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Educação Física escolar: principais formas de preconceito

 

* Graduado em Educação Física pela Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais 

**Graduando em Educação Física pela Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais 

(Brasil)

 

Luiz Henrique Marchesi Bozi*

Miranda, Dayane Graciele de Jesus

Ana Luiza Mota Melo

Rodrigo Andrade Alvarenga Esperança**

luizbozi@hotmail.com
 

 

 

 

 
Resumo

       O preconceito constitui-se em um grave problema da atualidade, existente em toda a sociedade, de um modo geral, e principalmente na escola, sendo freqüentemente observado nas aulas de Educação Física. As principais formas de preconceitos encontradas na Educação Física Escolar são o racismo, questões ligadas ao gênero, diferenças corporais e a intolerância aos portadores de necessidades especiais. É papel do professor de Educação Física a transmissão do saber elaborado, desvinculado de qualquer valor que vise à reprodução de preconceitos, discriminação e subordinação.

      Unitermos: Educação. Educação Física escolar. Preconceito.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 12 - N° 117 - Febrero de 2008

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Introdução

    Ao abordarmos o tema “preconceito” dentro da Educação Física Escolar, deparamo-nos com um sério problema que abrange este meio. É extremamente difícil pensar em práticas pedagógicas inclusivas onde, pois o que existe hoje, é meramente excludente e pautado no preconceito em todas as suas formas, seja racial ou por qualquer tipo de diferença.

    Desta forma, acreditamos ser o preconceito o maior problema observado na prática escolar, principalmente na Educação Física, onde grande parte das questões é abordada de forma mais exposta e clara, sobretudo no que diz respeito às questões do corpo. Outro motivo é que, devido o preconceito ser fruto de padrões estabelecidos pela sociedade, o corpo reflete a principal forma de manifestação deste, sendo que, especialmente na escola, muitos destes pensamentos são manifestados em forma de críticas, exclusões e humilhações.

    Neste sentido, pautando-se na diversidade humana e no discurso dominante da universalidade, constituiu-se uma contradição do contexto escolar onde, aqueles que fogem do padrão estabelecido são julgados como inferiores e incapazes. Desta forma, não se respeita às diferenças, mas sim, as julgam e punem aqueles que as possuem.

    Ao observarmos tal prática em um país onde as diferenças raciais são características nacionais, identificamos um problema de difícil resolução, pois estes valores já foram pré-estabelecidos e desta forma, criaram-se os pré-conceitos.

    Segundo Fischmann (1998), “tratar da discriminação religiosa e étnica é tratar da possibilidade da Paz” (p.961). Sendo a escola um sistema social onde os conceitos e pré-conceitos são passados de gerações a gerações, entendemos que ela é co-responsável pela formação de uma nova geração que, finalmente, possa respeitar as diferenças.

Formas mais freqüentes de preconceito na escola

Racismo

    Vivendo em sociedade, os seres humanos devem respeitar-se, uns aos outros. Todos possuem direitos, porém o direito de um cidadão não pode ultrapassar o direito de outro. Dallari (1998) afirma que, os direitos humanos no Brasil passaram a ser discutidos a partir da década de 1970, apesar dos desaparecimentos, das torturas e dos governos militares ainda imperarem naquela época. Desta forma, para que seja assegurada a dignidade da pessoa humana, faz-se necessário refletir sobre a teoria e a prática dos direitos humanos.

    Deste modo, vimos na escola o meio ideal para disseminar esta discussão e para colocá-la em prática, uma vez que é dentro desta instituição que estão estabelecidas as maiores formas de discriminação e preconceitos, principalmente o racial, que é algo muito palpável na sociedade brasileira, em razão desta ter como principal característica a diversidade étnica e racial.

    Segundo Rangel (2006), o racismo fere os direitos humanos, na medida em que discrimina a partir de uma classificação. Como a tendência do ser humano é classificar tudo que existe, atribuições de juízos de valores foram criadas e divididas em diferentes categorias. Assim, em nome destes juízos “nos damos o direito de desprezar ou hostilizar o outro”.

    No que se relaciona a escola, sabe-se que é muito mais difícil um indivíduo negro entrar e/ou permanecer na mesma do que uma pessoa branca ou, quando isto ocorre, este é geralmente submetido a críticas que o inferioriza de alguma forma. Tal prática na escola humilha e exclui aqueles que são submetidos à ela e assim, marginaliza aqueles que não se encaixam nos padrões impostos. Este fato é comumente observado e, na maioria das vezes, aqueles que deveriam intervir, como professores e pedagogos, não sabem como fazê-lo ou, outras vezes são propagadores deste tipo de atitude, o que reforça e estimula o preconceito ao invés de intervir e combatê-lo.

    No âmbito da Educação Física Escolar este tipo de atitude é observado de forma mais freqüente, uma vez que o contato físico, proporcionado pela prática em ambientes externos estimula algumas manifestações que não são tão comuns dentro das salas de aula, pois neste ambiente o corpo é visto de forma livre e exposta do que em outras práticas escolares.

