perfazem cerca de 300.000 braçadas e percorrem aproximadamente 15.000 metros diários durante a fase pré-temporada[7]. Dentro deste contexto, cabem os achados de Souza et al.[12] , que, num estudo comparativo, observaram dores articulares em pelo menos um dos ombros em grande parte dos atletas de alto nível avaliados, o que não foi encontrado com a tanta freqüência nos indivíduos que nadavam de 2 a 3 vezes por semana.

    A expressão “ombro de nadador” foi descrita pela primeira vez em 1974 para designar um quadro doloroso causado por sucessivos estresses na região da cintura escapular durante o nado. Atualmente, a maioria dos estudos ainda demonstra que, em média, 65% dos nadadores queixam-se de dor nesta área[2,7,11,12,13,15,19].

    Apesar de a natação apresentar baixo risco traumático, seu próprio gesto esportivo pode contribuir para o aparecimento de lesões, principalmente se este não for orientado corretamente. Condições como trabalhar com o membro superior constantemente elevado, agregando padrões repetidos de rotações interna e externa, somados ainda à resistência imposta pela água, predispõem o ombro a sofrer microtraumas por sobrecarga[2,6].

    Em 2004, Busso[2] descreveu em seu estudo que o MR é uma estrutura que possui um papel crucial durante todo o ciclo das categorias crawl, borboleta e costas, da seguinte maneira: o supra-espinhal realiza tração, roda externamente e abduz o ombro na recuperação nos estilos crawl e costas; o infra-espinhal estabiliza a articulação no início da recuperação nos modos crawl e borboleta; o subescapular realiza tração, rotação interna nos estágios de propulsão, e adução do braço submerso nos nados crawl e borboleta; e o redondo menor age como estabilizador em todas as etapas .

    Para Cohen et. al.[14], o nado borboleta é o que mais representa riscos ao complexo do ombro, uma vez que o úmero roda internamente de 70 a 120º ao mesmo tempo em que se sustenta em abdução.

    Cohen e Abdalla[15], porém, relataram mais recentemente que durante a fase de tração do crawl, o braço também adota uma posição de desvantagem ao sair de uma adução com rotação interna para, em seguida, entrar em uma abdução.

    Maglischo[16] confirma esta tese quando sugere que o ombro faz uma rotação interna excessiva sempre que o nadador estende o braço contra a força da água para emergi-lo.

    Yanai et. al.[17], por sua vez, observando as orientações do membro superior durante o nado crawl, atestaram que o maior pico de sobrecarga recai sobre o ombro no momento em que há elevação máxima do braço (para que o mesmo entre na água) e quando o ângulo de rotação interna ultrapassa seu limite normal de amplitude ativa, o que ocorre na fase de recuperação.

    Dessa maneira, conclui-se, então, que séries de rotações internas máximas, tanto na fase de tração do crawl, como na fase de recuperação dos nados crawl e borboleta, prejudicam o ombro, podendo causar dor e desgaste articular[2,7,15,17].

    Na natação, diferente do que acontece em outros esportes, grande parte das injúrias é procedente dos treinos e não das disputas em si. Nessas circunstâncias, os mecanismos supracitados passam a ser ainda mais prejudiciais na medida em que são executados incessantemente durante os treinamentos, sem tempo para descanso e reparo das estruturas envolvidas, deixando-as mais vulneráveis a lesões[6].

    Estudos destacam que a combinação entre overtrainning e overuse é muito observada em nadadores durante o estágio de pré-competição, o que favorece o desencadeamento de traumas, visto que intensos treinamentos com cargas excessivas de trabalho, em busca de melhores resultados, podem levar o esportista à exaustão prematura e, conseqüentemente, provocar compensações indesejáveis[2,6].

    Sabendo-se que 90% da força de propulsão dos nadadores estão nos braços, a fadiga torna-se um elemento agravante, pois, os músculos ativos, além de serem exigidos dinamicamente em potência e resistência, também precisam cumprir um papel estático para preservar a estabilidade articular[2,6,18].

    A partir disso, um ciclo vicioso é provocado, quando o nadador, na tentativa de se manter com o mesmo condicionamento físico, passa a fazer uso de gestos compensatórios. Porém, o resultado é adverso, uma vez que condutas inapropriadas despertam desequilíbrios musculares, incoordenação de movimentos, disfunção escapulotorácica e mau alinhamento dos membros, podendo o atleta experimentar um declínio significativo em seu desempenho[6,18].

