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Os jogos esportivos coletivos do CEFD/UFSM e a

transformação do esporte: que relação 

é essa na formação inicial

Los juegos deportivos colectivos del CEFD/UFSM y la transformación 

del deporte: cuál es la relación en la formación inicial

 

*Autora - Graduada em Educação Física Licenciatura Plena e

Especializanda em Educação Física Escolar CEFD/UFSM

**Orientador do TCCL - Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em

Educação (PPGE) do Centro de Educação (CE) da UFSM

Professor da Faculdade IDEAU (Instituto de Desenvolvimento Educacional do Alto Uruguai)

Juliana da Silva Silveira*

Marcio Salles da Silva**

ju_lianasilveira@hotmail.com

(Brasil)

 

 

 

Resumo

          Este estudo objetivou analisar a compreensão dos discentes sobre a transformação dos esportes no curso de licenciatura plena em Educação Física, em relação à vivência nos componentes curriculares denominados Jogos Esportivos Coletivos do Centro de Educação Física e Desportos da Universidade Federal de Santa Maria. A investigação caracterizou-se sob a forma de um estudo de caso com abordagem qualitativa descritiva. O instrumento utilizado na coleta das informações foi uma entrevista semi-estruturada, gravada, transcrita e analisada através da análise de conteúdo. Os participantes foram três acadêmicos do curso de graduação de licenciatura plena em Educação Física da UFSM currículo versão 2005. Verificamos que há uma incongruência no que diz respeito aos objetivos contemplados no Projeto Político Pedagógico versão 2004 e o que realmente ocorre nas aulas sobre esportes no curso de licenciatura em Educação Física da UFSM. Os professores descumprem esta proposta que engloba as transformações dos esportes, sem justificativa legal e retornam a forma de ensino do currículo versão 1990.

          Unitermos: Educação Física. Jogos Esportivos Coletivos. Transformação dos esportes.

 

          Trabalho de Conclusão de Curso da Licenciatura (TCCL) em Educação Física no Centro de Educação Física e Desportos (CEFD) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 134 - Julio de 2009

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1. Introdução/ Ponto de Partida

1.1.     Contextualização da temática

    Os jogos são as atividades físicas ou mentais, organizados através de um sistema de regras próprias, pré-determinadas ou construídas pelos sujeitos que o jogam, podendo conter a forma competitiva com o objetivo de um ganhador ou a cooperativa, ambos promovem a integração entre os sujeitos que o jogam. O jogo pode ser oriundo de natureza econômica ou política, com implicações diretas nas relações sociais.

    Conforme PAVÍA (2005, p. 249) “precisamente o conceito de forma ‘do jogo’ e ‘modo de jogar’ são duas dimensões a considerar para uma análise crítica da atividade lúdica que se desenvolve nas aulas de Educação Física”.

    Quando o jogo é relacionado com atividades esportivas às conotações/regras são interligadas com os esportes e suas instituições regulamentadoras.

    Sobre as implicações da esportivização, a Educação Física assume identificação com o esporte de rendimento, para tanto, Bracht (1992, p. 22) comenta que “não o esporte da escola, e sim o esporte na escola, o que indica a sua subordinação aos códigos/sentidos da instituição esportiva”. Assim, o processo de esportivização no ambiente escolar faz-se compreender a Educação Física com utilização do esporte na escola, ou seja, “é um braço prolongado da própria instituição esportiva” (Ibid.).

    Bracht e Gonzáles (2005, p. 153) colocam que “durante as décadas de 70 e 80 do século XX, quando o ensino das destrezas esportivas e da prática dos esportes (basicamente do futebol, voleibol, basquetebol e handebol) eram o carro-chefe”. Portanto, os jogos quando esportivos podem abranger a coletividade dos que o praticam/integram e enquanto elemento histórico da Educação Física.

    Valendo-se destes elementos históricos o Centro de Educação Física e Desportos (CEFD), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), implantou em seu currículo, no ano de 2005, o curso licenciatura plena em Educação Física fazendo referência em seu programa de disciplinas os “Jogos Esportivos Coletivos” (JEC’s). O ensino dos esportes no currículo anterior versão 1990 era através de uma disciplina para cada esporte (Futebol, Voleibol, Basquetebol e Handebol). Com o objetivo de, em cada disciplina de Jogos Esportivos Coletivos, contemplarem os quatro esportes tradicionais da Educação Física, citados acima, na grade curricular de maneira ampla, além de fazer referência às transformações ocorridas nos mesmos.

    A incorporação de jogos esportivos na cultura brasileira está relacionada com as diferentes formas do “se movimentar” humano, juntamente com influência externa na provável participação em eventos/espetáculos internacionais, que ligam a confraternização dos povos no culto ao alto rendimento esportivo.

    Para tanto, Bracht (apud FENSTERSEIFER, 2001, p. 278) comenta que a Educação Física agiria:

    no sentido de instrumentalizar o indivíduo para ocupar de forma autônoma seu tempo livre também com atividades corporais de movimento (com as conseqüências orgânicas, motoras, psíquicas e de qualidade de vida postuladas para as atividades corporais de movimento), de instrumentalizar o indivíduo para entender e se posicionar criticamente frente à nossa cultura corporal/movimento, e educaria no sentido de desenvolver uma sociabilidade composta de valores que permitam um enfrentamento crítico com os valores dominantes.

    Para que a Educação Física escolar possa vislumbrar o sentido referido anteriormente, é necessário que no curso de formação os acadêmicos sejam instigados a refletirem criticamente não apenas sobre o ensino da Educação Física, mas também sobre a realidade das escolas e a influência do esporte na sociedade.