Questões ligadas ao gênero

    Ao falarmos das relações de gênero, ou seja, das diferenças estabelecidas pela sociedade com relação a homens e mulheres, é válido lembrar que tal assunto vem sofrendo uma constante mudança, devido a uma resistência do gênero feminino em ceder às imposições da sociedade que, culturalmente impôs normas de comportamento e de conduta completamente incoerentes e que, desta forma, impediu e atrasou em milhares de anos a independência das mulheres no que se refere a diversos fatores, sejam profissionais, sexuais ou meramente comportamentais.

    Segundo Sousa & Altmann (1999), os sistemas escolares modernos não apenas refletem a ideologia sexual dominante da sociedade, mas produzem ativamente uma cadeia de masculinidades e feminilidades heterossexuais diferenciadas e hierarquicamente ordenadas. Mesmo com essa hierarquização, as construções de gênero não se opõem, ou seja, o feminino não é o oposto nem o complemento do masculino.

    Porém, mesmo com um avanço acerca deste assunto e, com um grande desenvolvimento do gênero feminino em todos os aspectos, existe ainda uma grande discriminação das mulheres no âmbito escolar, principalmente na disciplina Educação Física em que, frequentemente as mulheres são excluídas de diversos esportes que foram estigmatizados como “masculinos”.

    De acordo com Kunz (1993), em estudo sobre a construção histórico-cultural dos estereótipos sexuais, no contexto escolar, a Educação Física constitui o campo onde, por excelência, acentuam-se, de forma hierarquizada, as diferenças entre homens e mulheres. Assim, muitas meninas são impedidas de participar da prática esportiva na escola devido a este tipo de preconceito, sendo, algumas vezes, excluídas pelos colegas de sala e outras vezes pelos próprios professores de Educação Física, que camuflam o seu preconceito em justificativas ignorantes como “os meninos são mais fortes”, “é para evitar que elas se machuquem” ou até mesmo “elas não sabem jogar este esporte”.

    Tais condutas envergonham profissionais de Educação Física que possuem propostas interessantes para intervir neste tipo de aspecto e ainda inculcam o preconceito nestas crianças, pois não só os meninos excluem as meninas como as mesmas se inferiorizam por não acreditarem que são capazes.

    Não pretendemos com este trabalho vitimizar o gênero feminino, pois desta forma estaríamos ‘aprisionando-as pelo poder’, desconsiderando suas possibilidades de resistência e estigmatizando o gênero masculino como ‘vilões’, o que não é uma verdade, já que os meninos também sofrem exclusão no âmbito da Educação Física Escolar, uma vez que alguns esportes são vistos como exclusivamente femininos, como a Ginástica Rítmica, a Dança e outras manifestações esportivas.

    O preconceito relacionado ao gênero atinge ambas as partes, em magnitudes diferentes, porém, de qualquer forma, este se mostra presente. E é no meio escolar e, principalmente nas aulas de Educação Física, que tal diferenciação é vista de um modo mais freqüente e é por isso que o professor deve estar preparado para intervir neste processo, discutindo sobre o tema e modificando a ação dos alunos.

Diferenças corporais

    Outro tipo de preconceito observado na escola diz respeito às diferenças corporais. A sociedade, ao estabelecer padrões que devem ser seguidos e perseguidos, trata aqueles que não se enquadram neste contexto como inferiores, anormais, feios.

    A escola mais uma vez é o principal ambiente em que tais pensamentos, criados pela sociedade, pela mídia e por outras formas de alienação, se propagam. A mídia e os meios de comunicação de massa impõem padrões estéticos a toda uma sociedade, fazendo com que as mulheres sonhem em possuir corpos magros e firmes e homens anseiem por se tornarem fortes. Esta imposição traz sérios problemas àqueles que não se encaixam neste perfil, pois estes serão sempre criticados, subjugados e instigados a se transformarem em algo que não são, que não condiz com sua genética ou com sua personalidade.

    Tais situações na escola são vistas de forma muito freqüente e, mais uma vez, as aulas de Educação Física refletem o meio mais propício para tais manifestações, pois é nesta aula que os corpos estão expostos a este tipo de marginalização e, por isso, à mercê do julgamento público.

Portadores de Necessidades Especiais

    A escola, como instituição social, apresenta em seu interior normas de condutas e comportamentos nos quais estão fundamentadas as diversas práticas pedagógicas. Neste sentido, o comportamento diferente é logo tido como deficiente, incapaz de satisfazer às exigências educacionais. Os chamados “deficientes” são excluídos ou mantidos separados dos “normais” dentro das instituições escolares.

    Diante da luta e resistência dos estigmatizados, frente ao seu estado de desumanização, o próprio sistema social elabora instituições escolares especiais com o intuito de manterem a ordem através de práticas assistencialistas e reprodutivistas que buscam corrigir os erros dos “desviantes”, mantendo-os em um estado de conformismo com a realidade de desigualdade (Brasil, 2003).

