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Musculação para um aluno com síndrome de down
e o aumento da resistência muscular localizada

   
*Professor da academia Mergulho.
**Docente do Centro Universitário Claretiano de Batatais, Docente da
Universidade de Franca, Doutoranda em Educação Especial -Ufscar.
***Professor Doutor do Departamento de Estudos
da Atividade Motora Adaptada -UNICAMP.
****Professor Adjunto da Universidade Paranaense-Campus Toledo.
(Brasil)
 
 
Prof. Carlos Alves da Silva Junior*  
Profa. Ms. Maria Georgina Marques Tonello**  
Prof. Dr. José Irineu Gorla***  
Prof. Ms. Décio Roberto Calegari****
ginatonello@unifran.br
 

 

 

 

 
Resumo
     A pessoa com Síndrome de Down apresenta algumas características especificas relacionadas a sua deficiência, como o atraso no desenvolvimento motor, hipotonia generalizada, entre outras. Pouco se sabe a respeito da hipotonia que atinge a grande maioria dessa população, uma vez que algumas questões importantes são escassamente discutidas na literatura, como por exemplo a origem do quadro hipotônico, como avalia-lo ou ate mesmo qual o melhor trabalho a ser realizado para diminuir o quadro patológico desses indivíduos. Sabemos que a musculação é uma atividade que promove uma melhora de condicionamento físico e que possibilita um trabalho de hipertrofia e resistência muscular localizada através de exercícios resistidos. Este estudo de caso teve como objetivo verificar o aumento da resistência muscular localizada e os efeitos de um programa de treinamento de musculação para um aluno com Síndrome de Down, idade de 16 anos, do sexo masculino, de uma cidade do interior de São Paulo, Brasil. Foi realizada uma pré-avaliação antropométrica e de composição corporal anterior ao inicio do programa, com função diagnóstica, que serviu de fundamentação para a construção de um período de seis meses de treinamento e uma pós-avaliação ao término do mesmo. O treinamento constituiu-se de exercícios resistidos e os materiais utilizados foram: halteres de cargas variadas, de 2, 3 e 4 Kg, colchonetes, cronômetro, compassso de dobras, balança fita métrica e um programa de avaliação elaborado por FAULKNER. Os resultados encontrados mostraram um aumento na resistência muscular localizada do sujeito, o que nos permite concluir que a musculação atuou significantemente para uma melhora de tônus muscular, auxiliando na superação do quadro de hipotonia da pessoa com Síndrome de Down, mostrando ser uma atividade importante e indicada para essa população.
    Unitermos: Síndrome de Down. Atividade Física. Resistência Muscular Localizada.
 

 
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 11 - N° 104 - Enero de 2007

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Introdução

    A Síndrome de Down é uma patologia causada por um acidente genético que provoca um atraso no desenvolvimento global da criança. Apesar de ter sido diagnosticada há mais de um século, somente nas ultimas décadas houve um avanço significativo em suas pesquisas. A observação das pessoas com essa síndrome permitiu constatar grande dificuldade no desenvolvimento motor, físico, cognitivo e sócio afetivo, acompanhado geralmente por cardiopatias congênitas e inúmeros problemas relacionados a sua estrutura corporal (PUESCHEL, 1999).

    A causa da Síndrome de Down é o excesso de material genético proveniente do cromossomo 21. Seus portadores apresentam três cromossomos 21, ao invés de dois, por isto a Síndrome de Down é denominada também Trissomia do 21. No principio acreditava-se que as causas da Síndrome de Down estavam ligadas a má formação do bebê durante a gestação e muitas teorias errôneas foram consideradas até meados do século XX, quando cientistas descobriram que esta síndrome estava ligada a problemas genéticos (cromossomos).

    Foi constatado também que a maioria dos casos de pessoas com a Síndrome de Down proviam de mães com idade superior a trinta e cinco anos e pais com idade superior a cinqüenta e cinco anos e que, em raras ocasiões, este acidente genético ocorria no momento da divisão da célula. Com todo aparato tecnológico a disposição da ciência, tornou-se mais fácil identificar esse problema e novas pesquisas comprovaram que de fato se tratava de um acidente genético e também que os portadores dessa síndrome possuíam 47 cromossomos ao invés de 46 em cada célula.