    O curso de formação de professores em Educação Física ao evidenciar os “JEC’s” enquanto elemento histórico da cultura nacional e local, integrado na sociedade e valendo-se de interesses políticos e econômicos nos fornece uma conjuntura de informações que aliado aos conteúdos dos esportes formam o interesse pedagógico da Educação Física para o curso de licenciatura.

    A educação como um processo construído historicamente nos materializa enquanto seres humanos capazes de refletir e pesquisar sobre os acontecimentos do mundo globalizado, na qual o conteúdo trabalhado, no caso os esportes, está interligado com os elementos sociais, culturais, econômicos e políticos que ocorrem continuamente em nossas vidas.

1.2.     Objetivos do estudo

1.2.1.     Objetivo geral

    Analisar a compreensão dos discentes sobre a transformação dos esportes no curso de licenciatura plena em Educação Física, em relação à vivência nos componentes curriculares denominados Jogos Esportivos Coletivos do CEFD/UFSM.

1.2.2.     Objetivos específicos

  • Analisar o entendimento dos discentes, antes de ingressar no curso de licenciatura plena em Educação Física, sobre o assunto transformação didático-pedagógica dos esportes;

  • Verificar se a transformação do esporte foi evidenciada no componente curricular denominado “Laboratório de Educação Física II” (LAB II) do 2° semestre;

  • Investigar o entendimento dos discentes sobre os componentes curriculares Jogos Esportivos Coletivos (JEC’s);

  • Compreender as transformações no contexto histórico da cultura do basquete, futebol, handebol e voleibol, no componente curricular denominado JEC’s I do 3° semestre;

  • Conhecer a vivência e reflexão no processo da prática esportiva do basquete, futebol, handebol e voleibol e suas transformações no componente curricular denominado JEC’s II do 4° semestre;

  • Verificar se foram trabalhados os princípios e conceitos do ato tático dos jogos basquete, futebol, handebol e voleibol e suas transformações no componente curricular denominado JEC’s III do 5° semestre;

  • Conhecer a realidade do ensino dos Jogos Esportivos Coletivos e suas transformações no componente curricular denominado JEC’s IV do 6° semestre;

  • Analisar a concepção de transformação do ensino dos esportes para os acadêmicos, no curso de licenciatura plena em Educação Física.

1.3.     Justificativa

    Este estudo justifica-se por se tratar de um tema muito polêmico durante o curso de graduação, me instigava entender os motivos pelos quais houveram alterações curriculares no ensino dos esportes. É importante ressaltar que há uma carência de estudos nessa área.

    É essencial aprofundar-me nos estudos sobre a pedagogia do esporte. Acredito, como futura educadora, que os conteúdos ensinados na universidade, mais tarde serão utilizados na construção das aulas de Educação Física nas escolas.

    O ato educacional é um ato social. Esse só irá se efetivar quando houver interação e discussão entre acadêmicos/alunos, professores e elaboradores dos currículos e assim, posteriormente, as alterações curriculares. E quando penso em mudança curricular não são apenas acréscimos no Projeto Político Pedagógico (PPP) do curso, mas concretas mudanças na maneira de ensinar e conseqüentemente de aprender, considerando que o professor, no caso eu, tem papel fundamental no processo de ensino aprendizagem.

2.     Procedimentos metodológicos

    A investigação caracterizou-se sob a forma de um estudo de caso com abordagem qualitativa descritiva. Os participantes foram três acadêmicos do curso de graduação da licenciatura plena em Educação Física da UFSM currículo versão 2005.

    Os acadêmicos participantes estavam concluindo o curso, além disso, foi levada em consideração a assiduidade nas aulas para uma contribuição verossímil sobre o tema, os mesmos demonstraram-se interessados em participar das entrevistas. Para preservar as identidades dos acadêmicos, estes receberam nomes fictícios como Brás, Capitu e Flora. Escolhi três personagens tipicamente machadianos, de diferentes livros de Machado de Assis, literatura que surge em oposição ao romantismo, da qual tenho muito apreço, e considero todos os entrevistados realistas sobre o tema JEC’s. Além disso, associei cada acadêmico a uma característica peculiar do personagem, Brás do livro “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, por se tratar de uma pessoa sarcástica; Capitu do livro “Dom Casmurro”, por se assemelhar as características físicas da personagem e, por fim Flora do romance “Esaú de Jacob”, por ser extremamente uma moça séria e comprometida.

    O instrumento utilizado para coleta das informações foi uma entrevista semi-estruturada, gravada e transcrita. A interpretação das informações seguiu a análise de conteúdo (BARDIN, 1977).

    Para melhor compreensão do trabalho desenvolvido, explicarei a distribuição no elenco das disciplinas da grade curricular do curso. As disciplinas estão dispostas nos respectivos semestres: LAB II no segundo; JEC’s I no terceiro; JEC’s II no quarto; JEC’s III no quinto e JEC’s IV no sexto. Para tanto, os objetivos desses componentes curriculares encontrados no PPP (UFSM, 2004) foram escolhidos a partir da temática “transformação do ensino dos JEC’s”.

    Entretanto, a distribuição nos tópicos no corpo do texto foram descritos como em exemplificação de uma aula direcionada para os JEC’s, que consta de duas fases: a preparatória para o jogo e o jogo propriamente dito. Num primeiro momento “a fase preparatória para o jogo”: Conhecimento do campo no qual vou jogar, no caso sobre o curso de formação inicial licenciatura plena em Educação Física; os jogos pré-desportivos fazendo-se uma analogia a vivência anterior dos acadêmicos e a preparação para o jogo, considerando o Laboratório de Educação Física II, que conforme o PPP (UFSM, 2004) serve como preparação para os JEC’s. Após esta fase inicial começarei o “jogo propriamente dito” trabalhando no primeiro tempo: handebol, no segundo tempo: basquetebol, no terceiro tempo: voleibol e finalizando no quarto tempo: futebol de campo e futsal. Por fim, fecharei o trabalho com o ponto de chegada.

