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Aspectos motivadores e desmotivadores e a atratividade
das aulas de Educação Física na percepção de alunos e alunas

   
*Licenciado em Educação Física pelo Centro de Ciências da
Saúde e do Esporte - CEFID da UDESC. Mestrando em EF
na linha de Teoria e Pratica Pedagógica em EF na UFSC.
(Brasil)
 
 
Gilmar Staviski*
staviski2010@yahoo.com.br  
Whyllerton Mayron Da Cruz
whmcruz@yahoo.com.br
 

 

 

 

 
Resumo
     Este estudo objetivou investigar aspectos motivadores e desmotivadores no contexto da Educação Física Escolar com base na percepção de alunos da oitava série do ensino fundamental de uma escola pública do Município de Florianópolis - SC. Participaram da pesquisa 194 estudantes com idade média de 14 anos, dos quais 103 eram do sexo feminino e 98 do sexo masculino. Os alunos foram avaliados por meio de um questionário construído para esta pesquisa baseado nos instrumentos de Silva (1991), Maciel (2004) e Ferreira (2004), que abordam assuntos como: satisfação, insatisfação, sugestões de mudanças, relação didático-pedagógica professor-aluno, experiências negativas, dificuldades encontradas e motivos para a participação e não participação das aulas de Educação Física. De modo geral, as experiências negativas vivenciadas pelos estudantes estão relacionadas a eventos como: se machucar, não conseguir realizar as atividades sugeridas pelo professor e vergonha por não saber jogar bem. Se pudessem escolher o conteúdo das aulas, os alunos acrescentariam mais músicas, danças e gostariam que todos os demais colegas participassem. Diante dos dados, acredita-se que um incentivo mais efetivo proveniente dos professores para com os alunos e um ambiente de tolerância são aspectos que levariam os estudantes que não fazem Educação Física a realizar a mesma.
    Unitermos: Educação Física. Alunos. Motivação.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 13 - N° 119 - Abril de 2008

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Introdução

    A Educação Física ao longo do seu processo de construção histórica vem sendo motivo de pesquisas dentro dos seus mais variados temas e formas de expressão. Contudo, uma das subáreas que permanece sem demonstrar avanços mais perceptíveis, embora com uma quantidade considerável de investigações realizadas, é a Educação Física Escolar - EFE, em especial a das escolas públicas. Preposição esta, que pode ser frequentemente confirmada através da observação de instituições com estruturas precárias, escassez de material, desinteresse de professores e falta de motivação dos próprios alunos para com sua prática.

    Sobre este último item, a falta de motivação dos alunos, muito se tem feito na tentativa de superar esta dificuldade, com recursos sem custo financeiro, como o uso da criatividade dos professores, porém, o que também se questiona, é até quando a criatividade deve ocupar o espaço de outros recursos e incentivos, que, por algum motivo, não se aproxima das escolas, em especial as públicas, até porque, não se sabe por quanto tempo esta criatividade, sozinha, vai agüentar.

    Winterstein (2004) afirma que a Educação Física possui por si própria uma "atração natural", pelo menos nas séries iniciais do ensino fundamental. Segundo o mesmo autor, esta atração tende a diminuir a partir da 5ª e 6ª séries, nas quais os alunos não conseguem mais manter o interesse pela disciplina. De modo geral, esta falta de interesse é presente em ambos os sexos, ou seja, tanto entre os meninos quanto entre as meninas.

    Apesar de em um primeiro momento, este discurso parecer pessimista sobre o atual momento da Educação Física, é muito difícil, mesmo com todos estes fatores somando contra, que na escola, as aulas de Educação Física acabem por desagradar a todos os alunos ou mesmo desaparecer do currículo. Pode-se assim dizer, que a tendência é existir aqueles que gostam de participar das aulas e aqueles que preferem não participar. Estes dois lados que o professor vivencia, o dos alunos que participam e o dos alunos que não participam, geram muitas reflexões e preocupações por parte dos professores e pesquisadores interessados em conquistar uma participação unânime dos alunos em suas aulas. No sentido de entender e descobrir o que leva os alunos a participarem mais das aulas, alguns esforços já foram feitos (MARTINS JÚNIOR, 2000; WINTERSTEIN, 2004), porém, neste fenômeno complexo há muito ainda por descobrir.

