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A imprensa escrita e o desporto: o género em questão

 

Licenciada em Educação Física e Desporto no Instituto Superior da Maia

Especialização em Desporto para Crianças e Jovens, Faculdade de Desporto da Universidade do Porto (FADEUP)

Marta Isabel do Nascimento Gonçalves Coimbra

martaisabelcoimbra@hotmail.com

(Portugal)

 

 

 

Resumo 
          O trabalho que se apresenta, tem como objectivo estudar a cobertura (em artigos e fotografias) efectuada ao género feminino e masculino, nas diferentes modalidades, em jornais desportivos nacionais. Desta forma, procedeu-se à realização de seis entrevistas semi-rígidas aos editores desportivos das secções de modalidades e de fotografia de um conjunto de jornais desportivos. Posteriormente, procedeu-se à transcrição e análise das entrevistas. Foi efectuada uma análise de conteúdo de carácter exploratório.

          Os grandes temas encontrados foram: 1) Modalidades tradicionalmente consideradas como femininas e/ou masculinas e sua selecção por parte dos editores; 2) Comparação da cobertura efectuada ao desporto feminino e masculino (artigos e fotografias).  

No que respeita à secção de modalidades, a selecção das mesmas é realizada maioritariamente, para não dizer exclusivamente, em função do género masculino, relegando para um plano inferior o género feminino.

          Relativamente à secção de fotografias, verificamos que em todas as secções dos jornais em questão, só é possível encontrar fotografias referentes ao género feminino, e apenas na secção de modalidades, nomeadamente nas modalidades de Atletismo (por exemplo: salto em comprimento), Voleibol e Ténis.
          Unitermos: Mass Media. Género. Desporto feminino.

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 122 - Julio de 2008

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Introdução

    Uma das grandes temáticas de exame e investigação sobre o género feminino no universo desportivo tem consistido no trato que os media têm feito do mesmo (Theberge e Cronk, 1994). Apesar de existir uma maior participação do género feminino no mundo desportivo, observável por exemplo no número de mulheres participantes nos Jogos Olímpicos da Era Moderna (4.329 atletas nos Jogos Olímpicos de Atenas em 2004, comparativamente com as 290 atletas nos Jogos Olímpicos de Amesterdão em 1928), tem havido pouco crescimento quer na quantidade, quer na qualidade de cobertura do género feminino nos media de desporto (Theberge e Cronk, 1994). Tendo em conta uma visão feminista, o desporto tem sido encarado como uma fundação sexista, monopolizada pelo género masculino e conduzida masculinamente (Bernstein, 2002; Pedersen, 2002; Vincent et al., 2004). No entanto, e segundo os mesmos autores, o género feminino tem conseguido de uma forma real progredir no desporto de alta competição. No campo das mudanças na cobertura do desporto feminino, com efeito, o género feminino tem ganho algum espaço no que concerne à exposição nos media, mais especificamente em grandes eventos desportivos. Também Crossman, Hyslop e Guthrie (1994), Bernstein (2002) e Vincent et al (2004), referem nos seus estudos, que a cobertura realizada pelos media ao género feminino tornou-se significativa apenas quando relacionada com os desportos de elevada competição. No entanto, é muito precoce ainda afirmar que a igualdade de cobertura de géneros por parte dos Mass Media está assegurada (Bernstein, 2002; Pedersen, 2002; Vincent et al., 2004). Tal pode ser verificado através da observação da cobertura efectuada às atletas Marion Jones e Anna Kournikova (Bernstein, 2002). Numa exposição escrita sobre este tema Rintala e Birrell (1984 cit in Theberge e Cronk, 1994), calculam que a cobertura do desporto feminino em jornais se situe nos 15% de todos os artigos. Os algarismos para revistas são ainda mais baixos: 10% (Theberge e Cronk, 1994). Para além disto, Boutilier e SanGiovanni (1983 cit in Theberge e Cronk, 1994), alegam que, a questão é mais ampla do que uma figuração numérica inferior. Quer na quantidade de cobertura do desporto feminino, quer na qualidade da mesma, os media de desporto associam-se em conjunto a uma “extinção emblemática” das mulheres (Gerbner, 1978 cit in Theberge e Cronk, 1994). Quer banalizando o desporto feminino, evidenciando-se tais acontecimentos como a “Guerra dos Sexos”, quer pondo em foco as características das atletas (Theberge e Cronk, 1994). Deste modo, os media continuam a reflectir uma noção do desporto como um universo de homens, no qual, se participarem mulheres, estas desempenham o papel de sujeitos desconhecidos (Theberge e Cronk, 1994).