3.     A fase preparatória para o jogo

3.1.     O curso de Formação de Professores em Educação Física da UFSM

    A reformulação do PPP do curso de licenciatura plena em Educação Física baseia-se em aspetos legais que exigem à reestruturação curricular. Essa nova estrutura adotada pelo CEFD para o novo curso de licenciatura da UFSM tomou como referencial as resoluções 01 e 02, que estabelecem as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores da Educação Básica, em nível superior, nos cursos de licenciatura, de graduação plena, da Educação Física (aprovadas em 18 e 19/02/2002) e a resolução nº 7, de 31 de março de 2004, que estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação em Educação Física (Parecer aprovado em 18/02/2004).

    Essa estrutura curricular está centrada em seis dimensões do conhecimento como: relação ser humano–sociedade, biológica do corpo humano, produção do conhecimento, culturais do movimento humano, didático-pedagógicas e técnico-instrumentais do movimento humano. Os JEC’s se enquadram nessa última dimensão e devem, conforme o PPP do curso contemplar “os conhecimentos teórico-práticos dos temas da cultura corporal nas diversas modalidades e formas de realização; desde a prática recreativa e manifestações do lazer, até o nível representativo, em suas dimensões de tempo, espaço e prática, qualificando os conhecimentos como instância de emancipação humana” (UFSM, 2004).

    Conseguir avançar na busca de novos caminhos para a Educação Física e esportes, os quais possam atender a exigências realmente educacionais, o que significa dizer aquelas vinculadas às implicações políticas e sociais, que sempre se fazem presentes no ato pedagógico (KUNZ, 2001, p. 14)

    O objetivo geral dos quatro componentes curriculares intitulados JEC’s está estruturado de maneira a contemplar a emancipação humana. Por isso, cada um de seus objetivos específicos está embasado na transformação dos esportes sustentando o PPP do curso de licenciatura plena em Educação Física.

3.2.     Vivência anterior dos acadêmicos: Os jogos pré-desportivos

    Os primeiros contatos com o esporte ocorrem muito cedo, na maioria das vezes na infância, para outras pessoas vai sendo aprazado, porém é notória a vivência das crianças com a brincadeira e “os joguinhos” pré-desportivos. Ademais, as crianças em sua vivência subjetiva constroem-se diferentemente nas relações com o movimento humano, essas experiências, positivas ou negativas, podem resultar num ponto culminante com mais facilidades para alguns e menos para outras. Em contrapartida, para KUNZ (2001, p. 18) “a proposta da transformação didático-pedagógica do esporte surge para atender as possibilidades bem sucedidas de todos os participantes do ensino e não de uma minoria”.

    Quando questionei os acadêmicos sobre a transformação didático-pedagógica dos esportes antes de ingressar no curso de Licenciatura, foram unânimes ao relatar que “não tinham conhecimento” (Brás, Capitu e Flora). Além disso, um dos entrevistados conta como foi a vivência na escola: “Não [tinha conhecimento da transformação didático-pedagógica dos esportes], antes da graduação a minha vivência era de equipes, que eu fui atleta de futsal, no caso ensino fundamental foi basicamente o futebol, já no ensino médio era trabalhado através de clubes, que eu tive vivência do basquete e do vôlei, mas era mais a prática pela prática” (Brás).

    Na maioria das escolas, as aulas de Educação Física resumem-se ao simples fazer, por ser uma disciplina essencialmente prática, como o próprio entrevistado relata “apenas a prática pela prática”, esquecendo que através desta posso propor variados conteúdos ou conteúdos tradicionais, como no caso, o ensino dos esportes com uma abordagem diferente.

    A educação física teve sua inserção no campo educacional enquanto “atividade”, não recebendo o estatuto de disciplina. Isso limitava-a a um simples “fazer”, expresso pela afirmação de que o lugar do corpo é o pátio a cargo da educação física, enquanto o lugar da mente é a sala de aula, a cargo das disciplinas ditas teóricas, realização da máxima de Juvenal: “Mens sana in corpore sano” (FENSTERSEIFER, 2001, p. 32).

    Flora justifica o fato de não ter entendimento sobre a transformação dos esportes “porque na escola só via os esportes de uma forma mais tradicional, sempre os fundamentos em primeiro lugar depois o jogo, e a professora às vezes corrigia alguma coisa nos jogos”.

    De acordo com Ghiraldelli Jr. (1988) a Educação Física Militarista destaca o papel da Educação Física e do Desporto na formação do homem obediente e adestrado, não somente está seriamente preocupada com a saúde individual, mas também com a saúde pública, funciona mais como selecionadora de ‘elites condutoras’, capaz de distribuir melhor homens e mulheres nas atividades sociais e profissionais, eliminando os mais fracos e premiando os fortes.

    Acredito que a abordagem militarista ainda é o modelo mais utilizado para o desenvolvimento das aulas de Educação Física, justifico com três fatores: primeiro esta abordagem seleciona os conteúdos extremamente práticos, segundo, oferece aos professores uma base organizacional e seqüencial para os planos de aula, e terceiro ainda seleciona os alunos, recompensando os mais fortes e excluindo os mais fracos da prática. Esses fatores explicam o porquê de os professores utilizarem veementemente a abordagem militarista que organiza de forma simples a didática das aulas, e ainda auxilia na seleção de possíveis talentos.

