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Equilíbrio postural em indivíduos cardiopatas

Equilibrio corporal en pacientes cardíacos

 

*Fisioterapeuta, Mestranda em Ciências do Movimento Humano da

Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)

**Fisioterapeuta, Pós-Graduanda em Acupuntura pelo

Centro Integrado de Estudos e Pesquisas do Homem (CIEPH)

***Fisioterapeuta, Pós-Graduanda em Fisioterapia Ortopédica e Traumatológica pela

Associação Catarinense de Ensino (ACE)

****Fisioterapeuta, Mestre em Neurociências pela

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Professor e Supervisor de Fisioterapia Aplicada à Neurologia da

Faculdade Estácio de Sá de Santa Catarina (FESSC)

Mavie Amaral Natalio*

Luciana Velasques Huber Machado**

Rafaela Barreto da Conceição Oliveira***

Pablo Tortato Waltrick****

mavie_fisio@yahoo.com.br

(Brasil)

 

 

 

Resumo

          O equilíbrio postural é a capacidade de assumir e manter uma posição estável, sendo o resultado dos impulsos neurológicos provenientes dos sistemas proprioceptivo, vestibular e óculo-motor e cujas informações são processadas pelo sistema nervoso central. Todo este processo está prejudicado com o envelhecimento devido as alterações funcionais que influenciam na manutenção do equilíbrio postural e em indivíduos cardiopatas este pode ser afetado entre outros fatores pela própria medicação. O objetivo deste estudo é avaliar o equilíbrio postural em indivíduos cardiopatas que realizam reabilitação cardiovascular, através da Escala de Equilíbrio de Berg, e verificar a relação do equilíbrio com a prática de atividade física correlacionando os dados obtidos com um grupo controle. A amostra em pesquisa foi constituída por 10 indivíduos cardiopatas com idade acima dos 50 anos, participantes do Programa de Prevenção e Reabilitação de Doenças Cardio-Pulmonares e Metabólicas da UDESC. Este estudo verificou que os cardiopatas apresentam déficits mínimos de equilíbrio quando comparados a indivíduos sedentários, mas estudos atuais indicam que essas alterações podem ser minimizadas e/ou corrigidas com a instituição de treinamentos de força e de equilíbrio associada à reabilitação cardiovascular.

          Unitermos: Equilíbrio postural.Cardiopatas. Envelhecimento. Reabilitação

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 15 - Nº 143 - Abril de 2010

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Introdução

    O equilíbrio postural é definido como a capacidade de assumir e manter uma posição estável, intimamente relacionado com estabilidade, sendo o resultado de um complexo sistema reflexo, alimentado por um fluxo de impulsos neurológicos provenientes dos sistemas proprioceptivos, vestibulares e óculo-motor cujas informações são processadas pelo sistema nervoso central (SNC) retornando pelas vias eferentes para manter o controle do equilíbrio corporal pela contração dos músculos antigravitários (BARROS, 2000). Somado a isso, o mecanismo de equilíbrio está baseado em uma cooperação intrínseca entre o sistema vestibular, informações proprioceptivas, táteis e visão. Weerdt, Spaepen (2001) salientam ainda, a importância de um tônus muscular efetivo que se adapte rapidamente a alterações, da força muscular e da flexibilidade articular.

    A alteração de qualquer um destes sistemas (proprioceptivos, vestibulares, óculo-motor e musculoesquelético) pode desencadear distúrbios de equilíbrio, desta forma estudos vêm demonstrando que processos degenerativos do sistema musculoesquelético, reconhecidamente causadores de incapacidade funcional, também provocam distúrbios na manutenção do equilíbrio postural, provavelmente conseqüência da queixa álgica, diminuição de força muscular e alterações da propriocepção que invariavelmente acompanham estas patologias (BENNELL et al., 2004; HASSAM et al., 2001; WENEGER et al., 1997).

    A população brasileira passa por um processo de envelhecimento que vem ocorrendo de forma rápida e, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2030 o Brasil terá a sexta população mundial em número absoluto acima dos sessenta anos (RAMOS, 2003). Embora o envelhecimento não possa ser considerado um processo patológico, podemos destacar a dependência física como um dos aspectos mais comprometedores, já que esta fase é caracterizada, de certa forma, pela perda da capacidade do organismo em responder de forma adequada às injúrias oferecidas, ocasionando maior vulnerabilidade e maior incidência de processos patológicos (PAPALÉO, 1996). Um fator altamente relevante é o comprometimento da circulação cardiovascular em idosos, pois no Brasil, nos hospitais do SUS do Rio de Janeiro, entre os anos de 1994 e 1995, a maior incidência de fraturas por queda registradas em idosos foi no colo do fêmur. (CARVALHO, COUTINHO, 2006).