    Os media estabelecem uma fundação influente visto que não revelam claramente, mas reproduzem de facto sensações e procedimentos, por isso o seu tratamento das mulheres é importante para o combate pela evolução das mulheres no desporto (Theberge e Cronk, 1994). Como Rintala e Birrell (1984 cit in Theberge e Cronk, 1994) criticam, uma preponderância essencial dos media pode ser a de exibir informação a jovens raparigas acerca de atletas modelo, influenciando as suas opiniões sobre o mérito e benefícios do desporto e da actividade física. Também, de modo genérico, o choque dos media pode alargar-se ao amplo leque das ligações sociais (Theberge e Cronk, 1994). Embora os resultados conseguidos pelas mulheres em determinados ramos da nossa sociedade seja evidente, várias sociedades continuam a ser severamente estratificadas pelo género (Theberge e Cronk, 1994). Diversos autores (Willis, 1982; Lenskyj, 1984; Boutilier e SanGiovanni, 1983) citados por Theberge e Cronk (1994) têm recentemente redigido acerca do contributo ideológico do desporto para conservar esta falta de igualdade no que concerne à cobertura do género feminino. A pequena representação do género feminino no universo desportivo e a exoneração e banalização da sua participação desportiva, proporciona uma base sólida à ideia da passividade e fragilidade femininas, que lhe estão normalmente associadas (Theberge e Cronk, 1994). Esta ideia baseia-se em barreiras que se colocam à participação das mulheres em ocupações tradicionalmente masculinas, porventura mais decisivamente, em actividades tradicionalmente desempenhadas exclusivamente pelo género masculino (Theberge e Cronk, 1994). A ideia da fragilidade do género feminino proporciona uma razão ideológica para a permanente exclusão do género feminino de actividades fisicamente árduas e difíceis (Theberge, 1985 cit in Theberge e Cronk, 1994).

    Uma alteração expressiva na cobertura do desporto feminino poderia provocar um choque frontal à ideia da fragilidade feminina (Theberge e Cronk, 1994). Através da cobertura realizada nos Jogos Olímpicos de 1984, tornou-se perfeitamente visível que a cobertura desportiva dos media propicia uma marca dramática e consideravelmente publicitada dos atributos físicos das mulheres (Theberge e Cronk, 1994). No contexto real, a maioria desta cobertura não é progressiva: o acto de fixar dos media na ginástica feminina e em ginastas individuais, nomeadamente, intensifica e reforça os conceitos tradicionais criados em torno do procedimento feminino ajustado no mundo desportivo, não permitindo deste modo que possamos quebrar e eliminar definitivamente noções pré-concebidas acerca do género feminino (Theberge e Cronk, 1994).