3.3.     A preparação para o jogo

    Utilizarei prioritariamente, para análise, a disciplina de “Laboratório de Educação Física II” (LAB II), porque o objetivo desta é “possibilitar acesso às várias culturas dos JEC’s (basquete, futebol, handebol e voleibol, e suas transformações), democratizando o processo das práticas e do conhecimento dos esportes” (UFSM, 2004). Esta disciplina serve como introdução aos JEC’s I, II, III e IV.

    Não obstante, na prática desse laboratório, segundo Brás o que ocorria “se não me engano umas três aulas de cada esporte, teve aula de futebol no campo, depois teve o handebol, teve joguinhos, depois teve o basquete e o vôlei, mas eu me lembro que o vôlei também o professor tentou fazer a gente estudar o esporte, pensar no esporte da escola e o handebol também”. Ele afirma novamente que se “teve alguma reflexão foi do handebol e do vôlei, no handebol, a gente praticava um pouco e o professor se reportava a realidade da escola, juntava todo mundo, fazia uma reuniãozinha para falar sobre o jogo, todo mundo participando, sobre as aulas mistas, que ali [na graduação] tinha meninas e meninos juntos, serviu para um primeiro contato com os esportes”.

    Já Capitu relata “não ter boas lembranças do Laboratório de Educação Física II, não foram evidenciadas [as transformações do esporte] e também considero ele desnecessário. Pouca coisa eu lembro porque não foi nada de significativo pra mim, foi muito... [precário]. Os professores nem sabiam qual era a proposta da disciplina, nada bom”.

    Sobre o LAB II, Flora conta que “em primeiro lugar essa disciplina foi meio confusa, porque a cada duas semanas de aula via coisas [conteúdos] sobre uma modalidade diferente, então não ficou muito concreto pra mim algum conhecimento, por causa da forma mesmo como foi passado pra nós”.

    Ela ainda reafirma a idéia da Capitu sobre a participação dos professores na nova proposta curricular dessa disciplina contando que “houve alguns desentendimentos entre os professores, eles não queriam participar da disciplina, não queriam dar aula pra nós” (Flora).

    A disciplina LAB II é de suma importância na grade curricular, pois proporciona aos acadêmicos um primeiro contato com alguns esportes que não tiveram oportunidade de vivenciar na escola. Portanto, se essa primeira experiência com os esportes e suas transformações não é proveitosa para os acadêmicos é porque existe de fato o descumprimento dos professores com o PPP.

4.     O jogo propriamente dito

4.1.     Primeiro tempo: O jogo de Handebol

    Os esportes tradicionais da Educação Física como o futebol, voleibol, basquetebol e handebol podem ser agrupados em uma única categoria como JEC’s. Segundo Bayer (apud DAOLIO, 2002, p. 99) “pelo fato de terem em comum seis invariantes: a bola, um espaço de jogo, parceiros com quais se joga, adversários, um alvo a atacar (e de forma complementar um alvo a defender) e regras específicas”.

    Ao interrogar sobre o entendimento dos acadêmicos sobre a maneira como seria trabalhado os esportes neste componente curricular atrelando o ensino dos quatro esportes hegemônicos da Educação Física e ainda estabelecendo relações com a transformação dos esportes. Eles relataram o seguinte:

    “O que dizia no PPP é que seriam trabalhados os esportes coletivos juntos, digamos que nos jogos coletivos a gente ia trabalhar vôlei, basquete, futebol, handebol, tudo junto, que eles (os professores) iam tentar fazer ligações com os esportes [...] foi uma coisa que não deu certo, a turma também reclamou bastante e os esportes acabaram sendo separadamente” (Brás).

    Flora comenta que “a forma como foi vista foi uma forma legal [...] cada semestre estudava sobre uma modalidade, só que em poucos momentos viu alguma coisa voltada pra escola, era mais tradicional, não se via atividades que chamasse os alunos a participar”.

    Nas falas analisadas pude constatar que os acadêmicos estavam cientes da proposta de ensino dos JEC’s. Contudo, a maneira como os professores iriam trabalhar essa inovadora proposta ainda parecia obscura. Isso gerou uma insegurança nos acadêmicos que pediram para que regressassem a forma de ensino, semelhante ao que ocorria no currículo anterior versão 1990, através de disciplinas separadas para cada esporte (UFSM, 1990). Então, teria uma disciplina só de handebol, basquetebol, voleibol e futebol.

    De acordo com o PPP do curso, o objetivo do JEC’s I é “caracterizar e compreender os princípios gerais da cultura do basquete, futebol, handebol e voleibol e suas transformações no contexto histórico” (UFSM, 2004).

    No entanto, ao descrever a vivência que tiveram nos JEC’s I difere da proposta apresentada, pois relata o seguinte: “não, porque no terceiro semestre teve apenas o handebol e pouca coisa foi evidenciada [da transformação do esporte]” (Brás). E ele comenta a respeito do andamento das “aulas de handebol da nossa turma especificamente não foram muito proveitosas, presenciais, teve alguma coisa mais técnico assim de arremesso, vivência de jogo, mas nada de [transformação]” (Brás).

    Capitu reitera a fala do Brás, ao afirmar que: “nos JEC’s I a ementa da disciplina seria para trabalhar todos os esportes juntos, só que não foi. Foi o handebol e as transformações no contexto histórico da cultura não”, além disso, explica que as aulas “ficaram aquela bagunça: quem dava aula pra gente, quem não dava” e que chegou a dar “brigas entre os professores” porque “nenhum queria dar [os esportes] daquele jeito”.