    No momento da concepção ocorre a junção dos 23 cromossomos do pai com os 23 cromossomos da mãe, formando assim uma célula com 46 cromossomos. Se no momento da concepção a célula germinativa masculina ou feminina possuir 24 ao invés dos 23 cromossomos previstos, será formada uma célula com 47 cromossomos, que se dividirá gerando outras células com 47 cromossomos.

     Posteriormente ao nascimento, se forem efetuados exames no bebê, será constatado que todas as células de seu corpo possuem 47 cromossomos. Esse cromossomo extra é o causador da Síndrome de Down, cujo acidente genético pode ocorrer durante a formação de uma nova célula ou no momento de sua divisão.

    As causas que levam a esta divisão incorreta não foram totalmente esclarecidas, mas normalmente estão associadas à idade avançada da mãe (mais de trinta e cinco anos), ou do pai (mais de cinqüenta e cinco anos), ou por um dos pais possuir algum defeito genético não manifestado, que será herdado pelo filho e possivelmente irá se manifestar.

    Com a tecnologia disponível pode-se detectar problemas apresentados durante a gestação, mas no caso da Síndrome de Down não há como corrigir ou evitar sua manifestação. (PUESCHEL, 1999; DIAMENT, A & CYPEL, S. 1989; WERNECK, 1993)

    As técnicas utilizadas para a identificação da Síndrome de Down são consideradas arriscadas, pois consistem na retirada de amostras do liquido amniótico (líquido que envolve o feto no útero materno - amniocentes), do tecido vilocorial (tecido placentário) e a tiragem de alfafetoproteína materna (substância encontrada em níveis elevados no sangue durante a gravidez).

    Através do exame da alfafetoproteína materna, nos últimos cinco anos foram detectados de 60 a 80% dos casos de Síndrome de Down. As mães apresentavam essa substancia em quantidade reduzida, sendo esse aspecto em especifico associado a trissomia (PUESCHEL 1999).

    Outro método utilizado de modo preventivo é o aconselhamento genético, exigido pelo médico quando um dos pais ou ambos se enquadram nos fatores de risco apresentados anteriormente. Neste caso os pais são orientados sobre os riscos tanto para a mãe quanto para o feto e as chances do nascimento de um bebe com alguma anomalia e os problemas que enfrentará durante toda a sua vida, inclusive sua perspectiva de vida (DIAMENT & CYPEL, 1989).

    Atualmente tem sido utilizado um marcador ultrassonográfico que pode sugerir o diagnóstico da Síndrome de Down na décima segunda semana gestacional. Trata-se de uma medida, denominada translucência nucal, que é obtida da região da nuca do feto. Valores acima de 3 mm são característicos de alguns problemas congênitos, entre eles, a Síndrome de Down. Nestes casos é indicado o estudo do cariótipo fetal (PUESCHEL, 1999).

    As características clínicas do indivíduo com a Síndrome de Down são congênitas e incluem, principalmente: atraso mental, hipotonia (fraqueza) muscular, baixa estatura, anomalia cardíaca, perfil achatado, orelhas pequenas com implantação baixa, olhos com fendas palpebrais oblíquas, língua grande, protusa e sulcada, encurvamento dos quintos dígitos, aumento da distância entre o primeiro e o segundo artelho e prega única nas palmas (SBROGGIO & ROBINSON, 2002). A pessoa com Síndrome de Down pode apresentar problemas endócrinos, cardiopatias, problemas de visão, fala, audição, tornando necessários exames periódicos para acompanhar seu desenvolvimento e o surgimento de possíveis problemas de saúde.

    Um dos problemas congênitos que mais prejudica o desenvolvimento da criança com Síndrome de Down é a hipotonia, caracterizada por flacidez muscular e ligamentar que acompanha o individuo por toda a vida. A hipotonia está ligada diretamente ao atraso no desenvolvimento psicomotor do portador da Síndrome de Down podendo dificultar quando bebê, a engatinhar, andar, sugar o leite da mãe, falar. Esses são apenas alguns exemplos do que pode causar a hipotonia.