    Dentro das justificações para a posição subalterna do desporto feminino nos media, porventura a mais vulgarmente nomeada é o âmbito do emprego de jornalismo, particularmente jornalismo desportivo, por homens (Theberge e Cronk, 1994). Anderson (1984 cit in Theberge e Cronk, 1994) reconheceu que num padrão imprevisto de editores de jornais desportivos, 2% eram mulheres. No seu debate acerca do trato do género feminino nos mass media, Boutilier e SanGiovanni (1983 cit in Theberge e Cronk, 1994) enfatizam a influência do aumento da quantidade de jornalistas mulheres nas secções de desporto dos jornais. Contudo, Boutilier e SanGiovanni (1983 cit in Theberge e Cronk, 1994) chamam a atenção para que o simples facto de trazer mais jornalistas mulheres para o contexto jornalístico desportivo não constitui uma resposta necessária para combater a monopolização do género masculino nas secções de desporto dos jornais (Theberge e Cronk, 1994). Boutilier e SanGiovanni (1983 cit in Theberge e Cronk, 1994:290-291) alegam,

    Importa bastante se a redactora desportiva é uma feminista... Para muitas feministas, meramente aumentar o número de mulheres que partilham as mesmas orientações e assumpções sexistas que os seus colegas homens é menos que uma magra vitória. É um exemplo perigoso de opção mútua institucional em que as mulheres se tornam cúmplices passivas da propagação da ideologia sexista no desporto.

    Um segundo centro de justificações está relacionado com os motivos do mercado que demarcam o âmbito da cobertura nos media desportivos (Theberge e Cronk, 1994). A doutrina filosófica dominadora no jornalismo centra-se, na sua grande maioria, na noção de que os media têm o dever de cobrir os acontecimentos e matérias que seduzem o maior número de pessoas possível (Theberge e Cronk, 1994). Na América do Norte esta doutrina filosófica escassamente abrange o desporto feminino (Theberge e Cronk, 1994). Anderson (1984 cit in Theberge e Cronk, 1994:291) refere o que um editor desportivo afirma acerca deste assunto:

    Ao decidir quanto espaço se deve dedicar a um tópico e quando cobrir um evento, os editores precisam de analisar cuidadosamente o número de leitores que realmente querem saber dele. Infelizmente, isto significa ainda menos cobertura de desportos menores e do desporto feminino.

    Como Rintala e Birrell (1984 cit in Theberge e Cronk, 1994) reparam, a cobertura do género feminino em secções desportivas dos jornais assenta entre a obrigação social e a racionabilidade económica.

    Confrontadas com as coacções de marketing, estão as coacções ocupacionais. Isto é, os media estão demarcados no grande número de área ou tempo que têm para a cobertura e no conjunto dos indivíduos que possuem para eliminar a responsabilidade do jornalismo (Theberge e Cronk, 1994). Da mesma maneira, eles alegam, terem de cobrir as temáticas que na actualidade ocupam as preocupações e os interesses do leitor comum (Theberge e Cronk, 1994).

    O presente trabalho teve como objectivo principal compreender o modo como os artigos e as fotografias de atletas de ambos os géneros são seleccionados. Mais concretamente, tentar perceber se esta selecção é influenciada pelo género dos (as) atletas.

Metodologia

Instrumentos utilizados

    O instrumento utilizado na realização deste trabalho, foi a entrevista, que serviu como fonte única e exclusiva para a obtenção de toda a informação que achamos de maior relevância para a consecução desta pesquisa. Segundo Bingham e Moore (1954), citados por Ghiglione e Matalon (2001), a entrevista reside num diálogo com um fim específico a atingir. No que concerne ao tipo de entrevista utilizada, esta designa-se de semi-rígida, uma vez que se caracteriza por o entrevistador conhecer as temáticas acerca das quais tem intenções de recolher um conjunto de informações por parte do indivíduo inquirido. Contudo a ordem e a maneira como essas temáticas irão ser abordadas, passam antes de mais pelos critérios definidos pelo entrevistador (Ghiglione e Matalon, 2001). No que concerne às entrevistas, estas têm como função obter informações sobre aspectos do fenómeno em análise (Quivy e Campenhoudt, 1992).