    No centro deste continuo de alunos que participam e gostam das aulas e de alunos que não participam e não gostam, existe uma infinidade de fatores que se inter-relacionam, como a idade, cultura, gênero, estrutura da escola, classe social, didática do professor, educação familiar entre outros, que precisam ser pensados com maior atenção quando se pretende que alunos não se privem dos benefícios da Educação Física por questões que podem ser sanadas e sem muito ônus (KUNZ, 2006). Além disso, meninos e meninas apresentam diferentes interesses que na prática da Educação Física se materializa em diferentes atitudes e percepções (SARAIVA-KUNZ; FIAMONCINI, 2006; CARDOSO, 1994), mas que não podem ser usados como justificativas para omissões ou exclusões, como acontece quando se enfatiza demasiadamente o rendimento esportivo nas aulas (SOARES et. al.1992; ROMERO, 1994).

    Ocupando uma posição de destaque por ser o intermediador neste processo, o professor é um dos principais responsáveis por mudanças neste paradigma (MARTINS JÚNIOR, 2000), que se inicia basicamente pela eliminação da prática pela prática no dia a dia da Educação Física escolar (FREIRE E SCAGLIA, 2003) e pela busca permanente de procurar entender o aluno dentro do seu contexto bio-psico-social. Como afirma Kunz, (2004), que o mundo de movimento e o mundo vivido das crianças sejam considerados pelos professores dentro da escola.

    No sentido de entender este complexo fenômeno da Educação Física Escolar é que se estrutura o objetivo deste estudo: investigar aspectos motivadores e desmotivadores para a prática escolar na percepção de alunos e alunas da oitava série do ensino fundamental de uma escola pública do Município de Florianópolis - SC.


Método

    Este estudo caracteriza-se como descritivo com abordagem qualitativa uma vez que visa investigar a percepção de alunos sobre aspectos motivadores e desmotivadores na prática da Educação Física Escolar. Fizeram parte deste estudo 194 estudantes regularmente matriculados em 7 turmas de oitavas séries do ensino fundamental, com idade média de 14 anos (mínima 9 / máxima 14), sendo 103 do sexo feminino e 91 do sexo masculino, todos estudantes do período matutino de uma grande instituição de ensino público do Município de Florianópolis - SC.

    Os alunos foram avaliados por meio de um questionário construído especificamente para esta pesquisa com base nos instrumentos de pesquisa de Silva (1991), Maciel (2004) e Ferreira (2004). Este questionário é composto por 25 questões (abertas e fechadas) que abordam temas como: satisfação, insatisfação, sugestões de mudanças, relação didático-pedagógica professor-aluno, experiências negativas, dificuldades encontradas e motivos para a participação e não participação das aulas de Educação Física. Contudo, neste estudo, foram utilizados somente as informações referentes às questões abertas que abordam assuntos relacionados aos seguintes tópicos: experiências negativas vivenciadas, dificuldades encontradas, motivos para a participação e não participação das aulas de Educação Física e sugestões de mudanças nas aulas visando torná-las mais atrativas, tanto para os alunos que gostam quanto para àqueles que não gostam da Educação Física.

    Esta pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética em pesquisa da Universidade do Estado de Santa Catarina. Os alunos tiveram a permissão para participar da pesquisa autorizada pelos pais ou responsáveis por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

    A coleta de dados aconteceu na própria instituição de ensino durante as aulas de Educação Física de cada turma. Os questionários foram respondidos pelos alunos de forma individual, na presença do professor de classe e também do pesquisador responsável para sanar possíveis dúvidas.

    Os dados foram tratados por meio da analise e interpretação dos resultados e categorização das respostas dos estudantes em forma de tabelas.


Apresentação dos resultados

    Investigou-se a percepção de 194 alunos da oitava série do ensino fundamental quanto aos aspectos motivadores e desmotivadores relacionados às aulas de Educação Física. As principais experiências ruins relatadas pelos alunos ocorridas nas aulas de Educação Física estão expostas no Quadro 1.

    As experiências ruins vivenciadas em aulas podem colaborar para que alunos tenham uma atitude pessimista ou mesmo de negação em relação à Educação Física. Com exceção de incidentes típicos que ocorrem (quebrar um dedo, levar boladas), as experiências ruins vivenciadas pelos alunos estão relacionas principalmente à questões como: falta de compreensão, tanto por parte do professor(as) quanto dos alunos, seja por ocorrências fisiológicas-hormonais (menstruação nas meninas) ou mesmo por um desempenho motor abaixo do esperado quando comparado aos demais colegas.