    Em oposição à idéia do PPP do curso, Flora deixa explicita em sua fala que “na ementa [da disciplina] acho que foi tudo modificado [...] só viu a modalidade de handebol.

    Flora comenta também que a metodologia adotada pelo professor era global “através do jogo mesmo, a cada momento o professor parava o jogo e falava o que estava acontecendo de certo, de errado, das posições, nesse sentido foi bem legal, aprender a partir do jogo, não ter fundamentos e depois o jogo, não desde o inicio foi a partir dos jogos”.

    O esporte incide uma influência tão grande nas aulas de Educação Física das escolas e sem qualquer possibilidade de crítica, que se dá o esporte na escola e não o esporte da escola. Ou seja, o esporte na escola é um prolongamento da instituição esportiva e se equivale ao esporte olímpico, regrado conforme essas instituições. Semelhantemente, se o professor na graduação não pode trabalhar os esportes da mesma forma como nas instituições esportivas, ao fazê-lo se exime da responsabilidade não trabalhando tal modalidade ou modifica a disciplina de acordo com sua vontade própria, descumprindo o PPP.

4.2.     Segundo tempo: O jogo de Basquete

    Na mesma leitura do PPP do curso o objetivo geral dos JEC’s II é “identificar, analisar e compreender a lógica técnica, composta de habilidades básicas e específicas que dão estruturação aos JEC’s como do basquete, futebol, handebol e voleibol e suas transformações no contexto histórico, assim como as possibilidades de emprego da técnica em situações de jogo” (UFSM, 2004).

    Os acadêmicos ao serem questionados se foram contemplados os objetivos do PPP enfatizando a transformação dos esportes, assim responderam:

    Brás comentou que “não, teve aula de basquete onde também tinha aula teórica [...], só que [...] apenas da técnica e da tática do esporte propriamente dito, a gente não entrou em questões, do basquete da escola, simplesmente praticou, fez prova prática e teórica, mas nada de transformações do esporte”.

    Capitu conta que “não, porque nos JEC’s II já estava separado por esporte [...] teve basquete, de forma tradicional [...] foi possibilitada a vivência sim, agora reflexão no processo da prática e das transformações não”. E ressalta em sua fala: “reflexão, parar e pensar, contextualizar para a realidade que poderia encontrar nas escolas em nenhum momento, pois lá cada um tinha sua bola, o professor deu aula bem tradicional, bem sistematizada” (Capitu).

    Os centros de Educação Física e Esportes têm conseguido construir instalações esportivas da melhor qualidade, como pistas de tartan para o atletismo ou piscina térmica para a natação, e que contradiz frontalmente a realidade escolar brasileira, especialmente a da escola pública (KUNZ, 2001 p. 83).

    No CEFD têm-se excelentes instalações esportivas, como ginásios didáticos, piscina térmica, pista, campo e ainda dispõem-se do material esportivo como bolas específicas para cada modalidade. Contudo, a realidade do curso se distancia cada vez mais da realidade que os acadêmicos encontram nas escolas, ora na maioria das vezes nem tabela de basquete a escola possui, então, seria certamente um deslumbramento pensar a realidade da escola pública dispondo de uma bola para cada aluno. E ainda mais utópico seria trabalhar as transformações dos esportes tendo esse tipo de vivência estritamente tradicional no curso de graduação.

    Flora afirma que “não” foi possibilitada a vivência e reflexão no processo da prática dos quatro esportes da Educação Física e suas transformações, pois “aconteceu uma só modalidade, que foi vista de forma bem tradicional, aprendendo fundamentos bem especificados, só ficou nessa parte de técnica e tática”.

    Nas falas dos acadêmicos fica evidente que o esporte é tratado também na universidade como um prolongamento da instituição esportiva, buscando ensiná-lo de maneira tradicional para os futuros professores repetirem essa prática sistematizada. Outro fato é que a universidade deveria ser um lugar para discussão, no qual são proporcionados aos acadêmicos momentos de reflexão, de debates sobre práticas diferenciadas e suas implicações efetivas na vida social dos educandos.

4.3.     Terceiro tempo: O jogo de Voleibol

    Nos JEC’s III, o objetivo geral é: “conhecer, analisar e compreender os princípios do ato tático no ensino do basquete, futebol, handebol e voleibol e suas transformações” (UFSM, 2004).

    Quando indagados sobre ter nos JEC’s III, a possibilidade de, conhecer, analisar e compreender os quatro esportes hegemônicos da Educação Física. Brás explica que: “Não, teve apenas a disciplina de voleibol, claro que já diferente dos JEC’s II teve alguma coisa mais relacionada à escola, muitas aulas era a gente mesmo que ministrava para os colegas, mas teve a vivência da brincadeira, dos jogos pré-desportivos[...]”.

    Concordando com Brás, Capitu conta que: “não foram trabalhados os princípios e conceitos do ato tático dos quatro esportes, porque teve só o vôlei”. Ao descrever o andamento das aulas de voleibol ela comenta sobre os princípios do ato tático e suas transformações: “tivemos sim alguma parte tática de vôlei com professor convidado, um técnico de vôlei aqui de Santa Maria (RS), com um professor [técnico] que não considerou a realidade que na escola se pudesse encontrar”. Ainda nos JEC’s III Capitu fala ainda que “teve os fundamentos, quem deu as aulas foram [...] os próprios acadêmicos, tanto que com a ajuda dos monitores, eles faziam a demonstração de como seria o gesto correto, correto não sei até que ponto se pode dizer”.