Procedimentos utilizados

    Para a realização das seis entrevistas efectuadas os procedimentos foram os seguintes: inicialmente efectuou-se um contacto telefónico com o primeiro entrevistado, que de imediato se mostrou receptivo à marcação da entrevista em lugar próprio e hora marcada. Aquando da entrevista, averiguamos acerca da possibilidade de este nos facultar os contactos de outros jornalistas desportivos. Todos os restantes entrevistados foram inicialmente contactados telefonicamente. Todos eles se mostraram disponíveis para a marcação das entrevistas, as quais foram marcadas de acordo com a disponibilidade de ambas as partes. Após obtida a autorização dos inquiridos para a gravação das entrevistas, estas foram gravadas com um gravador de cassetes. Posteriormente, as mesmas foram ouvidas e transcritas na íntegra, e sujeitas a uma análise de conteúdo. A análise efectuada foi de carácter exploratório. As categorias de análise baseadas em temas foram definidas à posteriori, dado que elas foram surgindo à medida que se foram analisando as entrevistas.

    Os grandes temas encontrados foram: 

  1. Modalidades tradicionalmente consideradas como femininas e/ou masculinas e sua selecção por parte dos editores; 

  2. Comparação da cobertura efectuada ao desporto feminino e masculino (artigos e fotografias).

Caracterização dos entrevistados

    No que diz respeito ao leque de entrevistados, todos eles pertencentes ao género masculino, podemos referir que se trata de um grupo de pessoas com funções muito distintas dentro da organização de um jornal. Assim, o primeiro entrevistado (a finalizar o curso de Jornalismo), estava responsável por toda a Secção do Desporto de um Jornal Regional; o segundo entrevistado era colaborador (jornalista em regime livre) na Secção Nacional de um Jornal Desportivo Nacional; o terceiro entrevistado desempenhava a função de editor da Secção de Modalidades de um Jornal Desportivo Nacional; o quarto entrevistado assumia o cargo de editor da Secção de Fotografias de um Jornal Desportivo Nacional; o quinto entrevistado tinha a responsabilidade de editor da Secção de Fotografias de um Jornal Desportivo Nacional e por último o sexto entrevistado desempenhava o cargo de editor da secção de Fotografias de um Jornal Desportivo Nacional.

Apresentação e discussão dos resultados

Modalidades tradicionalmente consideradas como femininas e/ou masculinas e sua selecção por parte dos editores

    Relativamente à influência do género na selecção das modalidades por parte dos editores, a questão que aqui se colocou é se os editores seleccionam o mesmo número de modalidades e o mesmo número de notícias, para o género masculino e género feminino, respectivamente? A resposta a esta questão por parte de um dos editores desportivos, consistiu num não claríssimo. Como tal, verificou-se que a selecção das modalidades é realizada maioritariamente, para não dizer exclusivamente, em função do género masculino, relegando para um plano inferior o género feminino. Tais resultados estão em concordância com estudos realizados em outros países (Crossman, Hyslop, Guthrie, 1994; Kane, 1989 cit in Crossman, Hyslop e Guthrie, 1994; McGregor, 1989 cit in Crossman, Hyslop e Guthrie, 1994; Mckay e Rowe, 1987 cit in Crossman, Hyslop e Guthrie, 1994) onde é referido que o desporto “tido” como masculino, ou melhor dizendo os atletas masculinos tendem a receber maior cobertura da imprensa escrita (jornais e revistas desportivas) do que as atletas femininas. Desta forma, torna-se crucial colocar a seguinte questão: Porque é que o desporto tradicionalmente rotulado como feminino, ou seja, as atletas femininas tendem a receber uma menor cobertura por parte da imprensa escrita (jornais e revistas desportivos), comparativamente aos atletas masculinos? Deste modo, e após a análise de um conjunto de entrevistas realizadas a uma série de editores desportivos, torna-se importante apresentar o ponto de vista de um dos editores sobre o não seleccionar o mesmo número de modalidades e o mesmo número de notícias, para o género masculino e género feminino. Para este existem algumas condicionantes que conduzem a este estado de coisas: - a primeira condicionante apontada é o mercado, referindo-se aos leitores e realçando o facto que qualquer jornal desportivo diário é comprado maioritariamente por homens, como podemos ver através das seguintes palavras:

    Porque é assim, ah, o mercado tem a ver, o mercado no fundo, acaba por nos condicionar, eu quando digo o mercado, ah, refiro-me aos leitores, obviamente que, que qualquer jornal desportivo diário é comprado maioritariamente por homens, não é? Logo, nós damos, seja em relação ao Basket, seja em relação ao Andebol, seja em relação ao Voleibol, um campeonato feminino, mas damos maior destaque ao masculino. (E1)

    Tal afirmação está de acordo com o que é referido por Theberge e Cronk (1994), que mencionam que a monopolização do género masculino nas secções de desporto dos jornais está relacionada com os motivos do mercado.

    A segunda condicionante apresentada consiste na afirmação de que existe no nosso país uma tradição maior por parte do género masculino não só em termos de leitura dos jornais desportivos e revistas desportivas, como das próprias pessoas que vão aos pavilhões ver os jogos (por exemplo: os jogos de equipas masculinas têm maior número de espectadores que os jogos femininos), como é visível mediante o seguinte excerto:

    Porque há também uma tradição maior a esse nível, não só em termos de leitura, como das próprias pessoas que vão aos pavilhões ver os jogos.

    Nós se formos a avaliar os jogos de masculinos, têm maior número de espectadores que o feminino. (E2)

    Mais uma vez o que aqui é referido está de acordo com o que é apontado por Crossman, Hyslop e Guthrie (1994). Segundo estes autores, os jornalistas que modelizam e fazem imperar a burocracia na realização do jornal, habitualmente deduzem que o público na sua globalidade tem uma maior empatia para com o desporto masculino. Este mesmo facto é também apresentado por Anderson (1984 cit in Theberge e Cronk, 1994, 291), o qual refere:

    Ao decidir [em] quanto espaço se deve dedicar a um tópico e quando cobrir um evento, os editores precisam de analisar cuidadosamente o número de leitores que realmente querem saber dele. Infelizmente, isto significa ainda menos cobertura de desportos menores e do desporto feminino”.

    Quanto à terceira condicionante exposta, tem a ver com o fenómeno de arrastamento, em termos de transmissões televisivas (por exemplo: provas dos campeonatos nacionais), alegando que existe um défice entre as transmissões dos jogos masculinos e femininos, como se pode ver através do seguinte excerto:

    Depois há todo o fenómeno de arrastamento; em termos de transmissões televisivas, de provas dos campeonatos nacionais, ah, digamos que há um défice entre as transmissões dos jogos masculinos e femininos. (E3)

    Como quarta condicionante, temos a confirmação de que existe de facto uma visão diferente, em termos de espaço, como também há um destaque maior para o género masculino, como se pode constatar com base no seguinte excerto:

    Portanto, não vamos dizer que logo à partida estamos a diferenciar, mas de facto há, pronto, há uma visão diferente, em termos de espaço e há um destaque maior para o masculino. (E4)

    Os dados encontrados estão mais uma vez em concordância com os resultados encontrados em outros estudos (Rintala e Birrell, 1984; Boutilier e SanGiovanni, 1983; Gerbner, 1978) citados por Theberge e Cronk (1994). Todos estes estudos indicam existir uma menor cobertura do desporto feminino em relação ao desporto masculino.

    Os media continuam, então, a reflectir uma noção do desporto como um universo de homens, no qual, se participarem mulheres, estas desempenham o papel de sujeitos desconhecidos (Theberge e Cronk, 1994).