    Músculos e tendões em pressões constantes estão propensos a desenvolver microtraumas cumulativos. Em atletas competitivos de natação, essas agressões ocorrem, em particular, sobre o supra-espinhal e a cabeça longa do bíceps braquial, tendo, na maioria das vezes, como causa primária a instabilidade glenoumeral passiva (decorrente de lassidão ligamentar) ou transitória (decorrente da fadiga dos músculos estabilizadores)[6,11,12,13].

    A irritação e a inflamação músculo-tendínea, quando recorrentes, e mal tratadas, podem vir a se transformar em lesões crônicas degenerativas. A cronicidade desorganiza a sincronia dos grupos musculares, enfraquece a relação agonista-antagonista, e, assim, reduz a força do membro afetado. Todo esse processo patológico torna iminente a chance de lacerações, rupturas e conseqüente desenvolvimento da SI, modificando a mobilidade da cintura escapular e aumentando a incidência de dor no ombro, o que, nitidamente, limita o rendimento do atleta[4,6,13,18].

Intervenção fisioterápica. Proposta preventiva

    Medidas preventivas podem ser adotas para impedir que o atleta progrida com a SI. Entre elas, estão os treinamentos de força, flexibilidade, e propriocepção, além de orientações acerca do tempo de repouso necessário para a recuperação das estruturas passíveis de sofrerem lesão por overuse[4,6].

    Ganhos de força extra, fora da piscina, permitem ao nadador trabalhar outros músculos além daqueles exigidos no esporte, especialmente os antagonistas aos movimentos da braçada[2,6].

    Agregado a isso, treinos de flexibilidade também devem ser aplicados a fim de proteger a musculatura contra encurtamentos e para preservar a amplitude total de movimento sem dor [2,6].

    Exercícios de propriocepção oferecem consciência de posicionamento articular e permitem melhor controle dos movimentos, evitando falhas de execução, uma vez que o atleta tem tempo para corrigi-las[2,6].

    Por fim, para um programa de prevenção completo, fatores como duração, intensidade e freqüência dos treinos devem ser ponderados para conter a “síndrome do supertreinamento”[6].

Fortalecimento

    Desequilíbrios musculares ocorrem sempre que a ação agonista prevalece de maneira desproporcional sobre a ação antagonista durante determinada atividade, fazendo com que este se torne fraco e aquele abusivamente mais forte[13,18].

    No ombro normal, a relação de força entre rotadores externos e internos (RE/RI) é de aproximadamente 0,6 a 0,8, o que demonstra uma desvantagem natural dos rotadores externos. Em nadadores, este valor tende a ser ainda mais baixo, devido a dominância da rotação interna durante a prática esportiva. Somado a isso, também já foi constatado que a SI reduz de maneira significativa a força de rotação externa do membro superior[9,13].

    Schneider e col.[13] avaliaram, em 2006, 26 nadadores púberes de ambos os sexos, dos quais 23% apresentaram o índice RE/RI menor que 0,6, sugerindo fraqueza muscular. Este resultado corrobora os achados de um estudo citado por Schwartzmann[6] e col., onde experimento semelhante foi feito, porém, relacionando a falta de sincronia dos músculos do MR com a prevalência de dor no ombro. Neste trabalho, nadadores com quadro doloroso exibiram a razão RE/RI com valores menores que 0,4, contra 0,7 daqueles que não tinham histórico de dor.

    Considerando esses aspectos, a proposta preventiva de fortalecimento muscular visa o reequilíbrio de forças, dando ênfase aos rotadores externos, como o infra-espinhal, o redondo menor, e, sobretudo, o supra-espinhal, que é o mais propenso a desenvolver lesões, pois além de limitar a rotação interna, ao mesmo tempo contribui com a abdução.[3,6].

    A abordagem do fortalecimento pode incluir faixas elásticas ou musculação, desde que o treinamento muscular evidencie ações concêntricas, uma vez que na natação ações excêntricas dificilmente são solicitadas[2].

    A manutenção de um ritmo escapuloumeral regular, com um trabalho focado nos pivôs (estabilizadores) escapulares, principalmente nos rombóides, trapézio inferior e serrátil anterior, também deve ser alvo do programa de prevenção, visto que suas funções são vitais para a biomecânica normal do ombro[1,2,4,6].