    Nas aulas de Educação Física, diferente dos treinos esportivos, os professores encontram uma variedade de alunos com motivos, interesses e necessidades diferentes, o que acaba repercutindo em diferentes expectativas e dificuldades. As principais dificuldades encontradas nas aulas de Educação Física pelos alunos participantes da pesquisa estão descritas no Quadro 2.

    O conteúdo das aulas de Educação Física se figura como a principal origem das dificuldades reclamadas pelos alunos. São dos conteúdos orientados basicamente em esportes que surgem muitas das dificuldades, principalmente, para os alunos que não estão interessados pelo rendimento esportivo ou não apresentam destacado desempenho motor. Para estes alunos, a aula tende a se tornar menos motivante, ou mesmo sem atratividade, o que justifica muitos estudantes questionarem a sua obrigatoriedade.

    É por meio da análise do comportamento dos alunos quando impossibilitados de participarem das aulas que os professores podem ter uma melhor compreensão do quanto esta disciplina é atrativa. O sentimento dos alunos quando perguntado como reagiriam se um dia, por algum motivo, não pudessem realizar a aula de Educação Física é apresentado no Quadro 3.

    Analisando as respostas dos alunos, é possível afirmar que as aulas de Educação Física são motivo de alegria para alguns e tristeza para outros, assumindo uma conotação polarizada. Para a parcela de alunos que fica triste ou se sente mal na possibilidade de não participar da aula, tais sentimentos são atribuídos principalmente ao fato de não gostar de ficar sem fazer nada ou deixar de jogar as modalidades preferidas, destacando-se neste contexto o futsal. Em contrapartida, analisando a parcela de alunos que fica feliz, o fato de não precisar fazer aula é encarado como uma oportunidade para não fazer nada ou descansar, assim como, utilizar este tempo para estudar para outras disciplinas, porque definitivamente não gostam de Educação Física.

    É freqüente observar alunos que só participam das aulas se o conteúdo for algo que lhe agrade, neste sentido, ninguém melhor do que os próprios estudantes para responderem como gostariam que fossem as aulas de Educação Física. As respostas dos alunos quando questionados como seriam as aulas, se, a eles fossem dado autonomia para escolha dos conteúdos e outros procedimentos pedagógicos, estão apresentadas no Quadro 4.

    As mudanças nas aulas de Educação Física sugeridas pelos alunos revelam um complicado paradigma; um mesmo elemento que é sugerido ou destacado por alguns estudantes é criticado por outros. Além disso, os alunos reclamam uma maior participação e autonomia na escolha dos conteúdos, sendo que o reflexo disto poderia ser uma aula desorganizada e sem controle para o professor, na qual cada um faria o que bem desejasse. Ainda, dentro deste contexto, observa-se que tanto os professores quanto os alunos são solicitados para terem uma participação mais efetiva nas aulas, uma vez que muitos alunos preferem ficar sem fazer "nada" ou estudar para outras disciplinas ao invés de participar das aulas.

    Desta maneira, mesmo em algumas instituições nas quais os alunos têm maior participação na escolha dos conteúdos, é comum encontrar àqueles que apresentam considerável resistência e preferem não participar das aulas. As respostas dos alunos que não gostam de fazer as aulas de Educação Física quando questionados se existiria algum motivo que os levariam a fazê-las estão descritas no Quadro 5.

    "Conteúdos repetitivos" e "falta de compreensão dos alunos para com os próprios colegas e professores" é um dos principais motivos que afastam os alunos das aulas, principalmente, os menos "habilidosos"; fato que pode ser mais bem compreendido, observando a necessidade de uma maior compreensão quanto aos diferentes níveis de performance e desempenho motor apresentada pela parcela de alunos que declara não gostar das aulas de Educação Física.

    Além disso, a sugestão de outros conteúdos como (natação, ginástica, dança) e maior compreensão quanto a diferentes níveis de desempenhos também podem ser originários de aulas centradas em modelos esportivizados; o que sugere que aulas com tendências mais democráticas e humanizadoras podem ser uma solução para os alunos que se sentem excluídos.