    Toda criança com Síndrome de Down nasce com hipotonia, variando sua intensidade de individuo para individuo. Pouco se sabe a respeito da hipotonia que atinge a grande maioria dessa população, uma vez que algumas questões importantes são escassamente discutidas na literatura, como por exemplo a origem do quadro hipotônico, como avalia-lo ou ate mesmo qual o melhor trabalho a ser realizado para diminuir o quadro patológico desses indivíduos.

    Para o desenvolvimento de atividades físicas para populações especiais, é necessário conhecer as suas características como: sua composição corporal, algum problema de origem congênita ou adquirida (cardiopatias), suas capacidades e limitações, a fim de buscar um melhor desenvolvimento de suas habilidades físicas e psicológicas. A atividade física deve ser orientada, tomando cuidado para não causar lesões, mantendo-a atualizada e interessante, evitando a monotonia, e a conseqüente queda no rendimento que, por sua vez, vai prejudicar o desenvolvimento das habilidades específicas.

    Sabemos que a atividade física é de suma importância para a manutenção da qualidade de vida, da saúde e na prevenção de doenças. A atividade física para pessoas com Síndrome de Down deve ser adequada as suas características e principalmente as suas necessidades.

    A musculação é uma atividade que promove uma melhora de condicionamento físico e que possibilita um trabalho de hipertrofia e resistência muscular localizada através de exercícios resistidos. Uma vez que uma das características das pessoas com Síndrome de Down é a hipotonia generalizada, pretendemos neste estudo verificar os benefícios da musculação para uma pessoa com Síndrome de Down, em específico o aumento da resistência muscular localizada, a partir de um programa de atividade física individualizado.


Método

Caracterização do Estudo e Amostra do Estudo

    Participou deste estudo de caso um aluno com dezesseis anos de idade, do sexo masculino com Síndrome de Down trissomica, residente em uma cidade do interior de São Paulo, Brasil.


Materiais

    Para o desenvolvimento do estudo, utilizou-se dos seguintes equipamentos: um compasso de dobras cutâneas marca CESCORF, uma balança com precisão de 100g, uma fita métrica flexível (não elástica) com precisão de um milímetro, halteres de 2Kg, 3Kg e 4Kg, colchonete e cronômetro. As fotos correspondentes são do acervo pessoal do pesquisador, sendo utilizada uma máquina fotográfica Yashica Lens 32mm 1:3.5.


Procedimentos

    Foi apresentado um protocolo de avaliação e treinamento apresentado a mãe, sanando as dúvidas sobre a atividade a ser realizada e o objetivo a ser atingido, acompanhado da declaração autorizando a pesquisa.


Período de adaptação

    Em função de o aluno ser sedentário e não apresentar afinidade com a atividade física houve um período de adaptação com duração de três semanas antes do inicio da parte especifica da atividade, o qual consistiu em uma caminhada de meia hora em ritmo leve na praça perto de sua casa. Antes e depois da atividade eram realizados alongamentos de membros superiores e inferiores como forma de aquecimento e prevenção a lesões.


Fase específica

    Foi desenvolvido um protocolo de treinamento visando a melhora de seu condicionamento físico e aumento da resistência muscular localizada, trabalho este enfatizando apenas membros superiores com três series de doze repetições e cargas moderadas.

    Por apresentar um quadro cifótico bastante acentuado foram prescritos dois exercícios envolvendo grandes grupamentos musculares das costas tentando minimizar esse problema postural apresentado pelo aluno.

    A divisão dos grupos musculares a serem trabalhados foi feita de acordo com as necessidades do aluno e objetivo a ser atingido de forma pré estabelecida por várias bibliografias, onde o trabalho envolvendo cargas deve ter um período para recuperação do músculo de setenta e duas horas dependendo do tipo de treinamento desenvolvido (WEINECK, 1999; POLLOCK 1993). Dessa maneira ao termino do terceiro dia teve inicio o primeiro dia na próxima sessão de treinamento, dessa forma foi respeitado o período adequado para a recuperação do músculo sem que houvesse comprometimento na continuidade do treinamento.