    Como quinta condicionante, é afirmado que não existe uma guerra de sexos, mas que está relacionado com o mercado em si, como é possível constatar pelo presente excerto:

    Não é uma guerra de sexos, não tem nada a ver, mas tem a ver com o mercado em si. (E5)

Importância da quantidade de género feminino (> 50%) da população total portuguesa, na escolha das modalidades por parte dos editores

    No que concerne à preponderância da quantidade de mulheres existente na nossa sociedade, em termos gerais, neste momento existem dados estatísticos que apontam que a população portuguesa é constituída maioritariamente pelo género feminino (> 50%). Neste sentido interessou colocar a seguinte questão aos editores desportivos da secção de modalidades: Porque é que não perguntam às mulheres, que tipo de modalidades é que querem ver desenvolvidas nos jornais desportivos e de que maneira? A resposta para a questão colocada apresentou a seguinte justificação: porque provavelmente as mulheres nunca foram, a grande massa leitora de jornais desportivos. Isto encontra-se em concordância com o estudo de Theberge e Cronk (1994), que nos diz que os media estabelecem uma fundação influente visto que não revelam claramente, mas reproduzem de facto sensações e procedimentos. Desta maneira, e segundo os mesmos autores, o seu tratamento das mulheres é fundamental para o combate mais dilatado pela evolução das mesmas no contexto desportivo.

Comparação da cobertura efectuada ao desporto feminino e masculino

Artigos

    No que diz respeito a esta temática, a questão que aqui importou colocar consistiu na seguinte: A quantidade de artigos desportivos sobre o género masculino é superior, em qualquer uma das modalidades existentes, comparativamente ao género feminino, na secção de modalidades? A resposta obtida a esta questão foi um “sim” absoluto e sintético. Desta forma, torna-se importante apresentar um estudo de Bernstein (2002), que levando em consideração a análise a alterações que verdadeiramente tiveram lugar, este campo reflecte que o género feminino tem ganho algum espaço no que concerne à exposição nos media, mais especificamente em grandes eventos desportivos. No entanto, é muito precoce ainda afirmar que a igualdade de cobertura de géneros por parte dos Mass Media está assegurada, vindo deste modo ao encontro da nossa linha orientadora. Também outro estudo de Bernstein (2002), que se centrou em estudos realizados no final da década de 1990, analisou particularmente a cobertura dos media atribuída às atletas Marion Jones e Anna Kournikova. Também neste estudo se tornou evidente que o tipo de cobertura dado às atletas femininas está longe da cobertura igualitária que se pretende alcançar entre os dois géneros, o que se coaduna com a nossa realidade. Consequentemente, a resposta dada por um dos editores desportivos entrevistados, foi sustentada através do seguinte raciocínio: na secção das modalidades, existe uma predominância dos homens, porque os campeonatos têm outra dimensão, em termos de profissionalismo, nomeadamente nas modalidades de Basquetebol, de Hóquei e de Andebol, onde existem ligas profissionais. Este raciocínio, é perceptível pelo excerto seguinte:

    Mas, se formos para as modalidades, haverá uma predominância dos homens, mas também porque os campeonatos têm outra dimensão, em termos de profissionalismo, basta vermos o Basket, o Hóquei, o Andebol, há ligas profissionais, não sei se sabe, a Liga de Basquetebol é profissional, a feminina não é. Como não é no Andebol, é evidente que também há profissionalismo no Hóquei feminino, no Andebol, só que não está institucionalizado, enquanto que no Basket e no Andebol está por exemplo. (E6)

    Neste contexto, a situação por nós encontrada é similar à apresentada no estudo de Crossman, Hyslop, Guthrie, (1994), onde se refere que o espaço de desporto profissional realizado pelo género masculino é superior, comparativamente com o género feminino (daí, a quantidade de área indispensável). Em termos de síntese, podemos concluir que é o factor institucionalização das modalidades, que condiciona a predominância de artigos sobre o género masculino, nas páginas da secção de modalidades dos jornais desportivos.