Discussão dos dados

    Para Leontiev (2005) a motivação para aprender é sempre determinada, em grande parte, pelos valores que apóiam e justificam a aprendizagem. O mesmo autor, referindo-se aos estudos sobre a subjetividade humana, afirma que é cada vez mais claro que as potencialidades intelectuais de um estudante que aprende são, em geral, muito superiores às que supõe quem elabora os programas; em contrapartida, as motivações para aprender são normalmente mais escassas do que o previsto. E isto não por "má vontade", mas sim, na maioria dos casos, por deficiências estruturais dos programas ou porque os próprios programas não resultam interessantes para aqueles que os deveriam aprender.

    Analisando as afirmações de Leontiev sobre a motivação de crianças para a aprendizagem escolar, muitos destes elementos podem ser transferidos, sem margem de prejuízo, para o âmbito da Educação Física Escolar (EFE), pois segundo Kunz (1991) a Educação Física (EF) também se constitui de uma prática pedagógica, com suas peculiaridades, mas que se assemelha, em muito, com as demais disciplinas escolares, pois seu objetivo final também é a formação. É o seu objeto de estudo - a cultura de movimento humano - que confere à EF algumas diferenças estruturais e que acaba influenciando direta ou indiretamente na motivação e, sobre tudo, na forma como as aulas tornam-se atrativas ou não para os alunos.

    Uma perspectiva interessante para discutir a motivação nas aulas, inclusive com os resultados encontrados neste estudo, pode ser feita por meio da atratividade. Esta, nas aulas de EF, pode ser compreendida, considerando aqueles alunos que, em um primeiro momento, apresentam boas habilidades motoras (bom desempenho nas atividades desenvolvidas durante a aula) e aqueles que não apresentam boa habilidade motora, (não demonstram grande sucesso na realização das atividades sugeridas). Segundo Kunz (1991) o interesse nas aulas observado pelos alunos habilidosos é muito grande, demonstrado principalmente pela vontade em se destacar nas atividades, já os "fracos" - alunos não muito habilidosos - não encontram muita atratividade, o que é intensificado quando as aulas são focadas demasiadamente no desempenho e na competição.

    Neste modelo de perspectiva, para a parcela de alunos que prefere ou gosta de esportes, a aula tende a tornar-se mais atrativa, pois apresentam melhores desempenhos e aptidões motoras específicas em aula (MARTINS JUNIOR, 2000). Porém, Soares et. al (1992), afirmam que estes dois elementos (desempenho e competição) transformam a EFE numa atividade desestimulante, segregadora e até aterrorizante, principalmente para os alunos considerados menos capazes ou não aptos, ou que não estejam decididos pelo rendimento esportivo.

    O seu objeto de estudo e a crença depositada de "automotivadora" conferem à EFE, quando comparada às demais disciplinas escolares, o lugar de destaque quando o assunto é a atratividade. Contudo, observando os dados desta pesquisa, é possível indagar que quando se afirma a EF ser, para todos, a mais motivante das disciplinas, corre-se o risco de reducionismo e estar privilegiando apenas a parcela de alunos que apresenta melhor desempenho motor e possivelmente os alunos do gênero masculino, principalmente, quando considerado que o gosto e a preferência pelo esporte competitivo, na sua grande maioria, ainda são pertencentes aos meninos (ROMERO, 1994; SARAIVA-KUNZ, 2006). Parte dos alunos sente-se excluídos e, de fato são excluídos das aulas, porque não estão entre os melhores jogadores. Ser excluído ou sempre "a segunda opção" pode causar algum tipo de transtorno para os estudantes, além de conseqüências negativas para o resto de suas vidas, como o sentimento de negação em relação à prática de esportes na vida adulta.