    Sobre a transformação do esporte a mesma acadêmica relatou que na disciplina teve “um trabalho de grupo, pensavam em alguma transformação do esporte porque tinha escola pobre, escola rica, com muitos recursos, sem recursos, alguma reflexão com a realidade” (Capitu).

    Remeto-me a FREIRE (2003, p. 22) quando diz que: “a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação teoria/prática sem a qual a teoria pode ir virando blablablá e a prática, ativismo”. Acredito que a universidade adote erroneamente, como uma das principais metas, “instrumentalizar" os professores para melhor atuarem nas escolas, contudo é uma incoerência deixar de refletir criticamente sobre as possíveis realidades encontradas, limitando as aulas ao ativismo. Creio que a transformação dos esportes utiliza-se de conhecimentos historicamente construídos contribuindo a serviço da formação de professores para futuras intervenções didático-pedagógicas em escolas.

    Dando seqüência a mesma linha de pensamento Flora assim afirma: “foram evidenciados só princípios e conceitos do voleibol, mas em alguns momentos teve um pouco dessa parte de transformação não visando a técnica [...] tradicional através de trabalhos, levar exercícios educativos, exercícios recreativos, que enfatizassem cada fundamento do vôlei”.

    Portanto, a transformação do esporte foi pouco evidenciada nas disciplinas do curso, porém deveria ser fortemente enfatizada uma vez que nas palavras de KUNZ (2001, p. 115) “cria mais espaço e auxilia a criança a reorganizar o desenvolvimento das subjetividades críticas e emancipadas que considera imperativo para a construção de uma nova sociedade”. A transformação do esporte faz a criança abstrair subjetivamente, pensar e resolver os possíveis problemas ajudando a criar alternativas para tratar com questões sociais, afetivas, cognitivas que possam ser futuramente encontradas, permitindo aos sujeitos serem críticos e emancipados.

4.4.     Quarto tempo: O jogo de Futebol

    De acordo com o PPP do curso a meta para os JEC’s IV é “desenvolver procedimentos didático-metodológicos para o ensino dos JEC’s no contexto escolar, bem como sistematizar o conhecimento destes, nos currículos de Educação Física Escolar” (UFSM, 2004).

    Contudo ao analisar as falas dos acadêmicos, posso afirmar que na prática não foi isso que aconteceu, levando em consideração a afirmação de Brás: “foi futsal e futebol, onde o primeiro teve com um professor de fora da universidade, que ele abordou bastante a prática. No futebol, [...] lembro de um trabalho sobre a tática, nada relacionado às transformações. Tivemos bastante enfoque das regras, teve aula de regras [...] provas de futsal [...] futebol”.

    Capitu conta que “o primeiro [professor de futsal] realmente pensou, considerou, sobre a parte técnica, sobre a parte tática e dava exemplos de atividades práticas que propunha pra gente pensar sobre as diferentes realidades e depois [...] fomos convidados a levar sugestões de atividades, eu acredito que pode ter estimulado a gente a pensar na transformação dos jogos coletivos, mas só do futsal”.

    “Na parte de futebol, [...] o professor deu fundamentos bem de forma tecnicista, fazia e repetia, fazia e repetia, pedia um trabalho que abordaria a parte tática, mas quem não tinha conhecimento baixou da internet, copiou dos livros, entregou e recebeu uma nota, não acredito que foi uma coisa boa para levar a gente a refletir sobre possíveis transformações ou realidade escolar” (Capitu).

    Utilizo-me das palavras de FREIRE (2003, p. 47), “ensinar não é transferir conhecimentos, mas criar possibilidades para a sua produção ou a sua construção”, para abordar as diferentes metodologias utilizadas por dois professores dos JEC’s IV. O professor de futsal estabelece um vínculo com a abordagem crítica, transformação dos esportes, no momento que considera a realidade da escola e prioriza os objetivos dos acadêmicos, cria possibilidades destes refletirem sobre a realidade e construírem respostas. Em contrapartida, o de futebol de campo usa a abordagem tradicional da Educação Física transferindo os conhecimentos para os acadêmicos, o professor age neste caso como instrutor, reduzindo seu papel ao de simples técnico do esporte.

    Flora descreve que “aconteceu só o ensino dos fundamentos e toda a parte de jogo do futsal e do futebol, e tanto em um como no outro aconteceram em alguns momentos essas transformações, porque não era tão técnico, tanta exigência do perfeito, acho que o professor conseguiu passar de uma forma não tão rígida”.

    Ao interpretar as falas das duas acadêmicas podemos denotar a diferença no entendimento destas sobre a transformação dos esportes. A primeira alia as transformações à realidade escolar, a não repetição do gesto técnico “perfeito”, contrapondo-se a idéia da segunda que restringe a abordagem crítica ao desenvolvimento de exercícios educativos para os alunos.

    Na aula dos JEC’s proposta por mim trabalhamos quatro tempos e uma modalidade esportiva respectivamente: o handebol, o voleibol, o basquetebol e o futebol de campo/futsal. Concluo que o esporte é tratado também na universidade como um prolongamento da instituição esportiva, buscando ensiná-lo de maneira tradicional para os futuros professores repetirem essa prática sistematizada. Através da mídia, o esporte incide uma influência tão grande nas aulas de Educação Física das escolas e sem qualquer possibilidade de crítica, que se dá o esporte na escola e não o esporte da escola. A transformação dos esportes, no momento que considera a realidade da escola e prioriza os objetivos dos acadêmicos, cria possibilidades destes refletirem sobre a realidade e construírem alternativas para tratar com questões sociais, afetivas, cognitivas que possam ser futuramente encontradas, permitindo aos sujeitos serem críticos e emancipados. Eis o assunto que vou deter-me nesta próxima fase.

