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Expectativa de mudança: abrangência, importância e 

influências na Educação Física. Uma revisão de literatura

Expectativa de cambio: alcance, importancia e influencias en la Educación Física. Una revisión de la literatura

 

*Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE)

Graduada em Educação Física – Bacharelado no ano de 2008.

Cursando Especialização em Fisiologia do Exercício pela

Universidade Federal do Paraná (UFPR)

**Professor da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE)

Graduado em Educação Física pela Universidade Federal de Santa Maria (2003)

Especialização em Futebol pela Universidade Federal de Viçosa (2005)

Mestre em Atividade Física e Saúde pela Universidade Federal de Santa Maria (2007).

Professor do curso de Educação Física – Bacharelado

Fabrícia Daniela Martins Almeida*

fabricia_dani@hotmail.com

Paulo Henrique Santos da Fonseca**

profpaulofonseca@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

Resumo

          O interesse em medidas subjetivas da saúde tem crescido consideravelmente desde que se demonstrou sua importância como medida preceptora da morbidade e da mortalidade. Estudos encontraram que a saúde percebida é um melhor preceptor de mortalidade do que a saúde real. Esta pesquisa, em uma revisão de literatura, pretende mostrar como a mente parece influenciar positivamente as respostas fisiológicas. O dualismo mente-corpo, concebido no século XVII por Descartes, ainda existe na separação entre os fenômenos físicos e psicológicos. Pesquisas testando se a interação entre o exercício e a melhora da saúde é moderada pela influência da mente, a relação se mostrou positiva. Em um outro estudo, a mente também apareceu como capaz de gerar respostas no corpo. Saber o que o indivíduo pensa também é necessário para escolher qual estímulo aplicar a ele, quando relacionado à prática de exercícios físicos. Por haver pouco material específico, não se pode atribuir uma dimensão exata de quão abrangente é a influência da mente quando relacionada à prática do exercício físico, mas as evidências apontam para o conhecimento e valorização dos estímulos psicológicos como expressivo influente nas respostas fisiológicas. Manter o aluno a par dos objetivos, das finalidades de cada exercício, por exemplo, devem ser medidas tomadas habitualmente pelo profissional de Educação Física. Perceber essa influência da mente sobre o corpo, é importante tanto para maximizar a criação de expectativas, quanto para sermos mais cautelosos ao interpretar dados que mostrem investigações feitas sem a preocupação da interação corpo e mente.

          Descritores: Expectativa de mudança. Efeito placebo. Auto-percepção de saúde

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 140 - Enero de 2010

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Introdução

    O interesse em medidas subjetivas da saúde, como a auto-avaliação do próprio estado de saúde, tem crescido consideravelmente desde que se demonstrou sua importância como medida preceptora da incapacidade, da mortalidade e da morbidade (ROMERO e SOUZA JR, 2004).

    Alguns estudos trazem que a percepção do estado de saúde é melhor preceptor de morbidade e mortalidade do que a saúde real da pessoa (KAPLAN e CAMACHO, 1983; IDLER e KASL, 1991 apud CRUM e LANGER, 2007). Analisar como essa percepção parece influenciar o modo e até a perspectiva de vida de alguém nos remete a uma avaliação da influência da mente sobre o corpo humano. Os fenômenos e respostas fisiológicas parecem poder ocorrer, em maior ou menor grau, de acordo com os estímulos psicológicos recebidos. Como exemplo de tais situações, além da percepção de saúde como melhor preceptor da mortalidade do que a saúde real, existe o efeito placebo, que é outro tópico que reflete a perspectiva da mente como influente no corpo.

    Sabe-se que, mediante desejos, sentimentos e expectativas, a mente humana é capaz de catalisar e aprimorar os efeitos de um determinado tratamento, o que é conhecido como efeito placebo (LINO, em fase de pré-publicação). Apesar de ele ser extremamente utilizado e conhecido na aplicação de medicamentos e tratamentos médicos, na Educação Física ele é pouco estudado. Os escassos estudos encontrados trazendo a relação mente-corpo com a Educação Física também sugerem a pouca importância dada ao fenômeno; o que não deveria ocorrer, já que, apesar de o modo como ocorre essa influência ainda não tenha sido – e talvez não consiga ser – completamente elucidado (BARRET e colaboradores, 2006), é necessário observar como a geração de expectativas parece influenciar positivamente respostas fisiológicas.