Exercícios




Resultados

    A partir das avaliações realizadas os resultados obtidos referente à resistência muscular localizada após o período de treinamento demonstraram alterações nas medidas pré e pós treinamento em toda a musculatura trabalhada (Tabela 1). O treinamento da resistência muscular localizada foi priorizado por ser importante para o condicionamento físico do individuo e também para a melhora do seu tônus muscular, uma vez que a pessoa com Síndrome de Down apresenta como característica a hipotonia generalizada. Os resultados obtidos permitiram verificar mudanças significativas no tônus muscular e no desempenho atlético do participante.

    Com relação a avaliação antropométrica os resultados obtidos, conforme demonstrado na tabela 2, demonstraram alterações em todos os componentes, como um aumento de peso corporal e na porcentagem de gordura, que foi de 17,69% no pré-teste e de 17,98% no pós-teste, entretanto neste estudo o fator alimentação não foi controlado, o que pode ter influenciado neste resultado. Este aumento de peso reflete também o excesso de peso do participante que foi de 10,63 para 12,98, esta característica é também destacada na literatura por diversos autores, pois as pessoas com Síndrome de Down tem propensão a obesidade (PUESCHEL, 1999).

    Com relação ao índice de massa magra: músculo, houve um aumento que foi de 52,31% no pré-teste e no pós-teste 52,52%, apesar de ser um pequeno aumento esse resultado deve ser ressaltado, pois indivíduos com Síndrome de Down apresentam como características a hipotonia generalizada, que possivelmente dificulta o trabalho de hipertrofia muscular.

    Apesar das diferenças não serem tão significativas o pouco tempo de treinamento (6 meses) costuma produzir um aumento de medidas antropométricas que, na seqüência se estabilizam e paulatinamente vão acompanhando os objetivos do trabalho desenvolvido.


Conclusão

    O programa de treinamento de musculação, aplicado ao aluno com Síndrome de Down promoveu alterações em vários aspectos relacionados ao condicionamento físico, como aumento da resistência muscular localizada de todos os grupos musculares envolvidos.

    Também proporcionou alterações nas seguintes medidas antropométricas: peso corporal, dobra cutânea sub-escapular, circunferência do tórax, circunferência da cintura, circunferência do ante braço direito, circunferência do quadril, massa magra, peso: gordura, peso muscular, peso residual, excesso de peso, peso ideal e IMC.

    Percebemos dessa forma que o treino envolvendo cargas proporciona ganhos no desempenho e condicionamento físico do participante avaliado, indicando ser uma possibilidade favorável para melhorar sua qualidade de vida de pessoas com essa Síndrome.

    Em se tratando de uma população restrita, com características e patologias diferenciadas faz-se necessário promover estudos envolvendo participantes e treinamentos variados, para que dessa maneira possamos compreender melhor os benefícios da atividade física, em específico da musculação, na prevenção e tratamento de patologias desses indivíduos.


Referências bibliográficas

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  • POLLOCK, M. L. Exercicios na saúde e na doença: avaliação e prescrição para prevenção e reabilitação. 2 ed. Cidade: Rio de Janeiro: Medsi, 1993

  • POVILOVCH, L. M. Treinamento desportivo. Guarulhos: Phorte, 1997.

  • PUESCHEL, S. M. Síndrome de Down: guia para pais e educadores. 2. ed. São Paulo: Papirus, 1999.

  • SANTOS, R. S. Possibilidades da influência dos efeitos da água na musculatura estriada esquelética e na postura. Síndrome de Down Terapia Aquática, ano 3, n. 10, p. 12-20, dez. 2001.

  • SBROGGIO & ROBINSON - APAE/BAURU/SP. Central de textos, Arquivos, Dados e Informações e Pesquisas Literárias sobre a Síndrome de Down, 02/2002. Disponível em: http://www.epub.org.br/cm/n04/doenca/down/down.htm

  • WEINECK, J. Treinamento Ideal. 9. ed. São Paulo: Manole, 1999.

  • WERNEC, C. Muito Prazer, Eu Existo. Rio de Janeiro: WVA, 1993.

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