    É importante ressaltar que deve-se alternar exercícios específicos para ganho de força com exercícios de endurance, pois, durante a natação, as forças aplicadas são constantes porém não são máximas, e o atleta, além de manter picos de torque para propulsão, precisa estar resistente à fadiga. Estudos comprovam que essa associação, sob o ponto de vista preventivo, reduziu significativamente a presença de dor no ombro nos nadadores[6].

Flexibilidade

    Sobre a flexibilidade, apesar de todos os benefícios teóricos conhecidos, na prática, poucos estudos comprovam sua eficácia como um método preventivo de lesão. Entre eles, está um trabalho de 1985, citado por Schwartzmann, onde o estudo original correlacionou a diminuição de flexibilidade com dores no ombro em nadadores[6,19].

    Sabe-se que músculos alongados possuem maior poder de contração do que os encurtados, e que quanto mais flexível um segmento, maiores amplitudes de movimento são obtidas sem causar dano às estruturas envolvidas[2,19,21].

    Contudo, alongamentos agudos, ou seja, aqueles realizados imediatamente antes do treino esportivo, não garantem ganhos suficientes para evitar lesões. Pelo contrário, alguns trabalhos demonstram que esta prática diminui de forma considerável a força muscular. Por outro lado, verificou-se que, exercícios de flexibilidade, quando realizados em sessões à parte, de forma regular, possuem efeitos crônicos que são eficazes para melhorar a performance do atleta a longo prazo, incluindo velocidade e força de contração[21].

    Em 1999, Hartig e Henderson[22], realizaram um estudo comparativo com 298 indivíduos. Destes, 150 receberam um programa de alongamento durante 13 semanas. Constatou-se que a taxa de incidência de lesões por overuse nos que sofreram intervenção foi de 16,7%, contra 29,1% dos 148 que fizeram parte do grupo controle. Estes resultados mostram-se interessantes, visto que o overuse é o tipo de acometimento mais comum em nadadores de alto nível.

    Em 2004, Witvrouw et.al.[23]. relataram que, nos esportes em que há ciclos de alongamento-encurtamento contínuos, técnicas que favoreçam a elasticidade músculo-tendínea podem ser bem empregadas para prevenir danos dessas estruturas. A natação se enquadra nessa condição, uma vez que possui alternância de tensão-relaxamento durante as fases da braçada.

    Conclui-se, então, que um programa de alongamento, para ter efeito preventivo, deve fazer parte da rotina diária do atleta, e, mesmo quando a amplitude de movimento máxima for alcançada, o treino deve ser mantido para que não haja perda de extensibilidade tecidual[6,19].

Propriocepção

    Propriocepção é a sensação transmitida por músculos, tendões e articulações da posição que o segmento está ocupando no espaço, bem como da direção, amplitude e velocidade do movimento que está sendo efetuado. Um bom nadador precisa adquirir esse sentido para saber controlar as forças da água que agem sobre ele[2,24].

    Estudos comprovam que o déficit cinestésico é capaz de acarretar uma instabilidade articular significativa, a ponto de evoluir com microtraumas repetitivos. No ombro, sempre que isso acontece, o supra-espinhal e o bíceps braquial são os principais músculos compensatórios e apresentam-se com padrões de atividade fora do comum[24].

    Por esse motivo, exercícios propioceptivos são fundamentais para restaurar a estabilidade articular, através de mecanismos neuromusculares, e para promover melhora da dinâmica do segmento, impedindo o aparecimento de disfunções[5].

    Treinar propriocepção permite que o atleta tenha consciência postural e que o mesmo esteja apto a selecionar os grupos musculares que irão trabalhar em cada fase do nado. A partir disso, aprende-se a corrigir ações inadequadas para uma determinada técnica e a desativar músculos inapropriados para a atividade pretendida, visto que a intervenção desnecessária destes aumenta o estresse e a fadiga local[2,6,25].

    Exercícios fora d’água podem ser eficazes para treinar coordenação, sincronia muscular e para ensinar ao nadador como construir uma memória cinestésica dos movimentos da cintura escapular[2].

    Exercícios dentro d’água podem ser úteis para demonstrar ao atleta que pequenas diferenças de posicionamento da mão e/ou do braço durante o nado, podem interferir diretamente na força que será exercida, uma vez que as posturas desses segmentos em relação ao corpo podem acarretar uma maior ou menor resistência oferecida pela água[2].