    Em uma revisão de literatura, esta pesquisa, então, pretende reunir o máximo de materiais que tragam investigações a respeito de como a geração de uma expectativa de mudança é capaz de exercer influência no corpo humano e qual sua relação e importância com a prática da Educação Física.

    Para analisar e descrever a abrangência da influência da expectativa de mudança sobre o corpo humano e avaliar como a expectativa de mudança tem importância para o profissional de Educação Física, os materiais foram coletados através de indexadores como o Google acadêmico, PubMed, SciELO e Periódicos Capes. Os descritores foram: percepção de saúde (perceived health), auto-percepção de saúde (self-perceived health), auto-percepção de saúde e atividade física (self-perceived health and physical activity), efeito placebo (placebo effect), efeito placebo e exercício físico, (placebo effect and physical exercise), qualidade de vida e efeitos psicológicos do exercício. Também foi utilizado o Comut e a biblioteca da Unioeste de Marechal Cândido Rondon. O levantamento dos dados foi feito entre março de 2007 e outubro de 2008.

Qualidade de vida e saúde

    Sabendo que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a noção de saúde é "um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de doença ou enfermidade", fica mais fácil compreender quando Shepard apud Barros e Santos (2000) define QV como resultante da percepção das condições de saúde, capacidade funcional e outros aspectos da vida pessoal e familiar. Nahas apud Barros e Santos (2000) tenta defini-la como resultante de um conjunto de parâmetros individuais, socioculturais e ambientais, que caracterizam as condições em que vive o ser humano, uma comunidade ou uma nação.

    Um dos instrumentos de medida da QV, o WHOQOL-100, um instrumento formado por 100 itens que foi elaborado pela OMS, é composto de seis diferentes domínios, os quais compõem-se por: domínio físico, domínio psicológico, nível de independência, relações sociais, meio-ambiente e espiritualidade / religião / crenças pessoais. Observa-se que dentre os seis domínios, boa parte se relaciona direta ou indiretamente com a prática de atividades e exercícios físicos: domínio físico, que envolve dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso; domínio psicológico, tratando de sentimentos positivos, pensar, aprender, memória e concentração, auto-estima, imagem corporal e aparência e sentimentos negativos; nível de Independência, que abrange mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos e capacidade de trabalho e relações sociais, envolvendo relações pessoais, suporte (apoio) social e atividades sexuais.

Percepção de saúde x saúde real

    Kaplan e Camacho apud Crum e Langer (2007) encontraram que a saúde percebida era um melhor preceptor de mortalidade do que a saúde real. Idler e Kasl apud Crum e Langer (2007) concluíram que indivíduos idosos que percebiam sua saúde como pobre eram seis vezes mais propensos a morrer do que aqueles que percebiam sua saúde como excelente, independente do estado de saúde real de cada um.

    Idler e Kasl apud Lima-Costa e colaboradores (2007) trazem que o risco da mortalidade associado à pior percepção da saúde é mais alto do que o observado para diversas medidas objetivas da condição de saúde. Além disso, estudos conduzidos em diferentes países têm mostrado que essa associação é consistente, sendo observada em populações com diferentes características culturais. (IDLER e BENYAMINI; JYLHA e colaboradores apud LIMA-COSTA, 2007).

    Em uma pesquisa sobre a percepção de saúde e nível de atividade física em mulheres com doença vascular periférica, de Ferreira e Nahas (2005), foi observado que o fato de possuir uma doença crônica degenerativa não impediu que a maioria (83,5%) das investigadas apresentasse uma percepção de saúde positiva (excelente, muito boa e boa).

    Analisando mais profundamente tais dados, pode-se perceber que a influência da mente nas respostas fisiológicas é muito grande; e essa capacidade de o que a mente pensa gerar resultados no corpo ainda intriga muitos pesquisadores. Mas, durante muito tempo, a psicologia da mente, segundo Barret e colaboradores (2006), foi tida como desconectada da fisiologia do corpo, e tentativas de pesquisa foram amplamente conduzidas independentemente de estudos da cognição, emoção e psicologia.