    Nesse contexto, os problemas que regem a relação da escola e dos colegas de classe com os portadores de necessidades especiais não se limitam ao preconceito sofrido por eles, o que é algo extremamente visível, mas também ao despreparo dos professores e funcionários da escola para lidar com as diferenças individuais. Por isso, na maioria das vezes, mantém-se o aluno excluído do resto da turma e sem nenhum tipo de atenção especial que colabore para o seu desenvolvimento escolar.

    Essas atitudes são notadas em toda a escola, em todas as aulas e com todos os profissionais envolvidos. Porém, as aulas de Educação Física expõem ainda mais esta marginalização, sendo que os portadores de necessidades especiais, na maioria das vezes, não são estimulados a aprender com os demais e nenhum tipo de atividade diferenciada em que todos possam participar de forma irrestrita é proposta.

    Neste sentido, portadores de necessidades especiais sofrem algum tipo de marginalização em vários aspectos na escola, mas principalmente nas aulas de Educação Física, seja por preconceito na forma de exclusão ou de inferiorização ou até mesmo pela má formação dos professores, que não sabem como incluí-los em suas aulas.

Formas de intervenção

    Nas aulas de Educação Física o professor assume o papel de formador do cidadão, não só pela ótica fisiológica e/ou motora, mas também pelo viés da formação do indivíduo como um todo. Neste sentido, é papel do professor de Educação Física a transmissão do saber elaborado, desvinculado de qualquer valor que vise à reprodução de preconceitos, discriminação e subordinação.

    Ao professor de Educação Física cabe intervir na formação de valores dos indivíduos, colocando em discussão assuntos como preconceito racial, étnico, de gênero, relacionado a parâmetros estéticos ou a qualquer tipo de diferença entre os mesmos. Ou seja, é importante que o professor de Educação Física aborde os assuntos no momento em que eles acontecem para que se cause uma reflexão por parte dos alunos sobre a ocasião ou problema ocorrido.

    A respeito dos portadores de necessidades especiais, cabe ao professor adequar as atividades desenvolvidas nas aulas de Educação Física às deficiências dos alunos, sem, no entanto, inferiorizá-los. O esporte e as práticas pedagógicas nas aulas devem ser vistas como um modo de inclusão social e não de fixação de preconceitos estabelecidos pela sociedade.

    A discussão e abordagem desse tema, nas aulas de Educação Física, devem ser práticas constantes, a fim de formar indivíduos isentos de preconceitos, críticos e conscientes das diferenças que cercam a sociedade. Assim sendo, serão capazes de promover um respeito mútuo.

Conclusão

    Com o referido trabalho, concluímos que o preconceito é algo que está presente em toda a sociedade, inclusive no âmbito escolar, e que se manifesta principalmente nas aulas de Educação Física, pois os indivíduos estão mais expostos a todo o tipo de crítica ou julgamento. Seja por sua etnia, raça, questões estéticas, de gênero ou por qualquer outra diferença que fuja dos padrões impostos pela sociedade, muitos alunos hoje são submetidos a algum tipo de preconceito.

    Tais manifestações geram humilhações que resultam em indivíduos acríticos, tímidos e inseguros e que se sentem inferiorizados pelos outros. As conseqüências desta formação podem ser diversas e devem ser evitadas pelos profissionais da área da Educação, que são atualmente os principais intervencionistas neste âmbito.

Referências bibliográficas

  • BRASIL, A. S. Política de inclusão escolar e Educação Física: uma abordagem antropológica. UFG. 2003.

  • DALLARI, D. A. A globalização e seus efeitos excludentes: serão respeitados os direitos humanos nos próximos 50 anos? In: http://www.iedc.org.br/publica/dialogando/dallari.htm, 1998 (acessado em 28.10.2007).

  • FISHMANN, R. Estratégias de superação da discriminação étnica e religiosa no Brasil. In: PINHEIRO, P. S..; GUIMARÃES. S. P. (org.) Direitos Humanos no século XXI. Rio de Janeiro: Fundação Alexandre de Gusmão, 1998. p. 959-985.

  • KUNZ, M. C. S. “Quando a diferença é mito: Uma análise da socialização específica para os sexos sob o ponto de vista do esporte e da educação física”. Dissertação de mestrado em educação.Florianópolis: UFSC, 1993, 167pp.

  • RANGEL, I. C. A. Educação Física na Educação Infantil: notas sobre a possibilidade de formação de preconceito étnico etnico-racial. UNESP-Rio Claro-SP, Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte – 2006, 5(1):135-146.

  • SOUSA, E. S. & ALTMANN, H. Meninos e meninas: Expectativas corporais e implicações na educação física escolar. Cadernos Cedes, ano XIX, nº 48, Agosto/99.

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