    No caso dos indivíduos idosos, o controle postural fica seriamente comprometido já que os sistemas responsáveis por fornecer informações do meio para o individuo não são capazes de identificar com eficiência as exatas condições de prática. Embora a coordenação postural ocorra de forma rápida, através de respostas automáticas, ela é significativamente influenciada por experiências prévias, prática, instrução e períodos de treinamento (HORAK, 1996). Muitos estudos têm demonstrado os benefícios adquiridos como treinamento do equilíbrio em programas de atividade física (LORD et l., 2001; PROVINCE et al, 1995; SOUZA et al., 2002; OKUMA, 1998; ANDREOTI, 1999). Como benefícios advindos do treinamento físico, sob orientação profissional, visando reabilitação cardiovascular, podem-se citar a redução da mortalidade por complicações cardíacas de 20-35%, além de melhoras relevantes dos variados fatores que contribuem para o desencadeamento destas doenças (GODOY, 2006).

    Além do enfoque para a reabilitação cardiovascular, Ganança et al (2006) relataram que, para pacientes idosos deve-se intervir com tratamento direcionado aos fatores de risco de quedas, abrangendo exercícios de fortalecimento muscular, treino de equilíbrio, além de orientações quando a necessidade de adequações do ambiente domiciliar.

    Um método de avaliação do equilíbrio é a escala de Berg, que se trata de um instrumento que avalia o risco de quedas em idosos e leva em conta o efeito do ambiente na função. Nesta são realizados 14 tarefas para avaliar a habilidade do indivíduo de sentar, ficar de pé, alcançar, girar em volta de si mesmo, olhar por cima de seus ombros, ficar sobre apoio unipodal, e transpor degraus (RIBEIRO, PEREIRA, 2006).

    O objetivo deste estudo é avaliar o equilíbrio postural em indivíduos cardiopatas que realizam reabilitação cardiovascular, através da Escala de Equilíbrio de Berg, e verificar a relação do equilíbrio com a prática de atividade física correlacionando os dados obtidos com um grupo controle.

Metodologia

    Esta pesquisa se caracteriza por um estudo observacional transversal sobre o equilíbrio postural. A amostra foi constituída por 10 indivíduos cardiopatas com idade acima dos 50 anos, média de 61,5 ± 6,65, selecionados aleatoriamente, e participantes do Programa de Prevenção e Reabilitação de Doenças Cardio-Pulmonares e Metabólicas da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC). Para o grupo controle foram selecionados 10 indivíduos sedentários que realizavam tratamento fisioterapêutico na Clínica de Prevenção e Reabilitação Física do Centro de Saúde e do Esporte (CEFID/UDESC), sendo os critérios de inclusão utilizados para este: idade superior a 50 anos, não praticar atividade física regular e ausência de acometimentos osteomusculares em membros inferiores. A média de idade do grupo controle foi igual a 56,9 ± 4,97, e as doenças apresentadas incluíam síndrome do impacto, capsulite adesiva do ombro, cervicalgia, epicondilite, bursite e fratura de punho.

    A coleta baseou-se primeiramente numa breve entrevista para obtenção de dados pessoais, os medicamentos em uso, relatos sobre quedas, situações de déficit de equilíbrio e tonturas. Em seguida foi aplicada em todos os sujeitos da pesquisa a Escala de Equilíbrio de Berg constituída por 14 tarefas comuns que envolvem o equilíbrio estático e dinâmico tais como alcançar, girar, transferir-se, permanecer em pé e levantar-se. A realização das tarefas foi avaliada através de observação e a pontuação variou de 0 a 4 totalizando um máximo de 56 pontos. Os equipamentos utilizados para a realização do teste foram cronômetro, régua, cadeiras de altura razoável e o degrau de uma escada.

Resultados e discussão

    Os resultados deste estudo demonstram que os indivíduos cardiopatas possuem escore total dentro da amplitude de normalidade, com média de 53,3±2,6 pontos, sendo que apenas um indivíduo apresentou escore abaixo de 50 pontos correspondendo a uma propensão maior a quedas (figura 1). No entanto este caso diz respeito ao sujeito com seqüela de acidente vascular encefálico que necessita de suporte externo (bengala) para realização de algumas atividades cotidianas como locomoção e deambulação em escadas. O grupo controle apresentou média de 54,9±1,3 pontos, com amplitude máxima de pontuação em sua grande maioria sendo que apenas um dos sujeitos obteve escore total abaixo de 54 pontos (figura 2).