    Esse dualismo mente-corpo, também conhecido por dualismo Cartesiano, consiste em conceber uma mente não-física, separada de um corpo e uma realidade física (LAMPREIA, 1993). No século XVII, René Descartes escreveu “Discurso do Método”, obra na qual propôs pesquisas subdividindo o fenômeno (biológico e psicológico) nas menores partes possíveis a fim de se compreender cada um em separado (TOMAZ e GIUGLIANO, 1997). Araújo (2003) fala que Descartes entendia a “alma” como uma substância imaterial distinta do corpo, o qual seria a substância material, e sua pesquisa levanta uma dúvida: são mente e cérebro coisas distintas e não redutíveis uma à outra? Ou, ao contrário, a primeira representa apenas uma variação da segunda?

    Embora o dualismo original tenha sido praticamente abandonado, permanece a idéia de dualismo de propriedade que distingue os fenômenos psicológicos dos físicos (LAMPREIA, 1993). Esse dualismo restante ocorre, entre outros, justamente quando deixamos de levar em conta a influência da expectativa da mente em respostas fisiológicas.

    O uso de placebos, cujos efeitos estão particularmente relacionados à respostas positivas/benéficas em praticamente todas as áreas da prática medicinal (GEERS e colaboradores, 2006) e a relação da auto-percepção de saúde como melhor preceptor da mortalidade independente da saúde real (KAPLAN e CAMACHO apud CRUM e LANGER, 2007, tradução nossa) são duas situações que surgem justamente da interação mente-corpo.

Interação mente-corpo: Efeito placebo

    De acordo com Crum e Langer (2007), efeito placebo é qualquer efeito que não é atribuído a uma droga farmacêutica real ou remédio, mas que é decorrente sim da influência da mente do indivíduo.

    Em um estudo testando se o relacionamento entre o exercício e a saúde é moderado pela influência da mente, Crum e Langer (2007) trabalharam com faxineiras de hotéis, com cargas horárias de trabalho equivalentes entre si e, nelas mediram variáveis afetadas pelo exercício. Às do grupo experimental, foi dito que seu trabalho era equivalente a um bom exercício e que satisfazia as recomendações para um estilo de vida ativo dado pelo Surgeon General (entidade Americana chefe em educação de saúde para a população). Às presentes no grupo controle, nada foi dito. Essas mulheres, e não no grupo controle, quatro semanas após a intervenção, mostraram diminuição nas variáveis medidas; o que, segundo as autoras, suporta a hipótese de que o exercício afeta a saúde, pelo menos em parte, através do efeito placebo.

    Desharnais e colaboradores (1993) conduziram um programa de 10 semanas de exercício supervisionado para determinar se o efeito placebo está envolvido com a melhora do que os autores trataram como conexão exercício-psicológica. Baseado no procedimento de expectativa de mudança, metade dos sujeitos foi levada a acreditar que o seu programa fora especificamente designado para melhorar o bem-estar psicológico, enquanto nenhuma intervenção foi feita no restante do grupo (grupo controle), o qual também participou do programa de exercícios. Os resultados mostraram significante melhora na capacidade física (VO2 máximo) em ambas as condições. Mas o bem-estar sofreu mudanças positivas apenas no grupo experimental, e não no grupo controle. Essas descobertas, de acordo com os autores, provêem evidências que suportam a noção de que o exercício pode melhorar o bem-estar psicológico através de um forte efeito placebo.

    Em Crum e Langer (2007), é mostrado que o fato de a pessoa saber a respeito daquilo que faz é muito importante para que tal atividade traga os benefícios de que é capaz. Ou seja, pouco adianta a pessoa que tem um hábito ou rotina saudável manter-se assim sem que tenha o conhecimento de que tal hábito ou rotina é bom para ela e que ela pode usufruir de mudanças positivas que este é capaz de propiciar.

    Os resultados da investigação de Desharnais e colaboradores (1993) também provêem suporte adicional à noção proposta por Solomon apud Desharnais (1993), de que o efeito placebo pode estar envolvido com a conexão exercício-psicológica; o que, segundo eles mesmos, dá base à teoria de que as melhoras psicológicas adquiridas através do exercício são atribuídas a componentes psicossociais inerentes ao programa de exercícios.

    Apesar de não poderem concluir que o efeito placebo seria o único mecanismo envolvido na explicação da influência do exercício sobre o bem-estar psicológico, a pesquisa de Desharnais e colaboradores (1993) mostra que, sozinha, a prática do exercício físico pode não ser tão capaz de prover tanta melhora quanto quando essa prática é feita de forma consciente, estando seus praticantes a par de todos os benefícios que ela pode trazer.