5.     Transformação dos esportes: uma possibilidade na universidade e na escola

    As transformações dos esportes são possíveis de se fazer no curso de formação inicial, além disso, diria que essenciais ao contexto sócio-educacional da Educação Física na escola e ao mundo vivido pelas crianças na qual essa prática pedagógica se materializa.

    A formação inicial é colocada por Marcelo Garcia (1999, p. 25), como sendo a fase de “preparação formal numa instituição específica, na qual o futuro professor adquire conhecimentos pedagógicos e de disciplinas acadêmicas, assim como realiza as práticas de ensino”. Entendo também que para o desenvolvimento da prática pedagógica, os professores necessitam ‘mobilizar saberes’, conforme se refere Tardif (2002), adquiridos durante a trajetória docente.

    Nesse sentido remeto-me a KUNZ (2001, p. 121), que afirma:

    O ensino na concepção Crítico Emancipatória deve ser um ensino de libertação, de falsas ilusões, de falsos interesses e desejos, criados e construídos nos alunos pela visão de mundo que apresentam a partir de conhecimentos colocados à disposição pelo contexto sociocultural onde vivem.

    Ao finalizar a entrevista, questionei os acadêmicos sobre a importância que atribuem de trabalhar com a transformação dos esportes no curso de licenciatura plena em Educação Física, com isso obtive as seguintes respostas:

    Brás diz que “seria muito interessante, só que os professores não tentam se adequar à metodologia do ensino dos esportes relacionada à licenciatura, [...] também vejo que muitas aulas tanto do bacharelado quanto da licenciatura são muito parecidas, os professores não tiveram essa mudança, de trabalhar a transformação do esporte, numa concepção diferente. [...] Eles nem leram o PPP de um e de outro, eles não sabem a diferença, [...], não entendem, não se preocupam com essa diferença”.

    Concordo com Brás seria primordial essa mudança de enfoque, porque a mudança na legislação, fez com que o CEFD criasse dois cursos distintos, bacharelado e licenciatura. Contudo, a criação desses dois cursos com diferentes PPP, não foi suficiente para que os professores mudassem o enfoque aos esportes, atividade considerada fundamental nas aulas de Educação Física, com isso os JEC’s do CEFD, continuam sendo trabalhados da mesma maneira.

    Capitu diz que “é fundamental, só que vai dos professores estarem propostos, é a parte fundamental da disciplina [...] pra quem vai trabalhar em escola. E cita um exemplo utilizando os JEC’s III, “com a aula de basquete da faculdade, uma escolinha eu treino, [...] agora pra trabalhar com a Educação Física escolar tem que ser a parte de transformações, porque não adianta tu chegar lá com uma proposta pronta querer adaptar os teus alunos á realidade da escola, material, social e também toda a parte cultural deles com os esportes” (Capitu).

    Capitu conta ainda que: “a idéia de Educação Física escolar de verdade é, instituir na tua prática esportiva algo que tu aplique na vida, não só parte esportiva, conceitos, de não sobrepujar o adversário[...]. Respeitar o outro embora naquele momento tu tenha um objetivo contrário ao dele. Eu gostaria que fosse assim, considerando as transformações do esporte, mas não é porque é uma coisa difícil de ser feita”.

    A abordagem Crítico Emancipatória da Educação Física tem um caráter progressista e depara-se com vários desafios como questões relativas à sua implementação prática, ou seja, de como fazer com que sejam incorporadas pela prática pedagógica nas escolas, ademais se refere a questões mais teóricas no que concerne às suas bases epistemológicas.

    Flora faz uma consideração ao tema ao comentar sobre a “importância desde a nossa formação [inicial]” enquanto elemento chave para a transformação do ensino dos esportes nas escolas, onde faz também a denúncia de que a “escola é tradicional como antigamente acontecia [...] mas ela está mudando, já tem professores que estão com esta visão modificada”.

    A própria constituição de um PPP embasado na transformação dos esportes é uma prova cabal de que o ensino está mudando, lamento por ser apenas teoricamente. Todavia, o PPP não seja devidamente cumprido, já aponta caminhos diferentes para os acadêmicos do CEFD refletirem sua prática pedagógica e futuramente, atuar nas escolas de forma a proporcionar aos sujeitos desenvolver o senso crítico e tornarem-se emancipados.

    A concepção critico-emancipatória utiliza-se de algumas estratégias didáticas para os professores como buscar: “transcender limites”, oferece aos alunos manipular objetos, vivenciar possibilidades comunicativas, experimentar relações sócio-emocionais novas; apresentar verbalmente situações de movimentos do jogo que o aluno terá que refletir para propor soluções; a partir da transcendência de limites possibilitar ao aluno criar/inventar jogos com um sentido/significado para determinada cultura.

    Essa transformação didático-pedagógica do esporte objetiva que os alunos descubram pela própria manipulação dos implementos os meios para experiências bem sucedidas nos jogos, outro fator importante é que capacita as crianças a manifestar verbalmente ou através de encenações o que aprenderam aos colegas, além disso, proporciona a criança o desenvolvimento de um senso crítico, ao passo que questiona sobre a importância de determinado conteúdo para a cultura.

6.     Ponto de chegada

    Pela análise das informações obtidas os entrevistados, antes de ingressarem no curso de formação inicial, não tinham entendimento sobre a transformação dos esportes. A reformulação do PPP do curso de licenciatura plena em Educação Física baseia-se em aspetos legais que exigem a reestruturação curricular. Os objetivos dos componentes curriculares analisados LAB II, JEC’s I, JEC’s II, JEC’s III e JEC’s IV estam permeados por questões referentes à transformação dos esportes.