Supertreinamento

    O “supertreinamento” ocorre sempre que os mecanismos de adaptação do atleta são forçados além do que o mesmo pode suportar, predispondo-o a falhas. Essa condição é descrita como multifatorial, sendo o estresse físico e o psicológico os principais agentes desencadeadores. O alto nível tensional instalado, quando acumulado, pode gerar uma queda brusca de produtividade[16].

    Sob esse ponto de vista, a contenção do overtrainning e seus efeitos nocivos também tornam-se uma meta preventiva, a medida em que treinos exorbitantes associados a um tempo de descanso reduzido podem afetar não somente o desempenho do individuo nas competições, mas também a sua qualidade de vida[6,20].

    Para um nadador ficar supertreinado basta que a o volume de treino exceda sua capacidade de se adequar ao que foi programado. Por isso, o profissional responsável por acompanhar a evolução do atleta precisa estar atento a situações como disposição, tolerância aos exercícios e habilidades técnicas do mesmo[16,20].

    O programa de treinamento diário deve ser monitorado dentro dos objetivos traçados, porém, respeitando sempre os limites fisiológicos do nadador, e, aliado a isto, propõe-se a inserção de intervalos para repouso e atividades recreativas em cada sessão. Exercícios de concentração e relaxamento também são indicados a fim de fornecer momentos para reorganização mental e recuperação de energia[16,20,25].

    Outros aspectos relacionados à saúde, como os estados nutricional e social também precisam ser considerados dentro de um programa preventivo, uma vez que estresses provenientes dessas relações podem comprometer o desempenho[20].

    Todas essas recomendações refletem a complexidade das diversas circunstâncias que podem levar o atleta a progredir com um baixo rendimento e, a partir disso, vir a necessitar de mais e mais treinos. A conseqüência disso é o “supertreinamento”, que, como já mencionado, é um fator predisponente a lesões por overuse, que futuramente resultam em distúrbios crônicos e degenerativos[6,20].

Conclusão

    A síndrome do impacto é uma disfunção bastante presente em nadadores de alto nível. A maioria dos estudos concorda que o excesso de treino e de uso de determinadas estruturas do ombro desperta desequilíbrios capazes de gerar um grave distúrbio doloroso na cintura escapular, que, se não detectado precocemente, possui grande risco de cursar como uma lesão crônica incapacitante.

    Medidas como priorizar qualidade e não quantidade dos treinos, conhecer a biomecânica dos movimentos mais exigidos no esporte e saber analisar gestos inadequados que podem desencadear situações lesivas favorecem uma prática esportiva livre de quaisquer intercorrências por descuido ou falta de orientação.

    Além disso, é importante destacar que a disciplina e a segurança do atleta devem ser trabalhadas com extrema atenção, pois são condições que, quando bem assistidas, trazem efeitos satisfatórios. Quanto mais confiante está o atleta, melhor é a sua performance, e menor é a chance de adquirir lesões.

    Métodos preventivos, além de contribuírem para um melhor condicionamento físico, reduzem o risco de desenvolvimento de lesões no ombro do nadador. Prevenir é mais fácil, mais acessível e menos oneroso do que arcar com qualquer tipo de tratamento. A prevenção também se mostra mais vantajosa por poder ser aplicada dentro do programa de treinamento, não exigindo o afastamento do atleta dos treinos durante semanas ou meses, como ocorre após uma lesão.

    As condutas mencionadas no presente estudo visam estabelecer propostas para evitar disfunções articulares, musculares e tendíneas, e de dores no ombro, através da SI, muito freqüente em nadadores. Diante das causas que promovem essa síndrome, sugere-se que exercícios de força, resistência, alongamento, e propriocepção sejam aplicados separadamente, dentro de um contexto fisioterápico especial.

    A literatura nacional ainda permanece carente de bases científicas que foquem especificamente na prevenção de injúrias. Sabendo-se da importância de métodos preventivos, sobretudo no âmbito esportivo, faz-se necessária a concepção de novas pesquisas que comprovem a eficácia de um programa de prevenção na redução do índice de lesões inflamatórias ou degenerativas, para que o mesmo possa ser executado com evidências teóricas bem fundamentadas.

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EFDeportes.com, Revista Digital · Año 15 · N° 149 | Buenos Aires, Octubre de 2010
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