    Essa melhora do bem-estar psicológico através do exercício é um fato ainda não completamente explicado. Existem diversas teorias que tentam justificar como ocorrem os efeitos psicológicos do exercício.

Efeitos psicológicos do exercício

    O exercício físico tem efeito benéfico que parece resultar de interações complexas de efeitos psicológicos e fisiológicos (BOSCO e colaboradores, 2004). Werneck, Filho e Ribeiro (2005) afirmam que um dos grandes desafios para os pesquisadores tem sido desenvolver e testar uma teoria que explique porque e como o exercício altera o estado psicológico. Os mesmos autores dizem que essa plausibilidade biológica tem sido testada e debatida através de hipóteses fisiológicas, psicológicas e psiconeurofisiológicas.

    A hipótese psicológica da expectativa de mudança, afirma que, se todos dizem que o exercício melhora o humor, isto implica numa expectativa de mudança, em que a pessoa acredita que ela vai se sentir bem após a atividade, os mesmos autores dizem que alguns estudos dão suporte, porém, outros a rejeitam.

    Essa hipótese, cujo termo usado para defini-la, expectativa de mudança, é equivalente ao já citado efeito placebo, cujo significado define uma substância ou procedimento inerte que altera respostas psicológicas ou fisiológicas (STEWART-WILLIAMS apud GEERS e colaboradores, 2006, tradução nossa). Como Werneck, Filho e Ribeiro (2005) mesmo citam, devido ao pequeno e contraditório número de estudos, essa hipótese necessita de mais pesquisas.

    Nos poucos estudos encontrados tratando sobre como uma expectativa de mudança pode influenciar ou não alterações psicológicas e fisiológicas no organismo, é ainda mais raro aqueles que trazem essa relação com respeito ao exercício físico; ou seja, se a expectativa de mudança tem significância quando analisados os benefícios do exercício. Mas, nas duas pesquisas encontradas (CRUM e LANGER, 2007; DESHARNAIS e colaboradores, 1993), a expectativa de mudança aparece como grande influenciadora de respostas fisiológicas.

    Assim, com mais estudos trazendo essa relação mente-corpo, poderemos confirmar a sua importância e conhecer e entender melhor como ele ocorre e qual sua abrangência e limitações.

Expectativa de mudança e o processo de mudança de comportamento

    Os diferentes comportamentos apresentados por um indivíduo a respeito da prática de atividade física simbolizam o quanto este está disposto a uma mudança, ou seja, quão suscetível ele está no que se refere a alterar seus hábitos; no caso, aderindo ou incrementando sua rotina de atividades e exercícios físicos.

    Entender as fases que envolvem a mudança de comportamento de uma pessoa é fundamental para saber que tipo de intervenção realizar com ela. A classificação dos indivíduos em estágio de mudança de comportamento, segundo Dumith, Domingues e Gigante (2008) permite distinguir aqueles que estão dispostos a fazer mudanças no seu estilo de vida daqueles que não pretendem.

    Atualmente, o Modelo Transteorético de Mudança de Comportamento – transtheoretical model - (TTM), proposto por Prochaska, Diclemente e Norcross na década de 80, vem sendo amplamente empregado na investigação da adoção de comportamentos relacionados à saúde (DUMITH, DOMINGUES e GINGANTE, 2005; GUEDES, SANTOS e LOPES, 2006; REIS e PETROSKI, 2005; SÁ-E-SOUZA e DUARTE, 2005), tendo potencial para explicar e facilitar mudanças nesse aspecto.

    Os estágios sugeridos por Prochaska, Diclemente e Norcross (1992), explicados brevemente, são: Pré-contemplação: não há a intenção de mudança de comportamento; Geralmente o indivíduo ainda não possui a consciência do comportamento inadequado. Contemplação: quando a pessoa passa a ser consciente do problema comportamental e já pensa seriamente sobre mudá-lo, mas ainda não toma tal atitude; é a época na qual pesam as barreiras e os benefícios para a mudança. Preparação: há o planejamento de como a mudança irá ocorrer, e pretende-se realiza-la, aproximadamente, no mês seguinte, e ocorrem pequenas alterações no comportamento. Ação: o indivíduo modifica seu comportamento para superar o problema. As pessoas são incluídas nesse grupo quando alteram seu comportamento com sucesso por um período de um dia até seis meses. Manutenção: estágio no qual as pessoas trabalham para prevenir recaídas ou deslizes e consolidam os ganhos atingidos no período anterior. Mas essa não é uma fase vista como estática, e sim como uma continuação da mudança. Esse estágio se estende do sexto mês por um período indeterminado.