Fotografias

    No que concerne ao género, podemos verificar que analisando todas as secções dos jornais em questão, só é possível encontrar fotografias referentes ao género feminino, apenas na secção de modalidades, nomeadamente nas modalidades de Atletismo (por exemplo: salto em comprimento), Voleibol e Ténis, como é possível comprovar pelo excerto de uma das entrevistas realizadas:

    Ah. Não. Nós temos. Não. Está-se a referir a imagens de mulheres? Há, há, há. Mais nas modalidades. Nas modalidades há o atletismo, há o salto em comprimento, há o voleibol, há o ténis. (E7)

    Também tendo em conta outra declaração do mesmo editor fotográfico, torna-se visível o mesmo pensamento, como se constata pelo excerto apresentado:

    Normalmente, o futebol feminino cá em Portugal não tem muita expressão. E com os jornais... Como os jornais desportivos... (E8)

    Ainda relativamente à primeira página dos jornais analisados, verificou-se que o género feminino só tem direito a aparecer na primeira página, apenas quando uma das atletas consegue alcançar um feito muito importante, nomeadamente conseguir uma medalha olímpica (por exemplo: nos jogos olímpicos ou nos campeonatos do mundo de Atletismo), conforme é referido por um editores fotográficos entrevistados:

    Não, não, não, nada. Nada. Não. Não. Nada. Não tem nada a ver com isso. Olhe, por exemplo, nós, lembro-me duma, duma primeira página que fizemos que foi com a, com a Fernanda Ribeiro, que foi com a Fernanda Ribeiro quando ganhou a medalha olímpica, foi a primeira página toda da Fernanda Ribeiro. (E9)

    O mesmo editor fotográfico refere ainda:

    Pronto, mas raramente, mas raramente, mas raramente. Só nos Jogos Olímpicos, só nos campeonatos do Mundo, de Atletismo, quando algumas das atletas se destacam é que normalmente vem para a primeira página. Porque não vende. E hoje em dia, cada vez mais os jornais, ah, pretendem cada vez mais vender mais e procuram aquilo que o público normalmente gosta. (E10)

Conclusões

    Analisando particularmente a secção de modalidades, verificou-se que a selecção das modalidades é realizada maioritariamente, para não dizer exclusivamente, em função do género masculino, relegando para um plano inferior o género feminino.

    Na secção de modalidades, podemos concluir que é o factor institucionalização das modalidades, que condiciona a predominância de artigos sobre o género masculino, nas páginas da secção de modalidades dos jornais desportivos. No campo da secção de fotografias, podemos verificar que analisando todas as secções dos jornais em questão, só é possível encontrar fotografias referentes ao género feminino, e apenas na secção de modalidades, nomeadamente nas modalidades de Atletismo (por exemplo: salto em comprimento), Voleibol e Ténis.

Bibliografia citada

  • Bernstein, A. (2002). Is it Time for a Victory Lap?, IRSS, 37(3-4), 415-428.

  • Crossman, J., Hyslop, P., Guthrie, B. (1994). A Content Analysis of the Sports Section of Canada’s National Newspaper with Respect to Gender and Professional/Amateur Status, IRSS, 29(2), 123-131.

  • Ghiglione, R.; Matalon, B. (2001). O Inquérito. Oeiras: Celta Editora.

  • Pedersen, P. M. (2002). Examining Equity in Newspaper Photographs, IRSS, 37(3-4), 303-335.

  • Quivy, R., Champenhoudt, L. (1992). Manual de Investigação em Ciências Sociais. Lisboa: Gradiva.

  • Theberge, N., Cronk, A. (1994). Work Routines in Newspaper Sports Departments and the Coverage of Women’s Sports. In S. Birrell e C. Cole (eds) Women, Sport, and Culture (289-298). Champaign IL: Human Kinetics.

  • Vincent, J. et al. (2004). Game, Sex, and Match: The Construction of Gender in British Newspaper Coverage of the 2000 Wimbledon Championships, IRSS, 21(4), 435-456.

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revista digital · Año 13 · N° 122 | Buenos Aires, Julio 2008  
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