Figura 1. Escore total do equilíbrio dos indivíduos cardiopatas

 

Figura 2. Escore total do equilíbrio do grupo controle

    De acordo com Shumway-Cook, Woollacott (2003), na amplitude de 56 a 54 cada ponto deduzido é associado a um aumento de 3 a 4% no risco de quedas, de 54 a 46 a alteração de um ponto é associada a um aumento de 6 a 8% de chances, sendo que abaixo de 36 pontos o risco de quedas é quase de 100%.

    Dentre as tarefas que apresentaram maior dificuldade de realização encontram-se a de alcançar um objeto à frente, apoio unipodal e apoio bipodal com um pé à frente do outro. Durante as atividades de pegar um objeto no chão a partir da posição em pé, realizar giro de 360° e virar-se e olhar sobre os ombros grande maioria dos indivíduos cardiopatas relataram tontura leve.

    A relação entre o grupo experimental e o controle demonstra que os indivíduos em reabilitação cardíaca apresentam maior déficit de equilíbrio postural e essa relação está elucidada no figura 3. Isso pode estar relacionado com a medicação em uso que implica, entre outras reações adversas, em episódios de tonturas e síncopes. Este fato também evidencia a possibilidade da instituição de programas de treinamento de força e de equilíbrio dentro do projeto de reabilitação cardiovascular a fim de minimizar esse déficit já que a ocorrência de quedas em cardiopatas caracteriza um fator preocupante.

    Shumway-Cook, Woollacott (2003) citam que 25% a 35% da população com mais de 65 anos tende a sofrer quedas. Segundo pesquisa norte-americanas, 30% das pessoas com idade superior ou igual a 65 anos sofrem quedas por anos e destes casos 20% vêem a óbito dentro de um anos (AAOS, 2003). A maioria das fraturas é resultado de quedas em casa durante atividades cotidianas como subir e descer escadas, ir ao banheiro ou trabalhando na cozinha. Em torno de 3 bilhoes de dólares são gastos pelo sistema de saúde norte-americano com fraturas de quadril (TINETTI, 1989).

Figura 3. Relação entre a média de escore total dos cardiopatas e do grupo controle

    Hassam et al. (2001) acreditam que a dor e a diminuição da força muscular influenciam no equilíbrio postural. Ramos (2003) sugere associação entre disfunção muscular e déficit proprioceptivo. Hurley et al. (1997) esclarece que indiscutivelmente força muscular e propriocepção são fisiologicamente interligadas no controle do movimento dos membros e dissipação de carga através da articulação. Neste sentido, as pesquisas de Ramos (2003) referem melhora no equilíbrio, observada pela diminuição de oscilação corporal, em indivíduos idosos que foram submetidos a exercícios de fortalecimento muscular e atividades aeróbicas.

    Alguns estudos tem demonstrado aumento das habilidades funcionais, controle de equilíbrio e da velocidade da marcha quando o há a associação entre treinamento de força, de capacidade aeróbia e de equilíbrio (JUDGE et al, 1993; LORD et al.,, 2001). Souza e Marques (2002) desenvolveram um estudo de 12 semanas de treinamento de força para verificar as influencias sobre o risco de quedas em idosos e verificaram um aumento de 32 a 48% de força muscular e uma melhora significativa no desempenho indicando que o treinamento de força pode estar diretamente associado à diminuição do risco de quedas.

    O treinamento de capacidade aeróbia também tem se mostrado efetivo para diminuir a taxa de quedas e modificar os fatores de risco de quedas. Os estudos citados por Lord et al. (2001) demonstram ganhos de força muscular, mobilidade articular, aumento da velocidade em subir escadas e da marcha e melhoria na qualidade de equilíbrio. Esses dados correspondem com os resultados obtidos nesta pesquisa na amostra experimental, demonstrando que a reabilitação cardíaca está auxiliando no controle de equilíbrio postural desses indivíduos. No entanto, o equilíbrio para este grupo pode ainda ser maximizado com a instituição de treinamentos de força e de equilíbrio e desta forma ser obtida uma melhora na realização das atividades da vida diária bem como na própria reabilitação cardiovascular.

Considerações finais

    Este estudo verificou que os cardiopatas apresentam déficits mínimos de equilíbrio quando comparados a indivíduos sedentários, mas essas alterações podem ser minimizadas e/ou corrigidas com a instituição de treinamentos de força e de equilíbrio associada a reabilitação cardíaca. Assim, fica a sugestão da realização de novos estudos com populações maiores e também após a aplicação desses treinamentos para mensurar fidedignamente essa melhora.

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