    Um indivíduo, estando em um ou outro estágio do TTM, tem maior probabilidade de sofrer alguma determinada resposta, quando submetida a determinado estímulo. Por exemplo, uma pessoa no estado pré-contemplativo, ou seja, que ainda não percebeu que possui um comportamento errado (que é sedentário, no caso) ou que ainda não pensou em mudá-lo, e que recebe uma informação sobre a velocidade ideal de um treinamento de corrida, é capaz de ignorar essa informação completamente, não entende-la ou, ainda, tentar executar o treinamento na velocidade falada, não conseguir e, ao sentir-se frustrada, não engajar na prática do exercício.

    Estudos que investiguem a prevalência da população nos determinados níveis de mudança de comportamento, então, podem ser muito eficientes para, depois de identificada, saber exatamente que tipo de intervenção é melhor em cada grupo de pessoas, escolhendo entre estimular o início da prática de exercícios físicos ou a sua manutenção para a vida toda.

Considerações finais

    A distinção proposta por Descartes no século XVII, tornando mente e corpo como duas “coisas” distintas, com essências diferentes e não relacionadas entre si é, já há algum tempo, e com base nos estudos apresentados, inadequada. Lampreia (1993) disse que o que restou desse dualismo se limita à diferenciação dos fenômenos físicos dos psicológicos. O que, aliás, também deve ser refutado, já que foi mostrado que a criação de uma expectativa, a percepção de um estado ou outro de saúde parecem muito significativos, gerando influência no corpo.

    Saber o que o indivíduo pensa também é necessário quando na escolha de qual estímulo aplicar a ele. O elemento-chave do Modelo Transteorético é a relação entre os estágios e os processos de mudança. Segundo Oliveira e Duarte (2007), os processos são diferentemente usados no decorrer dos estágios, o que significa que o que determina um outro método de intervenção, são a disposição e preparação psicológica para a mudança.

    Segundo os dados a respeito da percepção de saúde, podemos concluir que a pessoa sentir-se saudável é tão ou mais importante quanto ela ser, de fato, saudável. Essa, porém, não é uma informação que deve ser vista unilateralmente. Não se deve, com isso, nem pensar em desfazer dos benefícios fisiológicos do exercício, mas, pelo contrário, deve-se estimular essa melhora com incentivo e apoio constante, já que é sabido que a mente, em maior ou menor grandeza, é capaz de transformar as informações que recebe em respostas diretas no corpo.

    Barret e colaboradores (2006, tradução nossa) dizem que “experiências prévias e o contexto envolvido (palavras que são ditas, atitudes e a conduta das pessoas envolvidas, e as circunstâncias físicas) são, provavelmente, mais importantes que a cor, forma ou tamanho da pílula usada no tratamento”.

    Ao invés de uma pílula, tomamos como referência o exercício físico; e assim, podemos visualizar como o procedimento de aplicação de tal atividade deve ser baseado na criação de expectativas no cliente ou aluno. Mantê-lo a par dos objetivos a curto e longo prazo, das finalidades específicas de cada exercício, questionar possíveis dúvidas e como ele está reagindo aos estímulos, se sente as melhoras e qual o grau em que elas estão acontecendo, devem ser medidas tomadas habitualmente, seja na aula de ginástica de academia, como Personal Trainer ou algum outro meio em que o Professor de Educação Física esteja atuando.

    Se nós aceitarmos que o corpo, a mente e a cultura são fortemente ligados um ao outro, e que o que ocorre no primeiro é resultado de uma rede complexa de múltiplos laços de resposta entre ambos (BARRET e colaboradores, 2006), estaremos prontos tanto para maximizar a criação de expectativas (verdadeiras e cientificamente comprovadas) no indivíduo, quanto para sermos mais cautelosos ao interpretar dados que mostrem investigações feitas sem a preocupação da interação corpo e mente.

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