    Desta maneira, considerando todo os alunos, ou seja, tanto daqueles que gostam quanto aqueles que não gostam das aulas de Educação Física, identificou-se que alguns alunos demonstraram felicidade quando impossibilitados de praticar a mesma (tabela 03), uma vez que poderiam utilizar este tempo para quaisquer outras coisas como: estudar, descansar ou simplesmente não fazer nada. Estes dados corroboram com Winterstein, (2004), quando afirma que se criou uma espécie de "cultura da não aula" já incorporada pelos alunos, que preferem continuar no "rachinha" a participar de outras atividades. Entretanto, existem aqueles que gostam das aulas e sentem-se mal quando não podem fazer, principalmente quando o conteúdo da aula é algo do seu agrado. Há também aqueles que ficam tristes pelo simples fato de não gostarem de ficar sem fazer nada, incluindo neste caso os alunos que se julgam "hiperativos". Para estes alunos, a aula de Educação Física significa um dos poucos momentos no qual tem maior liberdade para se expressar e sair da sala, quebrando o ritmo formal das outras disciplinas, como pode ser visto nos depoimentos a seguir: "Fico triste quando não posso fazer aula, principalmente quando é futsal"; "A Educação Física é boa porque dá pra descansar a mente". De modo geral, estas informações ilustram o modo como a aula tende a ser mais atrativa para o grupo de alunos que apresentam melhores desempenhos em aula, ou seja, jogam melhor, e menos atrativa ou sem atratividade para o grupo de alunos que não apresentam bons desempenhos, como também pôde ser verificado nos estudos de Kunz (1991).

    Ao analisar as experiências ruins vivenciadas nas aulas, observa-se que muitas delas também apresentam uma relação com o desempenho, pois certas experiências negativas declaradas pelos alunos enfatizam a vergonha ou falta de compreensão dos demais colegas quando não conseguem realizar o que é proposto, podendo levar, em alguns casos, o aluno a adotar uma postura de isolamento ou mesmo que o próprio grupo o exclua das atividades (Tabela 1). Muito do desconforto ou vergonha em realizar, na frente de colegas, as atividades sugeridas podem ser conseqüências dos padrões de referência utilizados pelos alunos para avaliarem o seu rendimento. Segundo Wintertein, (2004), os alunos avaliam o rendimento com base em normas individuais (comparam seu desempenho atual com um mesmo desempenho realizado anteriormente) ou então em normas sociais (comparam seu desempenho com o desempenho de outro colega). Segundo Heckhausen (1980, 1989) citado por Winterstein (2004), pode haver uma melhoria na motivação ao se utilizar a norma individual de referência, pois desta forma, o indivíduo vivencia adequadamente os êxitos e fracassos, determinando, de forma realista, seu nível de aspiração, assim como, também pode evitar frustrações e vergonhas, pois a norma de referência é ele próprio não um colega.

    De modo geral, as dificuldades percebidas em aulas e as experiências ruins vivenciadas pelos alunos não apresentam muitas diferenças entre si, em alguns casos até se complementam "não consigo realizar bem as atividades" e "fazer o que não gosta". Com base nesta perspectiva, muitas dificuldades e experiências negativas podem ganhar força tornando-se um empecilho para fazer EF, principalmente para os alunos que, em princípio, não demonstram muita vontade e prazer em realizar as atividades, assim como, demonstram maior limitação para cumprir o que é sugerido pelos professor. Com poucas exceções, as principais dificuldades relatadas pelos alunos têm como pano de fundo o conteúdo repetitivo e esportivizado das aulas, o que reforça a velha discussão, mas ainda muito presente na área escolar sobre a problemática da hegemonia dos esportes, que favorecem poucos e é motivo de frustração para muitos, principalmente para àqueles que não estão interessados pelo desempenho ou competição (KUNZ, 1991, BRACHT, 1992, SOARES et al; PIRES, 2004).

    Martins Júnior (2000) também constatou que grande parte das dificuldades encontradas pelos alunos nas aulas de EF está relaciona à rotina dos conteúdos e a falta de opções disponibilizadas pelos professores, o que para o mesmo autor também é reflexo do modelo de esportivização e competição. É pertinente destacar nesta discussão, que Martins Júnior (2000) considera antes de tudo, que a origem deste problema está na formação dos professores, no passado histórico da EF e na influência que esta recebeu das correntes higienistas, militaristas e esportistas. Sem dúvida, o professor de EF assume o papel de destaque neste processo, seja pelos aspectos positivos ou negativos do atual quadro, contudo, é pertinente lembrar Winterstein, (2004), ao citar que quando cobramos uma maior atuação do professor é de fundamental relevância considerar a situação que este se encontra, e que muito da sua desmotivação e descompromisso pedagógico pode ser decorrente do cansaço, da rotina diária, da baixa remuneração e da falta de sentido e reconhecimento pelo seu trabalho. Além disso, é importante esclarecer, que os esportes não são elementos negativos, eles fazem parte do conteúdo da EF e possuem destacadas valências que podem ser trabalhadas quando é realizada a sua devida transformação didático-pedagógica, ou seja, utilizar os esportes como ferramentas de emancipação, libertação, esclarecimento e não apenas restringindo-se a uma de suas possibilidades: o desenvolvimento técnico-motor (KUNZ, 1994).