    Constatei que no LAB II não foram enfatizadas as transformações do esporte, o que ocorreu foram três aulas de cada modalidade esportiva realizada de forma tradicional. Há, assim uma contradição com o que estava proposto no PPP do curso de licenciatura plena em Educação Física.

    Nos JEC’s I, similarmente ao que ocorreu no LAB II, os professores não comtemplaram o PPP do curso que deveria ter caracterizado e compreendido os princípios gerais da cultura do basquete, futebol, handebol e voleibol e suas transformações no contexto histórico. Nas aulas práticas ocorreu apenas a modalidade de handebol e as transformações não foram enfatizadas.

    Nos JEC’s II, parte do objetivo foi atingido, pois foi possível compreender a lógica da técnica, composta de habilidades básicas e específicas, porém apenas na modalidade de basquetebol. Contudo, as transformações no contexto histórico dos quatro esportes não foram destacadas mostrando o descomprometimento tanto dos acadêmicos quanto dos professores com o PPP.

    Nos JEC’s III, os esportes eram ensinados separadamente, foi possibilitado conhecer os fundamentos e compreender os princípios do ato tático, somente do voleibol. As transformações foram pouco evidenciadas, através de trabalho que remetiam a diferentes realidades escolares que pudessem ser futuramente encontradas pelos acadêmicos.

    Nos JEC’s IV, o objetivo era desenvolver procedimentos didático-metodológicos para o ensino dos JEC’s no contexto escolar, bem como sistematizar o conhecimento destes, nos currículos de Educação Física Escolar. Todavia, o que aconteceu foi o ensino apenas das modalidades de futebol de campo e futsal, nas quais os acadêmicos puderam vivenciar o ensino de duas metodologias contrastantes. O primeiro professor enfatizava as transformações para o ensino do futsal, considerando a realidade escolar e os objetivos dos alunos. O segundo utilizava a metodologia tradicional, ressaltando a repetição dos fundamentos técnicos do futebol de campo.

    O esporte é meio de manifestação cultural, consolidado nas aulas de Educação Física das escolas por estar vinculado principalmente à promoção da saúde. Na prática não é isso que ocorre porque da forma como está instituido nas escolas não apresenta elementos nem para a formação geral dos educandos.

    A transformação dos esportes está centrada no aluno e no ensino escolar, não suscita nas crianças experiências de fracasso, com isso colabora na busca pela autonomia. Contudo, percebo que os professores do CEFD não percebem a importância dessas análises na universidade relegando aos educando mudanças reais no ensino, que se consolida dia após dia nas escolas de maneira tradicional.

    Essas transformações também priorizam o significado do “se movimentar” de cada esporte, bem como a possibilidade de “transcender limites” que provocam nos educandos descobrir meios para a participação bem sucedida contribuindo para o desenvolvimento da autonomia. Outro fator é que proporciona questionar os professores a respeito dos conteúdos trabalhados para determinadas culturas e melhorias da capacidade de se expressarem colaborando, assim para a construção de sujeitos críticos e emancipados.

    Creio que o curso de formação inical seja crucial para atuações dos futuros professores que estarão paulatinamente se inserindo nas escolas. As transformações dos esportes tem muito a contribuir com a nossa formação, é certamente uma possibilidade muito rica na universidade e, para tanto, na escola.

    Acredito que a concepção Crítico Emancipatória, na perspectiva de ensino progressista, proporciona, inclusive, um direcionamento para as relações sociais, econômicas, políticas e culturais colaborando, assim na construção de sujeitos críticos e reflexivos na escola para tornarem-se, futuramente, autônomos e emancipados no contexto sócio-cultural onde vivem.

    Acredito, como futura educadora, que meu trabalho tenha colaborado com o CEFD/UFSM, no momento em que faço uma crítica construtiva às irregularidades no curso de formação inicial, que certamente se estenderão as escolas através dos acadêmicos que vivenciaram o PPP. Creio, que se existe o PPP para o curso de licenciatura plena em Educação Física, que está embasado teoricamente, aos acadêmicos cabe a cobrança da implantação e aos professores cumprirem a proposta sem negligenciar os conhecimentos, mantendo um comprometimento consigo, com a instituição UFSM e com os acadêmicos, que são o principal elo entre a universidade e a escola, pois o começo da docência se aproxima e a vinculação entre o tradicional e a transformação do ensino gera conflitos na manutenção ou mudança do ensino para a sociedade, enquanto projeto. O ensino dos esportes se reproduzirá para os acadêmicos que vivenciarão a mesma proposta ensinada/aprendida na universidade. Então, para os futuros professores restará a formação continuada?

    Considero a conclusão deste trabalho muito importante para minha formação enquanto acadêmica do curso de licenciatura plena em Educação Física, pois escrever sobre os JEC’s foi a melhor maneira que encontrei de relatar e analisar situações vivenciadas por acadêmicos, como eu, do CEFD. Além disso, penso que ao escrever reflito sobre o tema e angario argumentos convincentes, sobre a transformação dos esportes, para reivindicar mudanças efetivas no campo da Educação/Educação Física.

Referências

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  • TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA (Brasil). Projeto Político Pedagógico do Curso de Educação Física Licenciatura Plena: implementado no ano de 1990. Santa Maria: Imprensa Universitária, 1990.

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA (Brasil). Projeto Político Pedagógico do Curso de Educação Física Licenciatura Plena: implementado no ano de 2005. Santa Maria: Imprensa Universitária, 2004.

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revista digital · Año 14 · N° 134 | Buenos Aires, Julio de 2009  
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