    Neste contexto, no qual a atratividade da EF pode ser interpretada como polarizada (as aulas de EF são mais atrativas para alguns e menos atrativa para outros), concorda-se com Oliveira (1992) quando afirma que a EF na escola, em sua grande maioria, contempla apenas atividades recreativas nas séries iniciais do ensino fundamental e o esporte normatizado da 5º série em diante, e que devido a este quadro de oferta e intenção de conteúdos (sem contextualização e visão crítica), em muitas escolas, as aulas servem apenas como momento de descanso e de contrapeso às outras disciplinas, explicando em parte, porque as aulas de EF adquirem esta conotação polarizada quando se pensa em motivação, tornando-se mais atrativas apenas para uma parcela dos alunos.

    Contudo, embora possa existir a interpretação polarizada da atratividade das aulas de EF em função da diferença de desempenho em aula, é importante destacar que existem alunos que não apresentam bons desempenhos em aula e que adoram praticá-la. O que não invalida a interpretação da atratividade polarizada, pois esta não deve ser encarada como norma inflexível, mas sim, como uma constatação geral, como afirma Devide e Rizzuti (2001), em que uma variedade de adjetivações nos faz pensar que há uma tendência dos alunos a assumirem uma postura nitidamente a favor ou contra a EF na escola, diretamente relacionada ao prazer que esta disciplina pode oferecer a eles.


Considerações finais

    O estudo de aspectos motivadores e desmotivadores nas aulas de Educação Física levado pela atratividade dos alunos é um elemento que pode oferecer informações contundentes sobre a atual realidade de sua prática. Neste estudo, a perspectiva de que as aulas de Educação Física são mais atrativas para uma parcela de alunos e menos atrativa para outra, revela uma situação dualista e de exclusão em torno de sua prática, ou seja, não são todos os alunos que vivenciam experiências positivas por meio da Educação Física.

    É importante destacar que o principal elemento que distingue a diferença entre estes dois grupos é o desempenho em aula, neste sentido, enquanto os conteúdos valorizarem ou se resumirem à modalidades esportivas, àqueles que, de alguma forma possuem melhores aptidões motoras, são os que irão gostar e se beneficiar das aulas. Na mesma lógica, àqueles alunos que, também por alguma razão, não apresentam boas aptidões motoras serão, de certa forma, excluídos e sentirão desconforto para cumprir o que foi proposto acabando por desenvolver um sentimento negativo em relação às aulas de Educação Física e conseqüentemente menos interesse por ela.

    Entretanto, é importante destacar que o contexto das aulas de Educação Física apresenta-se complexo e uma analise superficial pode ocultar elementos que possuem informações relevantes para uma compreensão mais profunda do mesmo. Neste sentido, qualquer analise que não considere todos os aspectos que influam na motivação de um indivíduo poderá ser considerada limitada. Desta maneira, questões de ordem funcional, como os fatores psicológicos e fisiológicos, não receberam muita atenção neste estudo, assim como, as influencias sócio-econômicas (estas porque não foram abordadas) o que denotam certa limitação a esta pesquisa.

    Para finalizar, é importante que a motivação possa ser analisada sobre outras perspectivas e não somente sobre o prisma dualista gerado pela esportivização. Para isto, é necessário romper com este paradigma que apenas reproduz modelos calcados no desempenho e na exclusão e que se possa disseminar uma pedagogia preocupada com o ser integral e sua inserção transformadora na vida cultural e social.


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Leitura complementar

  • BRACHT, V. Educação Física e Ciência: cenas de um casamento (in) feliz. Revista Brasileira de Ciências do Esporte. v. 22, n. 1, p. 53-63, set, 2000.

  • MORIN, E. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro / Edgar Morin; tradução de Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya; revisão técnica de Edgard de Assis Carvalho - 10ª ed, São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2005.

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